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Inspeção recomendava mudança na gestão de presídio em Manaus há cinco meses

Inspeção feita no complexo penitenciário de Manaus apontou problemas de gestão, mas nada foi feito para impedir o massacre de 56 presos no primeiro dia do ano. Diretor do presídio é afastado por suspeita de receber propina

Relatório de inspeção do Ministério da Justiça no Complexo Penitenciário Anísio Jobim (Compaj), baseado em visitas ao local em agosto do ano passado, recomenda ao governo do Amazonas a revisão do modelo de ;gestão prisional; que não coloque a secretaria refém de serviços ;privatizados;. O documento, produzido pelo Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária, que integra o MJ, aponta falhas na gestão da empresa terceirizada Umanizzare. Relata ainda informações do governo de que, na mesma data, foi encontrado o sexto túnel do ano no Complexo Penitenciário Anísio Jobim (Compaj), palco da tragédia em que 56 presos acabaram assassinados no dia 1;. Ontem, o diretor interino da penitenciária, José Carvalho da Silva, foi afastado do cargo, alvo de denúncias de corrupção ligada à facção Família do Norte (FDN), responsabilizada pelas mortes de integrantes do Primeiro Comando da Capital (PCC).

[SAIBAMAIS]Em dezembro, Silva foi alvo de denúncias de dois detentos que acabaram mortos no massacre. Em uma carta, a dupla acusou Carvalho de receber propina para liberar a entrada de drogas, armas e celulares de integrantes da FDN. Eles relataram ainda ameaças de morte. Os problemas na gestão do presídio já eram conhecidos pelo governo e foram reforçados no relatório de inspeção, disponibilizado pelo Ministério da Justiça nesta terça, após serem votados na semana passada. O documento aponta falhas graves de gestão e serviços precários por parte da empresa terceirizada. E recomenda ao governo a ;adoção de outro modelo de gestão prisional; que não coloque a secretaria refém de serviços ;privatizados;. ;Chama a atenção o fato de o contrato não prever a taxa de encarceramento e o alto custo mensal estimado, apesar de termos constatados in loco a precariedade, em todos os sentidos, do serviço executado;, diz o relatório.

O relatório aponta que foi constatada a precariedade ou ausência de ;oportunidades para estudo e trabalho intramuros; e que os serviços básicos não estavam sendo prestados ;a contento;. Destaca ainda que o contrato da Umanizzare informa a preparação de serviços a 1.072 internos, sendo que a secretaria informou 1.245 homens em fevereiro do ano passado. A meta inicial era o dobro da capacidade: 454 presos. O documento faz uma série de recomendações a diversos órgãos do estado, inclusive ao Tribunal de Contas para avaliar o contrato com a Umanizzare. A informação da presença das facções já era sabida e foi relatada no mesmo relatório do MJ, mas datado de 2015.

Na ata da reunião do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária, em 25 de outubro do ano passado, consta que o secretário de Administração Penitenciária (Seap), Pedro Florencio, admitiu que os contratos ;eram absolutamente lesivos ao estado;, mas ponderou que havia um problema ;político;, visto que a empresa foi contratada pelo governo anterior, sendo que o atual governador era vice na época. O modelo de cogestão vigora desde 2013 e o contrato com a Compaj foi assinado em 2014, em valores milionários. Florêncio assumiu a gestão em outubro de 2015.

O próprio secretário afirma que os valores do contrato são os mais caros das ;cogestões; do Brasil e diz que a secretaria entendia que deveria ser cancelado, mas ;seria necessário ter o aval da Procuradoria-Geral e da CGL (Comissão Geral de Licitação);. O custo do preso de R$ 4,5 mil ; chegando a R$ 4,7 mil em algumas unidades ;que sequer têm advogado no contrato; ; superam a média de investimento nos presídios estaduais. Segundo a ata, o secretário disse que chegou a conversar com o governador José Melo (Pros) para aventar o cancelamento do contrato, mas decidiu-se esperar o fim de 4 dos 7 contratos vigentes.

Em nota, a Umanizzare disse que o documento ;não reflete a realidade dos serviços prestados pela Umanizzare, assim como os resultados positivos reconhecidos pelo próprio governo do Amazonas;. Afirmou que, além de cumprir o previsto em lei, disponibiliza uma série de projetos que visam ressocializar os internos. E informa que, no Amazonas, os reeducandos receberam ;mais de 228 mil atendimentos técnicos pelas equipes da empresa;, mas não cita nomes de projetos. Diz ainda que comparações só podem ser feitas ;conhecendo por dentro a realidade de cada estabelecimento penal;. A Seap não respondeu ao Correio.

Ex-secretário de Segurança de São Paulo e consultor da área, o coronel José Vicente defende que o governo federal invista em políticas de penas alternativas e em programas de parceria público-privadas (PPPs). ;No Amazonas já começou errado porque o contrato previa o dobro de presos acima do número de vagas do estado. Além do que o pessoal que vai trabalhar não é treinado como agente penitenciário;, disse. Segundo ele, a empresa pediu um valor alto e o governo decidiu pagar mesmo sabendo que não seria possível garantir a segurança. Mas Vicente pondera que os contratos de PPPs podem ser benéficos e cita o caso do presídio Ribeirão das Neves, em Minas Gerais, que segundo ele é um ;exemplo muito bem-sucedido;.

Embate político

O senador Eduardo Braga (PMDB-AM) acusou o governador do Amazonas, José Melo (Pros), de ter feito um acordo com a facção Família do Norte (FDN) para garantir sua eleição. Segundo ele, o grupo teria prometido dar 100 mil votos para Melo em troca de uma espécie de ;liberdade condicionada;, nas palavras dele, nos presídios em Amazonas. Melo rebateu as acusações. ;As acusações são mentirosas e as ilações feitas pelo senador são irresponsáveis e também criminosas. Refletem a postura política de quem aposta na adoção em uma linha de oposição desqualificada contra o governo, baseada na proliferação de boato; afirmou, em nota oficial.