Implicado por um delator no escândalo de fraudes em registros sindicais no Ministério do Trabalho, o ministro-chefe da Secretaria de Governo da Presidência da República, Carlos Marun (MDB), passou a ser formalmente investigado por suspeita de corrupção, lavagem de dinheiro e associação criminosa no âmbito da Operação Registro Espúrio. Este é um dos três inquéritos que o ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal, mandou abrir a pedido da Procuradoria-Geral da República (PGR) para a continuidade das investigações - cinco deputados e dois senadores também são alvo. A PGR denunciou 26 pessoas no dia 27 de agosto por organização criminosa.
Um dos novos inquéritos foi aberto para apurar suspeitas de corrupção e lavagem de dinheiro envolvendo os senadores Dalírio Beber (PSDB-SC) e Cidinho Santos (PR-MT) identificadas ao longo da operação, que teve três fases. Num terceiro inquérito, PGR e a Polícia Federal vão apurar suspeita de crimes de corrupção passiva, corrupção ativa e lavagem de dinheiro por parte dos deputados federais Jovair Arantes (PTB-GO), Cristiane Brasil (PTB-RJ), Paulinho da Força Sindical (SD-SP), Wilson Santiago Filho (PTB-PB) e Nelson Marquezelli (PTB-SP) - os cinco denunciados no fim de agosto por supostamente integrarem organização criminosa. Fachin deu 15 dias para que as defesas dos parlamentares apresentem resposta à denúncia.
Também por decisão de Fachin, os outros 21 denunciados por organização criminosa, incluídos o ex-ministro do Trabalho Helton Yomura e o presidente nacional do PTB, Roberto Jefferson, tiveram a acusação formal desmembrada e encaminhada à 10; Vara Criminal da Justiça Federal do Distrito Federal, por não terem prerrogativa de foro no Supremo. A pedido da procuradora-geral da República, Raquel Dodge, os investigados que não chegaram a ser denunciados junto com os 26 também continuarão sob a mira do Ministério Público, agora na primeira instância, também no Distrito Federal, para aprofundamento das apurações. Entre eles está o presidente da União Geral dos Trabalhadores (UGT), Ricardo Patah - um dos 13 nomes que, segundo a PF, faziam parte da suposta organização criminosa mas que não foram incluídos na denúncia pela PGR.
;Demandas;
Nomeado articulador político do governo Temer no fim de dezembro, o ministro Carlos Marun teria demandado, segundo as investigações, a aprovação de registros sindicais de três entidades de Mato Grosso do Sul - o Estado pelo qual, em 2014, o advogado e engenheiro gaúcho foi eleito para seu primeiro mandato como deputado federal.
Os pedidos teriam sido repassados por intermédio de sua chefe de gabinete, Vivianne Lorenna Vieira de Mello, ao ex-coordenador de registro sindical da pasta, Renato Araújo Júnior. Preso preventivamente na primeira fase da Registro Espúrio, Araújo assinou acordo de colaboração premiada e entregou as informações que baseiam a abertura de inquérito contra o ministro.
Araújo afirmou que, em uma reunião em maio com a assessora de Marun e com Júlio "Canelinha" Bernardes - na época, chefe de gabinete do então ministro do trabalho Helton Yomura -, "Viviane repassou ao depoente uma folha de papel contendo o nome e o CNPJ de três entidades". As "demandas" se referiam ao Sindicato dos Servidores do Poder Judiciário Federal e do Ministério Público do Estado de Mato Grosso do Sul, ao Sindicato dos Trabalhadores e Servidores da Secretaria de Administração do MS e ao Sindicato dos Servidores Públicos Municipais de Parnaíba/MS. "Viviane disse que havia ordem direta de Carlos Marun para o deferimento do registro sindical das três entidades", acrescentou Renato, ainda sobre a reunião.
O ex-coordenador de registro sindical contou que o pedido em relação a um desses três sindicatos sequer cumpria os requisitos legais para obtenção do registro sindical. "Mesmo assim, considerando a ordem advinda de Carlos Marun, disse que era para Jéssica (funcionária) fazer a nota deferindo o registro", relatou Renato Araújo. A nota só não foi elaborada porque eclodiu a primeira fase da Registro Espúrio e tanto Renato como Jéssica foram presos.
