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Temer, Pezão e Netto se reúnem no RJ para acertar detalhes da intervenção

De acordo com o Ministério da Defesa, o contingente que será enviado ao Rio de Janeiro ainda não está definido

A princípio, até 31 de dezembro deste ano, a segurança pública e o sistema prisional do Rio de Janeiro estão sob o comando das Forças Armadas. Em decisão inédita ; pelo menos desde a promulgação da Constituição de 1988 ;, uma intervenção federal é feita em uma unidade da Federação. Um Rio de Janeiro que foi do sonho das Olimpíadas de 2016 às páginas policiais, vendo, inclusive, a prisão de três ex-governadores. Saiu da expectativa de se tornar exemplo de modelo econômico da década à falência. E, que teve, nesta semana, a principal vitrine, o carnaval, manchada por assaltos, arrastões, facadas e mortes. Só em 2018, são mais de 200 assassinatos.


Desde ontem, Walter Souza Braga Netto, comandante militar do Leste, que chefiou as operações das Olimpíadas de 2016, tem superpoderes. Além do atual comando militar do Leste, responderá pelas polícias civil e militar, o Corpo de Bombeiros, a área de inteligência do Rio e por todo o sistema prisional. A complexa missão caiu em seu colo assim que retornou de férias e, durante coletiva no Palácio do Planalto, parecia ainda não estar totalmente inteirado do assunto.

Ao assinar o decreto 9.288/18 ; que ainda será aprovado pelo Congresso ;, o presidente Michel Temer foi duro ao justificar a adoção da intervenção. O peemedebista, que estará hoje no Rio, prometeu que adotará as providências necessárias para enfrentar e derrotar o crime organizado e as quadrilhas. ;Não podemos aceitar passivamente a morte de inocentes. É intolerável que estejamos enterrando pais e mães de famílias, trabalhadores, policiais, jovens e crianças, e vendo bairros inteiros sitiados;, afirmou. ;Não vamos aceitar que matem nosso presente nem continuem a assassinar o nosso futuro.;

Elaborada pelo ministro da Defesa, Raul Jungmann, com a ajuda dos chefes da Justiça, Torquato Jardim, e do Gabinete de Segurança Institucional, Sérgio Etchegoyen, a proposta, referendada por Temer, pegou muitos de surpresa. A presença das Forças Armadas no Rio, porém, não é novidade. Nos últimos anos, militares têm dado assistência em ocupações em favelas, como no Complexo do Alemão e da Maré, e em grandes eventos como as Olimpíadas.

Mais recentemente, têm atuado em missões de Garantia da Lei e da Ordem para apoiar operações contra o tráfico de drogas e roubo de cargas. Só que, agora, o Exército assumirá o comando da segurança, em linha direta com Temer. A notícia de supetão não foi vista com bons olhos. Os comandantes militares foram avisados, no início da madrugada, da ação inédita e aguardam mais detalhes de como será, na prática, a atuação e, principalmente, a proteção legal dos soldados que atuarem na cidade.

Para se resguardar, o comandate do Exército, Eduardo Villas Bôas, deixou claro, por meio de postagem no Twitter, que Braga Netto estará sob comando direto do presidente da República. ;Concluímos que a missão enlaça o general diretamente ao senhor PR. Ele terá todo o apoio do @exercitooficial. As FA continuarão cumprindo as suas missões de GLO no RJ;, disse em um post. Em seguida, complementou: ;Os desafios enfrentados pelo estado do RJ ultrapassam o escopo de segurança pública, alcançando aspectos financeiros, psicossociais, de gestão e comportamentais. Verifica-se, pois, a necessidade de uma honesta e efetiva ação integrada dos poderes federais, estaduais e municipais;.

Desconforto

Também pego de surpresa, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM), eleito deputado federal pelo Rio de Janeiro e filho do ex-prefeito da cidade César Maia, primeiramente, reagiu mal à notícia. Chamado na quinta-feira à noite ao Palácio da Alvorada para ser informado da decisão, teria reclamado por não ter sido consultado. Na manhã de ontem, mais calmo, em café com jornalistas, ressaltou a gravidade da medida e frisou diversas vezes que é um plano que ;não pode dar errado;. ;Não tem como errar, não dá para perder, porque é uma decisão extrema. Está se dando um salto triplo sem rede;, comparou. Maia também afirmou que a decisão interfere na votação da reforma da Previdência.

