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'Estou aprendendo', diz major Vitor Hugo, o líder do governo na Câmara

"Não tenho nada contra você, mas sua escolha não passou por mim", disse o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), ao líder do governo, deputado Major Vítor Hugo (PSL-GO), em recente conversa na casa oficial de Maia. Estava cheia, mas a conversa ocorreu à parte. "O tom foi amistoso", contou Vitor Hugo em entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo, no movimentado gabinete da liderança, na quarta, 10. "A escolha não passou realmente por ele, mas é uma relação que será construída no processo político, ao longo do tempo. Eu estou aprendendo a ser deputado e a ser líder do governo ao mesmo tempo". - O sr. se sente firme no cargo? - Não tenho nenhum indício para não me sentir firme. Estou exercendo o meu cargo com todo o sentimento de confiança do presidente Bolsonaro, e com o apoio da maioria absoluta da bancada. O Vítor Hugo do major 01 do presidente Jair Bolsonaro, como se autodenominou na campanha eleitoral, não é uma homenagem a Victor-Marie Hugo, o escritor francês do século XIX (1802-1885). "Não tem ligação nenhuma", explicou pela milésima vez. "Foi uma homenagem de meu pai a um amigo dele, algo assim", brincou. Baiano de Salvador, niteroiense e goiano - onde nasceu, cresceu e virou político, respectivamente - o major do Exército da reserva não remunerada vai fazer 42 anos no próximo 31 de maio. Tivesse ficado no quartel, e mantido a performance de 01 em tudo, já estaria perto de chegar a general. Mas houve sua mulher, a juíza de direito Flávia Morais Nagato de Araújo, o filho João Vítor, hoje com cinco anos, a vontade de uma vida familiar mais compartilhada em Goiânia, mais próxima a Brasília. Bastou para que o major e também advogado, com OAB, tentasse, em 2014, um concurso para consultor legislativo da Câmara dos Deputados, na área de defesa e segurança nacional. Deu 01 de novo. Assumiu em janeiro de 2015, e trocou a continência pelas excelências. Vitor Hugo de Araújo Almeida foi o 01 no exame nacional para ingresso na Escola Preparatória de Cadetes do Exército, em 1993. Tinha 16 anos. Repetiu a primeira colocação na mesma escola no ano seguinte, espadim entregue pelo então presidente da República Fernando Henrique Cardoso. Na Academia Militar das Agulhas Negras (AMAN) - onde o cadete Bolsonaro, da artilharia, turma de 1977, não passou de regular - Vitor Hugo, da infantaria, foi o 01 geral, o "cadete mais distinto" e o ganhador da cobiçada "viagem de ouro" - uma longa viagem de instrução que em quase sete meses o levou para Nova York, Londres, Roma e outras cidades. Seu currículo conta que atuou em 21 países somando missões de caráter diplomático-militar, visitas, operações especiais e cursos. A primeira excelência a procurá-lo, na consultoria legislativa, foi o então deputado federal Jair Bolsonaro, capitão da reserva. "Quem é o 01 que chegou por aqui"?, saiu perguntando, com o espalhafato do estilo e do espírito de corpo militar. Bolsonaro fez festa, bateu continência, e, brincando, mandou o major pagar algumas flexões. "Eu já o admirava", disse o deputado. Deu consultoria a alguns projetos que Bolsonaro apresentou, principalmente na área de defesa. Nos tempos de quartel, Vítor Hugo saltou de paraquedas, deu tiros, atuou na tríplice fronteira, pegou malária cinco vezes na Costa do Marfim. "Se para isso não faltou coragem, por que eu não vou ter a coragem que o Bolsonaro teve, de encarar os desafios da política?", perguntava-se de vez em quando. "Eu comecei a sentir falta de poder me posicionar". Ao decidir, no segundo semestre da 2016, foi ao gabinete de Bolsonaro, tarde da noite. - Como é que eu faço para usar um broche igual a esse seu na próxima legislatura? - Você tem interesse? É um