Fotografias juntadas aos autos do inquérito da Registro Espúrio mostram a proximidade de Marun com a cúpula do Ministério do Trabalho - já denunciada. Elas registram, segundo a Polícia Federal, uma "reunião festiva, provavelmente realizada no dia de um dos jogos do Brasil na Copa do Mundo de 2018, na qual estavam presentes, dentre outras pessoas, o então ministro Helton Yomura, seu chefe de gabinete Júlio de Souza Bernardes (Canelinha) e o ministro-chefe da Secretaria de Governo da Presidência da República Carlos Marun".
A PF cita "esforço de Renato Araújo Júnior e Julio de Souza Bernardes para atender de forma ilícita os pleitos do ministro-chefe da Secretaria de Governo, tudo realizado com a ciência e o aval do então ministro Helton Yomura". "Dentro desse contexto, Renato, em depoimento prestado em Sede Policial, foi categórico ao afirmar que ;o chefe de gabinete do Ministério do Trabalho, Julio de Souza Bernardes, conhecido como Canelinha, determinou ao depoente que atendesse sem questionar as demandas advindas do Planalto e de Carlos Marun", disse a PF.
Prisões
Edson Fachin decidiu deixar também para a análise da 10; Vara os pedidos de liberdade feitos por presos preventivos na Operação Registro Espúrio. Considerando que assinou acordo de colaboração premiada, a PGR havia se posicionado a favor do relaxamento da prisão de Renato Araújo Júnior e a conversão para um regime de prisão domiciliar noturna com o uso de tornozeleira eletrônica durante o dia.
Além de Renato, outros seis membros do núcleo administrativo da organização criminosa, segundo denúncia apresentada pela PGR, ainda estão presos e também passam à jurisdição da 10; Vara Criminal da Justiça Federal do DF: Carlos Cavalcante Lacerda, ex-secretário de Relações do Trabalho do Ministério do Trabalho; Leonardo Cabral Dias, ex-coordenador de registro sindical do ministério; Renata Frias Pimentel, ex-chefe de divisão na Secretaria de Relações do Trabalho; Jéssica Mattos Rosetti Capeletti, ex-servidora do ministério; Leonardo José Arantes, ex-número 2 do Ministério do Trabalho; e Rogério Papalardo Arantes, ex-diretor do Incra que teria buscado influenciar processos no Ministério do Trabalho. Os dois últimos são sobrinhos do deputado Jovair Arantes.
Carlos Marun
Em relação a informação vazada ao Jornal O GLOBO de que foi autorizada pelo ministro Fachin a abertura de inquérito contra mim, a recebi com a tranquilidade de quem nada deve e portanto nada teme. Nada fiz que extrapole as minhas funções previstas no ordenamento jurídico e não recebi nenhuma vantagem, devida ou indevida, pelas ações que desenvolvi em prol de Sindicatos de MS. Estou consciente de que o constrangimento que me impõe com esta medida é real e lamento o fato de que ao final não poderei buscar a reparação destes danos, haja visto que os que me acusam não serão sequer investigados. Afirmo também a minha confiança nas atitudes de minha assessora Dra Vivianne Lorenna Vieira e lamento o constrangimento que ela está passando em função desta tendenciosa acusação que tem por objetivo me atingir e intimidar. Sei que sou alvo de uma intimidação sob a forma de inquérito, mas desde já reafirmo todas as críticas que fiz a atitudes e decisões indevidas e ilegais que estão sendo tomadas por autoridades que deveriam zelar pelo estrito cumprimento da lei. Por fim destaco a necessidade da aprovação de legislação que permita a punição de Abusos de Autoridade, para que pessoas indevidamente constrangidas possam ser indenizadas e eventuais culpados punidos.
Cristiane Brasil
"A Polícia Federal e o Ministério Público tornaram-se assassinos de reputações. Sem provas, acusam a esmo. É o que ocorre agora com o relatório final da Operação Registro Espúrio, preparado pela Polícia Federal e endossado pelo Ministério Público para criar um fato político contra políticos. Apesar de as investigações transcorrerem no período de um ano, utilizam a troca de mensagens de 17 dias (entre 13 de maio e 30 de maio deste ano) entre a deputada Cristiane Brasil e um ex-funcionário do ministério para firmar convicção de que ela integra uma organização criminosa. A Polícia Federal e o Ministério Público insistem em tratar pedidos políticos _ comuns a todos os parlamentares, de todos os partidos, em todos os ministérios _ em crime. Crime é acusar sem provas, como fazem a PF e o Ministério Público, com objetivos puramente político-paritários. A deputada provará sua inocência mais uma vez, como já o fez em outras ocasiões, com a consciência tranquila de que nada fez de errado", disse Luiz Gustavo Pereira da Cunha, advogado.