Em uma ação inédita, sete ex-ministros do Meio Ambiente se reuniram na manhã desta quarta-feira (8/5), no Instituto de Estudos Avançados da Universidade de São Paulo (USP), para divulgar o comunicado sobre a política ambiental do atual governo. Os ex-ministros, que representam mais de 30 anos de gestão ambiental no Brasil, prometem mobilizar a sociedade. ;É um momento mais do que difícil. É um momento de nonsense, porque estão sendo feita coisas dramáticas para o meio ambiente, para a sociedade e para a economia;, disse Marina Silva, que foi ministra do Meio Ambiente do governo Lula entre 2003-2008, e candidata derrotada à Presidência em 2014 e 2017.
Segundo Marina, a Constituição está sendo desrespeitada, pois o artigo 225 diz que a organização do Estado tem que prover um ambiente saudável para todos os brasileiros e deve criar estrutura, orçamento e políticas políticas para água, floresta e biodiversidade. ;É a primeira vez que temos um governo que assume dizendo que não vai haver nem mais um centímetro de terra indígena, que vai acabar com a farra das multas, inclusive a que ele obteve porque estava pescando onde não deveria. É a primeira vez que temos uma governo que ataca as bases de uma sociedade: educação e meio ambiente. O que está acontecendo é um desmonte. Transforma o nosso país em exterminador do futuro;, afirmou.
Convocação - ;Este é um ponto de partida e não de chegada. Queremos convocar todas a sociedade, o Congresso, a academia. Vamos procurar todos os segmentos da sociedade, até a juventude nas escolas, como na Europa, porque os que está em jogo é o futuro justamente dos jovens que vão experimentar na própria carne as consequências dessa política absolutamente irracional que estamos assistindo;, prometeu Rubens Ricupero, ministro entre setembro de 1993 e abril de 1994, no governo de Itamar Franco.
De acordo com o comunicado, a atual política ambiental arrisca a imagem internacional do Brasil. O documento acusa a governança ambiental de estar sendo desmontada, de enfraquecimento do Ministério do Meio Ambiente e afirma que o governo ameaça áreas protegidas, o Conselho Nacional do Meio Ambiente e o Instituto Chico Mendes.
;O atual governo está desconstruindo a política ambiental. O governo disse que ia incorporar o Ministério do Meio Ambiente ao da Agricultura. Nós protestamos e voltaram atrás, mas não por nossa causa, mas porque o agronegócio ameaçou suspender importações. O governo colocou o MMA como uma extensão da Agricultura. Tudo o que o agronegócio deseja, o MMA faz, porque essa é a política de governo;, disse José Sarney Filho, que foi ministro do Meio Ambiente em duas ocasiões: entre 1989 e 1990, durante o governo do tucano Fernando Henrique Cardoso, e entre abril de 2016 e abril de 2018, no governo de Michel Temer. ;O governo ameaça a Amazônia que, como todos sabem, é muito importante para o mundo. Eles pensam que estão liberando terra para o agronegócio, mas estão enganados. Estão é acabando com o regime de regime de chuvas que garante esses negócios;, afirmou.
Negacionismo - O documento também cita os compromissos do Brasil no Acordo de Paris, as posições negacionistas do governo com relação às mudanças climáticas e critica ausência de diretrizes objetivas. Os ministros alertam sobre risco de aumento descontrolado do desmatamento da Amazônia, criticam o discurso contra órgãos de controle ambiental, como Ibama, ICMBio e Inpe, o afrouxamento do licenciamento ambiental e manifestam preocupações com a política indígenas.
;Falta diálogo com a sociedade, que não deve ser um diálogo virtual. Nunca tivermos uma postura de desconstrução como essa. Está havendo um apequenamento do MMA e um negacionismo climático, expresso por várias autoridades do governo. Mudanças Climáticas é um tema global e geopolítico;, disse Izabella Teixeira, ministra entre 2010 e 2017, durante o governo de Dilma Roussef. Para ela, o governo dá sinais contraditórios que comprometem a imagem internacional do país.
Os ex-ministros criticam ainda a transferência da Agência Nacional de Águas para o Ministério do Desenvolvimento Regional e da demarcação de terras Indígenas e do Serviço Florestal para o Ministério do Meio Ambiente, além da extinção da Secretaria de Mudanças Climáticas. ;Colocar o desenvolvimento do país e de Meio Ambiente como excludentes é uma questão superada desde o estabelecimento dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentáveis, pela ONU. Vincular as mudanças climáticas a marxismo cultural nada tem a ver. Se alguém conseguir me explicar o que o marxismo cultural tem a ver com o governo Médici. A política de Meio Ambiente foi surpreendentemente democrática, quando o Brasil vivia uma ditadura. E agora estamos com uma política autoritária em um regime democrático;, disse José Carlos Carvalho (ministro entre 2002 e 2003 no governo de Fernando Henrique Cardoso). ;O risco não é só para água, para a floresta, para a abelha ou para a abelha Jubarte. O risco é para o planeta. Estão sendo descumpridos todos os acordo internacionais;, alertou Carlos Minc, que sucedeu Marina como ministro do Meio Ambiente no governo do PT.
Também houve críticas a cancelamento, pelo atual governo, da Conferência Climática, que seria realizado no Brasil este ano. ;Deixamos o país pronto e com recursos para a realização da Conferência Climática no Brasil este ano;. Agora, as políticas afirmativas de desenvolvimento sustentável estão ameaçadas. ;Negociamos 125 milhões de euros com Alemanha e com a Noruega 75 milhões de dólares para o Fundo Amazônia no ano passado e agora esses fundos vão passar por novas negociações. São recursos fundamentais;, afirmou Edson Duarte em 2018, durante o governo de Michel Temer.
Além dos ministros presentes à reunião, que foi seguida de coletiva de Imprensa, também assina o documento Gustavo Krause, que foi ministro do Desenvolvimento Urbano e Meio Ambiente no primeiro governo de Fernando Henrique Cardoso, e não compareceu à reunião por motivos de saúde, segundo Ricupero.
Resposta do Ministro - O ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles respondeu com ironia à iniciativa. ;O Ministério do Meio Ambiente recebe com satisfação a carta subscrita por alguns dos ex-ministros de Estado e corrobora, em especial, a conclusão por eles alcançada de que se fazem necessários ;quadros regulatórios robustos e eficientes, com gestão pública de excelência; para a consecução dos objetivos do desenvolvimento econômico sustentável;, diz a nota divulgada ontem à tarde.
A nota do ministro rebateu vários pontos do comunicado e afirma que encontrou nas unidades de conservação ;abandono dos prédios e estruturas, má gestão de recursos financeiros e sucateamento de frota, além de quadro deficitário de pessoal e baixa visitação legados pelas anteriores administrações;. Sobre desmatamento, afirma que ;remonta há mais de 7 anos, cuja curva de crescimento se iniciou em 2012, portanto durante administrações anteriores, que ora pretendem, curiosamente, imputar ao atual governo a responsabilidade pela ausência de ações efetivas ou estratégias eficientes.