As prisões do ex-presidente Michel Temer, do ex-ministro Moreira Franco e de outras 10 pessoas, nesta quinta-feira (23/03), em mais uma etapa da Operação Lava-Jato, abalaram o mercado, reflexo do temor de um enfraquecimento da base aliada do MDB no Congresso e atraso na aprovação da reforma da
Previdência. Para analistas, as prisões geram incerteza política, atrapalhando, no curto prazo, a articulação no Legislativo. Além disso, avaliam os especialistas, a turbulência acirra a confrontação entre os Três Poderes, criando obstáculos ao consenso.
Segundo o cientista político da Arko Advice, Cristiano Noronha, o maior problema do governo tem sido justamente a articulação no Congresso. ;As prisões devem embaralhar a reforma da Previdência no curto prazo, porque o MDB tem a maior bancada no Senado e uma boa representação na Câmara;, afirmou. Apesar de considerar que o episódio vai tumultuar o ambiente político, Noronha acredita que não terá poder de alterar a perspectiva de aprovação neste ano.
;Sem dúvida nenhuma o MDB é importante no apoio para a reforma. Mas a decisão foi no âmbito no Judiciário. O que o Parlamento quer é entender qual foi o fundamento das prisões para saber se há consistência ou se foi ativismo judiciário. Isso vai criar um embaraço no curto prazo;, explicou. O especialista lembrou que havia a mesma preocupação quando Lula foi preso, e o impacto, de certa forma, foi menor do que o esperado. ;Claro que a prisão de mais um ex-presidente gera incerteza, mas não tem poder para paralisar o Congresso por tanto tempo.;
Confrontação
No entender de Paulo Calmon, diretor do Instituto de Ciência Política da Universidade de Brasília (UnB), além de elevar a incerteza no cenário político, as prisões devem acirrar a confrontação entre os Três Poderes. ;Já está ocorrendo um conflito importante entre os Poderes. Esse episódio pode ter desdobramentos que, de certa forma, intensifiquem essa confrontação;, considerou. Calmon destacou que ainda não está claro o que vai ocorrer. ;É cedo para saber se vai ocorrer contestação no Supremo Tribunal Federal ou como Executivo e Legislativo vão agir;, ponderou.
O professor ressaltou, contudo, que num ambiente de conflito e incerteza, a formação de uma coalizão grande ou consenso em torno de determinadas propostas fica mais difícil. ;Especialmente uma tão controversa e complexa, como a reforma da Previdência. Tudo depende dos desdobramentos. Se será um episódio isolado ou se criará a possibilidade de outros conflitos, dificultando o consenso;, reforçou.
Para o especialista, o grupo de Temer era relativamente articulado, sob sua liderança. ;Obviamente, na medida em que essa liderança some, vai presa, o grupo fica acéfalo. Isso não significa que não se possa estabelecer uma nova coordenação. Tudo vai ter de ser refeito. É mais um desafio para o governo Bolsonaro;, afirmou.