grande desafio. - Tenho. Estou ciente. - Então tá. Passa a conviver mais aqui com a gente. Nas viagens que eu fizer, pode vir. Eu vou conversar mais com você sobre como é e como não é. O major se engajou. "Ele é formado no mesmo lugar que eu AMAN. Tem a cabeça muito provavelmente semelhante à minha. Quando passei a conhecê-lo de perto a admiração aumentou mais", disse. Com o apoio explícito do candidato a presidente, elegeu-se com 31.191 votos, 1,03% dos válidos, o menor índice de um deputado federal goiano desse 1982. Só entrou porque a eleição recorde do deputado delegado Waldir - 274.406 votos -, ultrapassou o quociente eleitoral. Dos R$ 131 mil que arrecadou, mais da metade, R$ 76,6 mil, saiu da carteira do major e da bolsa da juíza. "Não recebi nada do fundo eleitoral e partidário, e não tive tempo de rádio e TV", disse o deputado-major. "Todos os recursos do partido ficaram concentrados no delegado Waldir, que também por isso teve uma grande votação". O delegado-deputado Waldir é, como se sabe, o livre atirador que lidera o PSL bolsonarista de 55 deputados na Câmara Federal. Não tem qualquer constrangimento em criticar abertamente o major líder do governo, e em dizer, sempre que pode, que seus votos é que o elegeram. "Não me considero devedor", diz o major-deputado. "O mesmo processo que o alçou à liderança do PSL ainda pode ser contestado. Eu não vou liderar esse movimento, porque eu tenho que manter a ponte de diálogo". Ainda conversam, ele conta, aumentando os metros que faltam para a colisão. O governo frequenta com assiduidade e comitivas o gabinete da liderança, no anexo II da Câmara. No dia da entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo, o visitante era o coronel, ops, o ministro Ricardo Salles, do Meio Ambiente. Também já foram lá o general Santos Cruz, da secretaria de Governo; o ministro da CGU, Wagner do Rosário; e o advogado geral da União, André Mendonça, entre outros. Vão tratar de questões políticas e de projetos em andamento. O major chega lá ali pelas oito - depois de deixar o filho na escola -, bate pernas o dia inteiro, com frequentes passagens pelo gabinete do 01 do Planalto, e só sai depois das dez. Bolsonaro o indicou para líder do governo no dia 15 de janeiro - como não deixa de lembrar o tweet fixo com o anúncio da nova patente. "Um grande desafio! Obrigado, 01, pela confiança! Força", respondeu o major de primeiro mandato com três emojis da bandeira do Brasil. "A intenção do presidente era colocar alguém em quem ele confiasse 100%, e que fosse seguir as diretrizes dele para uma relação harmoniosa do Legislativo com o Executivo", disse a retórica séria do major. Ele foi ouvido, por exemplo, na indicação de um colega da AMAN e da consultoria legislativa, Tarcísio Gomes de Freitas, outro 01, para ministro da Infraestrutura. É um líder que se sente à vontade para fazer críticas ao presidente? "Claro", diz o major. "Todas as vezes que eu quis conversar com ele francamente, mesmo dizendo coisas não muito agradáveis, ele ouve, e discorda ou não. Eu é que tenho claro: estou neste posto para representar este presidente". Não se espere, do major, a amplificação dos problemas que abundam. Falta de base parlamentar, impasses no encaminhamento da reforma da previdência, PSL se digladiando, tchutchuca e tigrão irritando o ministro Paulo Guedes na Comissão de Constituição e Justiça? Tudo do jogo, diz o líder. "Nós estamos num momento em que a base do governo não existe. A que existia no passado foi formada através de distribuição de cargos e loteamento de ministérios. E isso não foi feito", afirmou. "Eu não vou reunir os líderes e falar: ó, o ministério tal é teu, esse outro é teu, e partir de agora vote comigo independente de qualquer tema. Isso não vai existir mais. O presidente não quer que isso exista", acredita.