Jornal Correio Braziliense

Politica

Ala militar do governo pressiona Bolsonaro contra Olavo de Carvalho

O chefe do Executivo disse que "de acordo com a origem do problema, o melhor é ficar quieto"

A guerra aberta entre militares e o escritor Olavo de Carvalho voltou à tona com mais força do que antes. Depois de o ideólogo hostilizar nas redes sociais o ministro-chefe da Secretaria de Governo, Santos Cruz, oficiais das Forças Armadas iniciaram um contra-ataque dentro do governo e perifericamente. O general Eduardo Villas Boas, ex-comandante do Exército, saiu em defesa da categoria, acusando Olavo, via Twitter, de ;acentuar as divergências nacionais; em um momento em que a sociedade necessita ;recuperar a coesão e estruturar um projeto para o país;.


A mensagem foi interpretada na Esplanada dos Ministérios como um pedido ao presidente Jair Bolsonaro para que isole, de uma vez por todas, o ;guru; das decisões dos ministérios, por causa da influência dele nas pastas da Educação e das Relações Exteriores.

O embate coloca o presidente entre a cruz e a espada. Olavo age como um ministro sem pasta, controlando a ala ideológica do governo por meio da influência conservadora propagada nas redes sociais. O pensamento dele ecoa entre o grupo mais fiel de Bolsonaro: os próprios filhos. Sobretudo o vereador Carlos Bolsonaro (PSC-RJ). O problema é que os ataques atingem diretamente a ala militar, que está incomodada. Na Esplanada e no próprio Palácio do Planalto, oficiais não negam o desconforto e pedem que Bolsonaro escolha mais enfaticamente o lado nesta guerra.

A posição do presidente, no entanto, não convenceu. Ontem, durante coletiva, Bolsonaro disse que, pela origem do problema, ;o melhor é ficar quieto;. Para ele, há coisas mais importantes para discutir no Brasil. ;Aqueles que, porventura, não têm tato político, estão pagando um preço junto à mídia. Mas não existe grupo de militares nem grupo de Olavos entre nós. É tudo um time só;, sustentou. À noite, continuou sem tomar partido. Em nota lida pelo porta-voz da Presidência da República, Otávio Rêgo Barros, o chefe do Executivo federal ponderou que ;declarações individuais publicadas nas mais diversas mídias são de exclusiva responsabilidade daqueles que as emitem;. ;Aliás, (ele) vem se posicionando dessa maneira há algum tempo;, finalizou o porta-voz.

Da parte que se entende da frase de Bolsonaro dita na coletiva, há uma avaliação pouco fiel à realidade na Esplanada, pois o incômodo entre militares e olavistas é cada vez maior. Não há, ainda, um movimento de dissidência e debandada entre os integrantes das Forças Armadas no governo. Os mais incomodados com o embate, porém, afirmam que não são apegados a cargos e alertam que o presidente deve definir quem ele quer na equipe.

Perifericamente, o coro é reforçado por oficiais de fora do governo. O general da reserva Paulo Chagas, candidato a governador pelo Distrito Federal nas últimas eleições, também já foi alvo de Olavo e disse que o escritor e aqueles que o seguem estão atrapalhando o governo. ;Equipe é algo que funciona todos juntos. Se há uma divisão, então o governo não tem uma equipe;, avaliou.

O risco de Bolsonaro não resolver o impasse é a perda do apoio dos militares. É um cenário que Chagas não acredita, mas ressaltou que o presidente precisa tomar uma decisão sobre quem ele quer ao lado antes que o desgaste se amplie. ;Haverá um momento em que os militares vão chegar para o presidente e dizer que ele tem de escolher (um lado). ;Quem o senhor quer que fique aqui para te ajudar? Nós, ou eles? Vai chegar um momento em que estamos atrapalhando, e ninguém quer;. Se quiser manter essa equipe de olavetes, o presidente tem de expressar uma diretriz;, analisou. A leitura, ponderou o general, é disseminada. ;Se não é uma unanimidade nas Forças Armadas, beira isso;, advertiu.

Contra-ataque

O contra-ataque dos militares parte da alta cúpula. As críticas de Villas Boas não são à toa. Como assessor especial do Gabinete de Segurança Institucional (GSI) da Presidência, o recado dele tem dedo do titular da pasta, Augusto Heleno, tido como o chefe dos oficiais no governo. ;A partir do seu vazio existencial, (Olavo) derrama seus ataques aos militares e às FFAA (Forças Armadas), demonstrando total falta de princípios básicos de educação, de respeito e um mínimo de humildade e modéstia;, declarou o ex-comandante do Exército. Ele o definiu, ainda, como ;verdadeiro Trotski (líder comunista) de direita;. ;Não compreende que, substituindo uma ideologia pela outra, não contribui para a elaboração de uma base de pensamentos que promova soluções concretas para os problemas brasileiros;, acrescentou.

