A maioria dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) votou para que a segunda denúncia contra o presidente Michel Temer fosse enviada à Câmara dos Deputados. A sessão, que começou por volta das 15h, foi suspensa às 18h50 desta quarta-feira (20/9) e deve ser retomada amanhã. O placar parcial é de 7 a 1, ou seja, sem possibilidade de ser revertido, já que a Corte conta com 11 ministros.
Temer foi denunciado pelo ex-procurador-geral da República, Rodrigo Janot, por organização criminosa e obstrução da Justiça. Amparada na delação da JBS, a acusação contra o presidente foi apresentada em 14 de setembro.
A provável decisão do STF de encaminhar diretamente à Câmara a denúncia, e deixar para depois a análise da validade das provas da delação da J, contrariando o que querem os advogados de Temer, deve prejudicar a estratégia do Planalto de acelerar a agenda econômica na Câmara.
Qualquer investigação contra o presidente da República só pode ser aberta com a aprovação de dois terços da Câmara, equivalente a 342 deputados. A primeira denúncia contra Temer foi barrada no plenário da Casa pelo placar de 263 a 227, com 19 ausências e duas abstenções.
Veja como foi a sessão:
Sessão é suspensa e será retomada nesta quinta-feira (21/9)
Gilmar Mendes defende devolução à PGR
O ministro Gilmar Mendes iniciou seu voto lembrando que todas as denúncias anteriores contra presidentes foram remetidas imediatamente à Câmara dos Deputados. Mendes lembrou que boa parte da denúncia trata de temas anteriores ao mandato de Temer.
O ministro destacou que a ação penal contra o presidente é um processo jurídico, e a autorização da Câmara um ato político dentro do andamento.
"Mesmo que o crime seja permanente, o presidente só pode ser condenado por crimes cometidos no mandato. Os demais devem ser separados. Se a PGR acredita que é minimamente viável deveria ter formulado com algo possível", afirmou.
O ministro Gilmar Mendes comentou ainda sobre a atuação do ex-procurador-geral da República Marcelo Miller. "A participação dele é dos dois lados do balcão", criticou. "Já se falava da atuação exótica do procurador (Marcelo Miller). Aquilo que se falava à boca pequena e à boca grande se confirmou". "Deus é brasileiro: os bandidos confessaram a bandidagem em um ato jurúnico de se autogravarem", continuou o ministro.
"Miller era chamado de Massaranduba no Itamaraty, por sua grosseria", ironizou Gilmar, citando personagem famoso do Casseta & Planeta.
Gilmar Mendes destacou que foram os próprios delatores que entregaram a gravação que gerou o questionamento da delação premiada dos executivos da JBS.
Por fim, o ministro defendeu que a denúncia fosse devolvida à PGR e não enviada à Câmara até que a Corte avalie a validade das delações da JBS.
Lewandowski acompanha integralmente o relator
Já há maioria dos ministros com voto a favor da denúncia para análise da Câmara dos Deputados. O ministro Ricardo Lewandowski acompanhou integralmente o relator.
Dias Toffoli vota com o relator em relação à validade das provas, mas ressalta "divergências"
O ministro Dias Toffoli votou em conformidade com Fachin. Porém, ressaltou ter "divergências teóricas" com o relator da denúncia. Toffoli iniciou seu voto questionando os demais ministros. "Cinco anos atrás, esperaríamos a deliberação da Câmara para analisar fatos, alguns deles, praticados antes do mandato?".
Em seu entendimento, quando não há presentes pressupostos processuais ou justa causa na denúncia, o STF pode analisá-la previamente à Câmara. "A análise não é mecânica, podendo haver rejeição liminar por falta de justa causa", disse.
Toffoli afirmou ainda que um presidente não poderia responder por atos anteriores ao seu mandato. "Isso importaria impor ao presidente um constrangimento", explicou. "O relator tem o poder de, monocraticamente, encaminhar para a presidência do STF, que encaminha à Câmara. Mas pode também propor a esse plenário a rejeição liminar, se for inepta ou não haver justa causa presente".
Em seu voto, Toffoli alegou que caberia análise preliminar, sem encaminhamemto direto à Câmara porque existem atos anteriores ao mandato na denúncia, concordando, assim, com o que disse, pouco antes, Gilmar Mendes.
Mendes alfineta Janot
Gilmar Mendes destacou que existem fatos anteriores ao mandato de Temer na denúncia de Janot. Assim, o ministro concorda com a defesa de Temer, que usa esse argumento para justificar o pedido de devolução da denúncia à PGR. "Há casos de 2006. Devemos bater o carimbo? Está evidente que os fatos descritos são claramente anteriores ao mandato", afirmou. Em sua fala, Mendes alfinetou ainda o ex-procurador-geral Rodrigo Janot, seu desafeto: "O doutor Janot vai conseguir superar Cláudio Fontelles em termos de inépcia".