Já o governador do Rio de Janeiro, Luiz Fernando Pezão (MDB), que vinha sendo avisado da decisão há uns dias, negou desconfortos. ;Ficar sob o comando da força de segurança e do general Braga Netto para nós não nos diminui em nada. Vejo isso como oportunidade única e que cada vez mais acho que o Brasil vai demandar isso das Forças Armadas. De maneira nenhuma acho desconfortável;, afirmou. Para Pezão, a medida não foi tomada antes por não ser uma questão simples. ;Daqui a pouco pode ser demandado no Brasil inteiro. Está sendo uma experiência nova e o presidente finalmente resolveu assumir e ele aceitou fazer isso. As Forças Armadas não foram feitas para combater um crime de rua;, disse Pezão.

Muito criticado por ter viajado à Europa durante o período de carnaval e a onda de violência que assolou o Rio de Janeiro nos últimos dias, o prefeito da cidade, Marcelo Crivella (PRB-RJ) retornou ontem ao Brasil. Também foi pego de surpresa pela notícia da intervenção na segurança pública do estado. Por meio de nota, o prefeito agradeceu a decisão e lamentou a ação não tenha sido tomada antes. ;Agradeço e parabenizo o presidente Temer pela ajuda ao Rio. No lançamento do Calendário Rio de Janeiro a Janeiro foi o que eu pedi. Lamento que isso não tenha ocorrido naquela ocasião;, afirmou.

Os detalhes da intervenção ainda serão organizados entre o Ministério da Defesa, o presidente, as Forças Armadas e o próprio interventor, general Braga Netto. Em reunião hoje, no Palácio Guanabara, no Rio, Temer, Pezão e Netto definirão, na prática, como começará a funcionar o esquema. De acordo com o Ministério da Defesa, o contingente que será enviado ao Rio de Janeiro ainda não está definido e, até lá, não é possível saber quanto será o custo da operação, mas as autoridades garantem que ele estará contemplado nas previsões de despesas do orçamento atual da pasta, sem valores adicionais.

Entenda o caso

Amplos poderes

O decreto presidencial 9.288/18, que formaliza a intervenção federal no Rio de Janeiro, dará ao interventor amplos poderes para promover ações integradas entre as Forças Armadas,
a secretaria de segurança pública, a Polícia Militar, a Polícia Civil, o Corpo de Bombeiros, e o sistema prisional. A ordem é otimizar e assegurar um trabalho conjunto das frentes de segurança.

A intervenção é, basicamente, uma ampliação da Garantia da Lei e da Ordem (GLO), já acionada no Rio de Janeiro em outras ocasiões em 2017. O diferencial é que o interventor terá todos os poderes para garantir a integração. Isso prevê:
; Que militares façam prisões em flagrante. As Forças Armadas continuarão tendo o poder de policiamento ostensivo da Polícia Militar. Poderão realizar patrulhamento, buscas em residência, além de revistas de pessoas e veículos.

; O uso das Forças Armadas implica que poderão atuar no reforço da segurança pública membros do Exército, da Marinha e da Aeronáutica. O uso dos militares poderá ser utilizado de maneira conjunta com as forças estaduais de segurança, ou individual.
; Diferentemente de um GLO tradicional, que opera de forma episódica, em períodos mais curtos, a intervenção prevê a atuação integrada das Forças Armadas com os órgãos de segurança estaduais até 31 de dezembro deste ano. Ou até quando o presidente Michel Temer julgar necessária a revogação.

A intervenção já está valendo, mas ainda precisa passar pela aprovação do Congresso. Entenda os passos:
; O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), marcou a sessão de votação do decreto para às 19h de segunda-feira. Em plenário, um relator será designado por Maia para elaborar um Projeto de Decreto Legislativo com um parecer aprovando ou não o texto presidencial. Tudo é feito no mesmo dia já que a matéria tramita em regime de urgência. Com quórum de 257 deputados em plenário, a votação pode ser iniciada e, para aprovação, são necessários os votos da maioria simples, ou seja, metade dos presentes mais um. A votação é simbólica.

; Ao ser aprovado na Câmara, o projeto é encaminhado ao Senado que deve apreciá-lo na terça-feira. O mesmo processo acontece ; um relator será designado pelo presidente do Senado, Eunício Oliveira (MDB-CE), e, por maioria simples, os senadores aprovam ou rejeitam o texto presidencial.

*Colaborou Deborah Fortuna