O tuíte de Villas Boas mostra que o próprio Heleno está incomodado com Olavo, interpretam oficiais. No entanto, a postura de isenção do chefe do GSI tem irritado parte dos militares. ;Acho difícil que isso tenha ocorrido. Generais como eles não precisam de porta-vozes;, disse um oficial do Exército. O fato, no entanto, é que os ataques de Olavo criaram uma unidade nas Forças Armadas.

A guerra tomou corpo depois que Olavo publicou uma crítica a Santos Cruz. Há um mês, o general comentou, em entrevista a uma rádio, sobre a necessidade de ;disciplinar; as mídias sociais. Em uma resposta ao subordinado, Bolsonaro foi direto e disse que, no governo, a ;chama da democracia; será mantida. ;Sem qualquer regulação da mídia, aí incluindo as sociais;, declarou. Olavo foi agressivo. ;Controlar a internet, Santos Cruz? Controlar a sua boca, seu merda.;

Mourão critica

O vice-presidente Hamilton Mourão reagiu aos ataques do escritor Olavo de Carvalho ao general Carlos Alberto dos Santos Cruz. Para ele, as críticas são ;totalmente sem nexo; e ignorá-las ;será melhor para todo mundo;. Mourão deu as declarações ao chegar, ontem, ao Palácio do Planalto. Mais cedo, ele foi chamado de ;um amigo; pelo presidente Jair Bolsonaro, durante a comemoração dos 130 anos do Colégio Militar, no Rio. O general Augusto Heleno, ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional, foi classificado pelo presidente como ;conselheiro;.

Congresso manda recados

Discussão entre militares e o escritor Olavo de Carvalho repercutiu no Congresso, que promete mandar recados. Deputados e senadores se dividem entre alfinetar olavistas e militares, num confronto que, no balanço geral, implica perda do capital político do presidente Jair Bolsonaro. Para um governo com uma articulação política tão criticada no parlamento, as mensagens pressionam o chefe do Palácio do Planalto a resolver o impasse num momento de tensionamento com a discussão da reforma da Previdência na Comissão Especial da Câmara.

Os primeiros recados começaram a ser dados ontem. O deputado Marco Feliciano (Podemos-SP), vice-líder do governo no Congresso, acusou o ministro-chefe da Secretaria de Governo, Santos Cruz, de ser ;líder de uma facção;, que teria se instalado no governo para descaracterizar pautas defendidas por Bolsonaro durante as eleições. ;Alguns que ocupam cadeiras no Planalto se uniram ao vice-presidente (Hamilton) Mourão para tentar tutelar o presidente;, declarou, em nota.

O parlamentar é ligado à bancada evangélica, uma das frentes temáticas que apoiam Bolsonaro desde o segundo turno das eleições. Por sinal, Feliciano apresentou na Câmara pedido de impeachment contra Mourão. O deputado desfruta do prestígio de ser considerado um dos principais interlocutores políticos do presidente. Ou seja, a mensagem dele tem representatividade dentro da ala conservadora ligada ao escritor Olavo de Carvalho.

A crítica de Feliciano, no entanto, não passou batida. De forma velada, sem fazer menção a nomes, o deputado Fausto Pinato (PP-SP), vice-líder do bloco vencedor das eleições na Câmara, o classificou, em nota, como irresponsável. ;Estou envergonhado, como cidadão e deputado, de ver tanta irresponsabilidade dita por alguns colegas que se dizem cristãos e que, de forma irresponsável e com espírito de divisão, tentam denegrir a imagem de um homem honrado, de reputação ilibada. General herói de guerra, de espírito patriota e moderador, que muito tem colaborado com o governo Bolsonaro;, ressaltou.

;Puxa-saco;

O vice-líder do governo no Congresso ainda foi chamado por Pinato de ;puxa-saco e bajulador; de ;guerrilheiros de redes sociais;, em crítica a Olavo e seguidores. ;Fica aqui meu repúdio por tamanha irresponsabilidade dessas pessoas que não pensam no Brasil e, sim, em massagear o ego próprio de forma delinquente e irresponsável, colocando em risco todo o projeto de direta no país;, disparou. A crítica do pepista tem respaldo de outras lideranças no Congresso, que avaliam Santos Cruz como um articulador equilibrado do Planalto. ;Se Santos Cruz e os militares saírem do governo, acabou;, analisou um líder.

Se a guerra interna do governo permanecer, obrigará o parlamento a encaminhar uma agenda própria, alerta o líder do Podemos na Câmara, José Nelto (GO). ;O governo está se especializando em viver em crise e não em combater a crise econômica. É perigoso perder a confiança, pois dificilmente ela se restabelece. A partir do momento em que isso vai avançando, o Congresso ocupa o espaço de quem representa a sociedade;, advertiu.