Retirar da Constituição as regras previdenciárias, para que elas possam ser alteradas por lei, é uma das mudanças mais controversas da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 6/2019, da reforma da Previdência. Se o texto for aprovado pelo Congresso na íntegra, os critérios de acesso à aposentadoria e o cálculo do benefício, entre outros pontos, poderão ser alterados por projeto de lei complementar. Levantamento do Ministério da Economia mostra que a proposta não traz nada de diferente do que acontece em outros países.
Apesar das críticas dos parlamentares, o formato proposto pelo governo não inova em relação às tendências mundiais, explicou ontem o secretário de Previdência do Ministério da Economia, Leonardo Rolim, em audiência pública na Comissão Especial que discute a reforma na Câmara. Após avaliar as legislações de 92 países, ele observou que, embora as constituições de 78 deles citem a Previdência Social ; e 62 a coloquem como direito fundamental ;, os parâmetros costumam ser definidos por lei ou regras infraconstitucionais.
Regras de cálculo de aposentadoria e pensão, por exemplo, estão previstas apenas na Carta Magna brasileira. E, além do Brasil, só Gana exige emenda para mudar as condições de acesso aos benefícios. ;Nenhum país trata de regra de cálculo, só o Brasil. Aliás, a gente trata da regra de cálculo dos servidores públicos, porque a do regime geral está em lei ordinária e, portanto, pode ser alterada por MP (medida provisória), como já foi várias vezes;, comentou o secretário.
O representante do governo também ressaltou que os critérios de reajustes de benefícios não costumam estar no texto constitucional. Isso só acontece em três dos 92 países avaliados: Colômbia, Uruguai e Suíça. Já o piso previdenciário, que no Brasil é de um salário mínimo (hoje, R$ 998), só é definido pelas constituições da Colômbia e da Venezuela. Além disso, só 17 países constitucionalizaram as regras de financiamento ou orçamento do sistema, como o Brasil.
A reforma da Previdência é considerada essencial, pelo governo, para que o país equlibre as contas fiscais e retome a trajetoria de crescimento. Na terça-feira, em depoimento na Câmara, o ministro da Economia, Paulo Guedes, disse que o Brasil é prisioneiro da armadilha do baixo crescimento. ;Com as reformas, atacamos o problema frontalmente;, afirmou.
O sistema previdenciário será discutido no seminário Por que a reforma é crucial para o futuro do país?, na sede do Correio, na próxima quarta-feira (veja quadro). Organizado em parceria com a Confederação Nacional da Indústria (CNI) e a Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), o evento também terá a participação do secretário especial de Previdência e Trabalho, Rogério Marinho, do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e do presidente da Comissão Especial, deputado Marcelo Ramos (PR-AM).
Deputados da oposição e boa parte do Centrão continuam definindo a desconstitucionalização dos parâmetros da Previdência como um ;cheque em branco; a ser dado aos próximos governantes, que poderão mudá-los com mais facilidade. Para aprovar um projeto de lei complementar, é preciso o apoio de 257 deputados e 41 senadores. Já para PEC, exigida atualmente para tratar do assunto, o governo precisa de 308 votos na Câmara e 49 no Senado.
Na audiência de ontem, o economista Fabio Giambiagi, que também estará no seminário no Correio, explicou que o Brasil consegue cumprir razoavelmente três dos objetivos do sistema previdenciário: evitar a queda de consumo na terceira idade, permitir que o idoso tenha renda proporcional às contribuições e garantir uma renda mínima, para evitar situações de miséria. Mas o país, segundo ele, não superou o quarto objetivo: minimizar o impacto fiscal.
Para Giambiagi, o sistema se tornou ;uma fábrica de desequilíbrios;. ;Meu sentimento pessoal é de que o Brasil se perdeu.;
Com opinião diferente, o secretário executivo do Sindicato dos Analistas e Técnicos de Finanças e Controle (Unacon), Bráulio Cerqueira, acredita que a reforma vai piorar a situação. ;Que país cresce contendo salários e aposentadorias, retirando direitos? Isso não é sustentável;, disse. O governo, segundo ele, não está quebrado. ;Tem e terá dinheiro, porque finanças públicas não são finanças da dona de casa. Governos instituem e cobram impostos, e são capazes de fixar a taxa de juros da sua própria moeda;, argumentou.
Ficha Técnica
Seminário ;Por que a reforma é crucial para o futuro do país?;Local: auditório do Correio Braziliense
Data: 22 de maio, quarta-feira, das 9 às 13h30
Abertura
; Paulo Guedes, ministro da Economia (a confirmar); Paulo Afonso Ferreira, presidente da CNI em exercício
1; painel
; Rogério Marinho, secretário especial de Previdência e Trabalho do Ministério da Economia; Dep. Marcelo Ramos (PR-AM), presidente da Comissão Especial da reforma na Câmara
; Dep. Joice Hasselmann (PSL-SP), líder do governo no Congresso
2; painel
; Leonardo Rolim, secretário de Previdência do Ministério da Economia; Fabio Giambiagi, economista especialista em Previdência
; Selene Peres Nunes, economista especialista em contas públicas
3; painel
; Paulo Tafner, economista especialista em Previdência; Solange Srour, economista-chefe da ARX Investimentos
; Dep. Bia Kicis (PSL-DF), vice-presidente da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara
; Roberto Brant, ex-ministro da Previdência e Assistência Social