Barroso, Fux e Rosa Weber também seguem voto do relator, que encaminha denúncia à Câmara
O ministro Roberto Barroso acompanhou integralmente o voto do relator da denúncia, ministro Edson Fachin. Segundo ele, "não há qualquer razao para se antecipar qualquer juizo", e palavra sobre o prosseguimento da denúncia está com a Câmara dos Deputados. "Não é possível tirar a prerrogativa da Câmara de decidir se cabe a denúncia de que dirigentes de partidos políticos indicavam diretores para desviar dinheiros por esquemas criminosos".
Barroso ressaltou que o oferecimento da denúncia é uma prerrogativa do Ministério Público, e, portanto, não é tecnicamente possível sustá-la. Assim como Moraes, o ministro afirmou que este não é o momento adequado para discutir a validade das provas apresentadas. "Não dá para se absolver ou acusar sem investigar", encerrou.
A ministra Rosa Weber também acompanhou o voto do relator de forma integral. A ministra ressaltou que o juízo político da Câmara dos Deputados sobre a denúncia deve ocorrer antes da análise da Corte.
O ministro Luiz Fux foi o quinto a acompanhar integralmente o voto do relator. Fux destacou a gravidade do caso, mas disse que não é possível deixar de "obedecer o devido processo legal"
Segundo a votar, Moraes acompanha Fachin e defende envio à Câmara
O ministro Alexandre de Moraes foi o segundo a encaminhar seu voto na sessão do STF. Assim como Fachin, ele também decidiu encaminhar a matéria para apreciação na Câmara dos Deputados e, em caso de aceitação, debater posteriormente a denúncia no STF.
Moraes destacou não é o momento de se analisar a legalidade dos meios de prova. Segundo ele, a denúncia se trata de uma questão de ordem inédita, por conta grande repercussão e de acontecimentos paralalelos: a abertura da investigação de crimes ocorridos durante o acordo de delação da J e o pedido de rescisão total do acordo.
Ministros criticam o Ministério Público
Os ministros Gilmar Mendes e Ricardo Lewandowski fizeram duras críticas à forma de atuação do Ministério Público. De acordo com Lewandowski, o MP está realizando investigações "à margem de qualquer controle constitucional".
Já Mendes criticou o fato de o principal órgão de investigação do país estar envolvido em esquemas. "Tivemos o primeiro caso histórico grave de dois procuradores (Angêlo Goulart e Marcelo Miller) sob suspeita. Talvez tenhamos que revisitar o tema da investigação do MP ou que essa parceria seja melhor definida", citou.
"Denúncia peculiar"
O ministro Gilmar Mendes tomou a palavra na sequência da manifestação de Fachin. Para ele, a denúncia atual é ;peculiar;, pois só diz respeito ;a terceiros;, por ser um acordo do MPF com delatores.
O ministro José Antonio Dias Toffoli acrescentou que o Estado não tem o direito de tirar informações que lhe interessa da colaboração e depois revogar o que foi prometido a ele. "Esse debate só aconteceu por causa dos vazamentos. Vivemos outro período de vazamentos que envolvem pessoas desonestas e outras provas", afirmou.
Toffoli confidenciou durante a sessão que ouviu de Teori Zavascki, morto em acidente aéreo em janeiro, que ele estaria "cansado" de as demandas serem expostas na mídia antes de chegarem ao Supremo.
O relator Edson Fachin foi o primeiro a encaminhar o voto na sessão. Ele questionou se o STF poderia se antecipar à Câmara dos Deputados no julgamento de Temer. O ministro defendeu que o Tribunal só poderia se manifestar sobre a denúcia contra o presidente após a Câmara dar o aval para a Corte analisar o caso. Ele disse o mesmo sobre o debate a respeito da validade das provas da delação da J.
Fachin encerrou afirmando que, mesmo que o acordo de delação seja rescindido, os efeitos continuariam valendo para as partes, e não para terceiros. Com isso, provas decorrentes do inquérito que possam incriminar o presidente e outros denunciados por organização criminosa e obstrução de justiça deveriam seguir válidas.
A presidente Cármen Lúcia ressaltou que o voto de Fachin é sobre o processo contra Michel Temer e que as discussões travadas até o momento não estão sob análise. "Teremos um encontro marcado com isso", frisou.
*Estagiário sob supervisão de Humberto Rezende