Com o agravamento da crise engatilhada a partir da abertura de um inquérito para investigar ataques e fake news contra o Supremo Tribunal Federal (STF), o ministro Alexandre de Moraes, relator do caso, decidiu recuar. No começo da noite de ontem, ele derrubou a censura aplicada ao site O Antagonista e à revista Crusoé. Na decisão, ele reconhece a existência de um documento anexado a uma das ações da Lava-Jato em que Marcelo Odebrecht afirma que o presidente da Corte, Dias Toffoli, recebeu o codinome ;o amigo do amigo de meu pai; por parte dos executivos da construtora Odebrecht. Apesar de extinguir a censura, Moraes manteve em andamento as diligências que, no começo da semana, resultaram no cumprimento de mandados de busca e apreensão contra críticos ao tribunal, entre eles, o general da reserva do Exército Paulo Chagas.
A decisão do ministro Alexandre de Moraes ocorreu após pressão realizada por outros integrantes do STF, como Celso de Mello, que declarou que o impedimento à circulação de informações é ;ilegítima; e ;incompatível com o regime das liberdades fundamentais consagrado pela Constituição da República;. ;O Estado não tem poder algum para interditar a livre circulação de ideias ou o livre exercício da liberdade constitucional de manifestação do pensamento ou de restringir e de inviabilizar o direito fundamental do jornalista de informar, de pesquisar, de investigar, de criticar e de relatar fatos e eventos de interesse público, ainda que do relato jornalístico possa resultar a exposição de altas figuras da República;, argumentou Celso, em carta pública.
O ministro prosseguiu, rechaçando qualquer possibilidade de contenção da livre circulação de ideias. ;A prática da censura, inclusive da censura judicial, além de intolerável, constitui verdadeira perversão da ética do direito e traduz, na concreção do seu alcance, inquestionável subversão da própria ideia democrática que anima e ilumina as instituições da República;, completou o magistrado.
De acordo com informações de fontes ouvidas pelo Correio, Moraes conversou com colegas da Corte antes de decidir autorizar a publicação da reportagem. Diante da grande repercussão do assunto, inclusive no Poder Legislativo e no Executivo, ele foi aconselhado a recuar, e impedir que o tema se prolongue, causando um desgaste à imagem do Supremo, em um caminho que se tornava mais perigoso a cada hora.
Em entrevista ao Valor, Toffoli defendeu o bloqueio do conteúdo jornalístico, por ser publicado pouco antes do julgamento sobre a legalidade da prisão em segunda instância e citou tentativas de atrapalhar o Poder Judiciário. ;É ofensa à instituição à medida que isso tudo foi algo orquestrado para sair às vésperas do julgamento em segunda instância. De tal sorte que isso tem um nome: obstrução de administração da Justiça;, declarou.
A revogação
Na decisão anterior, que determina que o grupo responsável pela revista Crusoé retirasse do ar a reportagem intitulada ;o amigo do amigo de meu pai;, Moraes descreveu que o ato partiu de uma solicitação de Toffoli, que alegou se tratar de fake news. Para fundamentar as declarações de inexistência da informação, Toffoli usou como argumento uma nota publicada pela Procuradoria-Geral da República (PGR), na segunda-feira (15/4), em que a entidade informava não ter conhecimento das declarações de Marcelo Odebrecht.No entanto, o juiz Luiz Antônio Bonat, titular da 13; Vara Federal de Curitiba, reconheceu a existência do documento, o que fundamentou a decisão do ministro Alexandre de Moraes. ;Comprovou-se que o documento sigiloso citado na matéria realmente existe, apesar de não corresponder à verdade o fato de que teria sido enviado anteriormente à PGR para investigação;, destaca um trecho do documento.
Moraes continua, descrevendo que os documentos foram enviados ao Ministério Público Federal (MPF) e ao próprio Supremo pela Polícia Federal. ;A existência desses fatos supervenientes ; envio do documento à PGR e integralidade dos autos ao STF ; torna, porém, desnecessária a manutenção da medida determinada cautelarmente, pois inexistente qualquer apontamento no documento sigiloso obtido mediante suposta colaboração premiada, cuja eventual manipulação de conteúdo pudesse gerar irreversível dano à dignidade e à honra do envolvido e da própria Corte, pela clareza de seus termos. Diante do exposto, revogo a decisão anterior que determinou ao site O Antagonista e à revista Crusoé a retirada da matéria intitulada ;O amigo do amigo de meu pai; dos respectivos ambientes virtuais;, conclui.