Os senadores aprovaram, ontem, a toque de caixa, o projeto que criminaliza o abuso de autoridade de juízes e procuradores. O texto foi avalizado na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) e, em seguida, no plenário, onde foi aceito por 48 dos 81 parlamentares. A aprovação ocorre em meio à divulgação de mensagens atribuídas ao então juiz Sérgio Moro, acusado pela defesa de Lula de orientar procuradores que integram a Lava-Jato, a maior operação de combate à corrupção da história do país. Agora, a proposta voltará à Câmara, porque houve alteração em relação à aprovada na Casa em 2017.
Segundo o relator, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), os artigos 8 e 9 do PLC 27/2017, sobre abuso de autoridade, ;coíbem excessos, situações esdrúxulas que não devem ocorrer no serviço público. Mas, claro, não impedem o trabalho de quem atua nesses meios;. Ele disse ter tido ;o maior cuidado; ao criar o Estatuto do Abuso de Autoridade, ouvindo juízes, procuradores e associações. ;Muitas sugestões foram acolhidas das observações dos senadores.;
Questionado sobre a possibilidade de banalização do abuso de autoridade, Pacheco defendeu o texto. ;Não será fácil nem banalizado. Estamos falando de hipóteses flagrantes que estamos acostumados a ver no Brasil. São exceções, mas são exceções protuberantes. Corrigimos o erro do dolo genérico;, frisou. ;Aquele que age de boa-fé não cometerá abuso de autoridade, e responderá por denunciação caluniosa quem disser que alguém fez algo que não fez.;
Jader Barbalho (MDB-PA), que responde a inquérito na Lava-Jato, afirmou que ;não deve existir uma ;elitezinha; que pode fazer o que quiser;. Humberto Costa (PT-PE) fez coro. Segundo ele, o projeto ;vai amedrontar o promotor que extrapola sua função para desrespeitar o direito do processado, vai amedrontar o juiz que faz conluio com a acusação;. ;Fizemos um projeto parecido que está na Câmara, para qualificar mais pessoas nessa lei, não só juízes e procuradores, mas o texto está parado;.
Já Lasier Martins (Podemos-RS) criticou o projeto. ;Quando o cidadão for julgado, vai colocar em xeque a atuação do procurador e do juiz;, ressaltou. Marcos do Val (Cidadania-ES) chamou o texto de ;Lei da Mordaça; ; apelido que vem da Câmara dos Deputados.
Em nota, a Associação Nacional dos Membros do Ministério Público afirmou que o projeto constitui ameaça à efetividade das investigações e ações ministeriais, especialmente as que se referem à criminalidade organizada, ;na medida em que pode importar em intimidação à atividade funcional do Ministério Público e também do Poder Judiciário;. ;Há tempos tentavam avançar com essa proposta, sob a frágil justificativa de impedir abusos de juízes e promotores. Na verdade, o que se pretende, é dificultar a atuação desses agentes públicos no combate aos crimes de corrupção e de colarinho-branco;, afirma o presidente da entidade, Victor Hugo. ;É sintomático que as medidas aprovadas hoje (ontem) pelos representantes do povo estejam sendo comemoradas por aqueles envolvidos em investigações criminais.;
O que diz o projeto
Pelo texto aprovado em plenário, juízes
e procuradores incorrem em abuso quando:
Juiz
; Proferir julgamento quando impedido por lei;
; Atuar com ;evidente; motivação política;
; Expor opinião em meios de comunicação antes do fim do processo
(seja o julgador ou não);
; Exercer cargo além da magistratura, salvo o de professor. Em empresas,
nunca poderá ser sócio ; apenas acionista;
; Receber recompensa financeira, por exemplo, pela atuação em processos.
Procurador
; Instaurar processos sem provas e indícios suficientes;
; Recusar-se a praticar sua função;
; Receber incentivo financeiro no decorrer do processo;
; Atuar como advogado;
; Expressar, nos meios de comunicação, ;juízo de valor indevido;
durante processos inconclusos. Só poderá se manifestar nos autos;
; Atuar com ;evidente; motivação política.
Punição
; Autoridades que violarem as regras estarão sujeitas
à pena de seis meses a dois anos, além de multa.
]Criminalização do caixa 2
No mesmo projeto aprovado, ontem, sobre abuso de autoridade, o Senado decidiu recuperar uma proposta do pacote que ficou conhecido como ;10 medidas contra a corrupção; e criminalizar o caixa 2 eleitoral. O texto também torna crime a compra de votos. Hoje, as duas condutas são consideradas ilícitos eleitorais. O projeto prevê punição com reclusão, de dois a cinco anos, para quem ;arrecadar, receber ou gastar ; o candidato, o administrador financeiro ou quem de fato exerça essa função ou quem atuar em nome do candidato ou partido ; recursos, valores, bens ou serviços estimáveis em dinheiro, paralelamente à contabilidade exigida pela lei eleitoral;. A mudança não vale para crimes eventualmente cometidos antes de a lei entrar em vigor, ou seja, casos relacionados a eleições passadas não poderão ser enquadradas na esfera penal.