O ex-presidente da Eletronuclear, Othon Luiz Pinheiro da Silva, investigado por suposto recebimento de propina no âmbito das obras da usina nuclear de Angra 3, solicitou à Andrade Gutierrez que a empreiteira fizesse "contribuições políticas" ao PT e ao PMDB a partir da assinatura do contrato de retomada da obra, em 2008. A revelação foi feita nesta segunda-feira, 25, por Rogério Nora de Sá, presidente da construtora Andrade Gutierrez até setembro de 2011. A empresa é responsável pelas obras de construção civil da usina, hoje suspensas e sob investigação na Operação Lava Jato.
"Pelo que eu entendi, o apoio político para que Othon assumisse (a presidência) veio dos dois partidos, e em troca ele viabilizaria o aporte financeiro para esses partidos", disse Sá, em audiência aberta na 7; Vara Federal Criminal do Rio de Janeiro, que investiga o caso. Othon assumiu a presidência da Eletronuclear em 2005, cerca de três anos antes de o contrato da obra de Angra 3, suspenso desde a década de 80, ser reativado.
Segundo o ex-executivo da Andrade, houve uma reunião, ainda em 2008, para acertar detalhes sobre a assinatura do contrato da obra de Angra 3. Na ocasião, Othon defendeu que houvesse um acordo para contribuições ao PT e ao PMDB, uma vez que "havia compromissos políticos". Os pagamentos seriam de 1% do contrato para cada partido.
"Outro 1% deveria ser para ele (Othon), para que pudesse antever seus projetos. Eu concordei com essa tese, e assim ficou definido. Quando o contrato ficasse pronto, nós contribuiríamos politicamente com PT e PMDB", afirmou Sá.
Os contatos da Andrade Gutierrez no PMDB, segundo o depoimento, eram os senadores Romero Jucá (RR) e Edison Lobão (MA). No PT, o interlocutor era o ex-tesoureiro do partido João Vaccari Neto. A empresa ainda distribuiu pagamentos a outros integrantes da diretoria da Eletronuclear.
Othon chegou a pedir que a própria Andrade Gutierrez o apoiasse na corrida pela presidência da estatal. "Mas não tínhamos relações políticas para ajudá-lo", disse Sá.
A relação do almirante com a construtora já vinha de antes da repactuação do contrato de Angra 3. Antes de 2008, segundo o ex-executivo, a Andrade efetuou pagamentos esporádicos e em espécie, com valores entre R$ 20 mil e R$ 30 mil, como "colaboração" a Othon para fazer pesquisas e desenvolvimento de projetos pessoais.
Esses repasses foram confirmados por Clóvis Peixoto Primo, que foi diretor-geral da Andrade Gutierrez entre 2008 e 2013 e também presta depoimento na tarde de hoje. Primo passou a ser o interlocutor de Othon na AG após substituir Marcos Teixeira no posto.
"Essa troca levou Othon a me procurar. Ele perguntou se, com essa mudança, tudo que havia sido combinado estava mantido. Por coincidência, Clóvis estava em São Paulo (local da reunião) e nós reafirmamos que tudo que havia sido combinado estava mantido", contou Sá.
Os dois ex-executivos da Andrade Gutierrez afirmaram que os pagamentos não visavam à obtenção de benefícios no âmbito das obras de Angra 3 (que era deficitária, segundo eles), mas sim à celeridade dos trâmites necessários para a realização da obra.
"Era uma obra muito complexa, se não houvesse esforço do cliente, liberação ambiental... isso era fator de risco grande, que aumentaria prejuízo de forma substancial. Na verdade, o objetivo era que não nos prejudicasse em termos de andamento, que não sofresse malefício ou atrasos", afirmou o ex-presidente da construtora. "A gente pagava para poder garantir os recebimentos de contrato. Não tinha vantagem nenhuma, não, era para não ser prejudicada, para garantir os recebimentos do mês", disse Clovis Primo, negando superfaturamento no contrato.
Ao todo, Primo calcula que a Andrade Gutierrez tenha pago entre R$ 3 milhões e R$ 4 milhões para Othon, e montante semelhante dividido entre diretores da Eletronuclear. Nenhum dos executivos estimou o valor repassado a partidos.