A força dada por Bolsonaro a Guedes é estratégica e caminha em linha com a articulação política. Pessoas próximas ao presidente eleito o alertam para a importância de, desde já, entregar ao mercado sinalizações do como será a política econômica do próximo governo. As definições dos nomes apresentados até agora agradam aos agentes econômicos e investidores.
O resultado prático da lua de mel com o mercado tende a se converter em previsões melhores para a economia em 2019. As perspectivas serão usadas pelo governo como argumento para articular a aprovação de projetos no Congresso Nacional, como a reforma da Previdência, a fim de materializar as expectativas em investimentos e contratações no mercado de trabalho.
Sem contar com o bom humor do mercado e sinais de reação na economia real, interlocutores de Bolsonaro temem que o Congresso fique resistente a votar a agenda econômica. Diante da necessidade de evitar um cenário de desconfiança de parlamentares e, assim, ampliar a base governista, Bolsonaro admite que está dando liberdade a Guedes para a indicação de nomes da equipe econômica. ;Estou dando carta branca a ele. Tudo que é envolvido com economia é ele quem está escalando o time. (Tem que) Enxugar a máquina e buscar, realmente, fazê-la funcionar para o bem-estar da nossa população;, declarou o presidente eleito. Questionado sobre Monteiro na presidência do BB, disse que ;talvez vá;. ;Mas não está certo ainda;, completou.
A força de Guedes é reconhecida nos bastidores. O histórico de Levy como ministro da Fazenda da ex-presidente Dilma Rousseff motivou Bolsonaro a discordar do guru econômico a respeito da indicação à presidência do BNDES. O futuro ministro da Economia, no entanto, conseguiu convencê-lo do contrário. Expressou que Levy é um profissional de sua confiança e tem o perfil alinhado com o pensamento liberal na economia proposto pelo governo, a exemplo de Castello Branco.
Privatização
Durante a paralisação dos caminhoneiros, iniciada ao fim de maio deste ano, Castello Branco avaliou ser ;urgente a necessidade de privatizar não só a Petrobras, mas outras estatais;. Ontem, após a indicação confirmada pela assessoria de Guedes, deu pistas sobre a possibilidade de privatização de parte da estatal. ;A Petrobras desenvolve outras atividades que não são naturais e que não atraem retorno. O melhor exemplo disso é a distribuição de combustíveis;, ponderou.
A competência da Petrobras, reforçou Castello Branco, é na exploração ; com prioridade ao pré-sal ; e na produção de petróleo, ao criticar a BR Distribuidora. ;A BR é uma cadeia de lojas, no fim das contas;, declarou. Para ele, também não faz sentido a Petrobras deter o monopólio na prática do refino. Das 17 refinarias no país, 13 são da estatal, o que confere a ela cerca de 95% da produção da gasolina. ;A Petrobras pode rever o monopólio nessa área. A competição é favorável a todos: à Petrobras e ao Brasil.;
O futuro presidente da Petrobras, Roberto Castello Branco, defendeu que a abertura do mercado no setor de petróleo e gás é positivo até para o combate à corrupção. ;O ideal é que você tenha um mercado competitivo. Além das medidas de compliance, a competição é o melhor remédio contra a corrupção. A corrupção tem oportunidade de se manifestar onde existe monopólio: nos preços, nas relações políticas, pelos favores; Para a Petrobras, a competição será um antídoto permanente contra esse tipo de coisa que a sociedade não tolera mais;, disse.
A completa privatização da Petrobras não está nos planos de Bolsonaro. Por considerá-la uma empresa estratégica, ele admite que apenas parte dela seja negociada com o setor privado. ;Não toda. Eu não sou uma pessoa inflexível, mas nós temos que, com muita responsabilidade, levar avante um plano como esse. Vamos conversar sobre isso;, afirmou.
O vice eleito, general Hamilton Mourão (PRTB), adotou discurso semelhante. ;Temos falado que o núcleo duro, a prospecção, onde está a inteligência e conhecimento, não será privatizado. Mas podemos negociar a distribuição e o refino;, declarou. Na semana passada, em videoconferência com investidores norte-americanos, comunicou que o governo estuda a venda da BR Distribuidora.
Perfil
Liberal e experiente
O escolhido para presidir a Petrobras, Roberto Castello Branco, tem uma vasta experiência e um currículo invejável. Doutor em economia pela Fundação Getúlio Vargas (FGV) e pós-graduado em economia pela Universidade de Chicago, foi diretor de Normas e Mercado de Capitais do Banco Central (BC) no governo do ex-presidente José Sarney. Em 1999, se tornou diretor de Relações com Investidores e economista-chefe da Vale, cargo que exerceu por 15 anos. Atualmente, é diretor do Centro de Estudos em Crescimento e Desenvolvimento Econômico da FGV.
Entre 2015 e 2016, foi membro do conselho de administração da Petrobras. À época, se manifestou contrariamente ao subsídio dado aos preços dos derivados de petróleo e o grande volume de investimentos em refinarias. Também criticou a política de conteúdo local, voltada para ampliar a participação da indústria nacional no setor. O argumento era de que tal política criou condições para o funcionamento do esquema de corrupção apurado pela Operação Lava-Jato. Liberal da escola de Chicago, é a favor do livre mercado. Defende privatizações como indutor ao combate à corrupção e ao ganho de produtividade por meio da concorrência.
Reunião é adiada
A reunião entre o ministro-chefe da Casa Civil, Eliseu Padilha, e o secretário-geral do Gabinete de Transição, Gustavo Bebianno, que ocorreria na manhã de ontem, foi cancelada por problemas de agenda. Padilha passou o feriado em Porto Alegre e, segundo a assessoria de imprensa, não chegaria a tempo para o encontro. O ministro Padilha foi escolhido por Temer como o coordenador da transição pelo lado do atual governo, que se comprometeu a passar todas as informações necessárias para a equipe de transição escolhida pelo presidente eleito, Jair Bolsonaro.