A Câmara dos Deputados enviou recurso ao Supremo Tribunal Federal (STF) questionando a decisão do ministro Marco Aurélio Mello que determinou que o presidente da Casa, deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), desarquive e dê prosseguimento a um pedido de impeachment contra o vice-presidente da República, Michel Temer, com a formação de uma comissão especial para analisar o caso.
Na peça, advogado da Câmara argumenta que não havia "razão jurídica" para que Marco Aurélio analisasse a questão de forma "unipessoal", o que classifica como uma "concentração de poder". A decisão do ministro do STF é classificada pelo advogado como "inusitada, inovadora e absolutamente incongruente".
Marco Aurélio já se comprometeu, em pronunciamentos nesta semana, a dar celeridade ao caso, que deve ser debatido pelo plenário do Supremo. Ainda não há previsão de data para o julgamento.
"Algum argumento político pode justificar esse comando judicial, mas jurídico não há nenhum. Para o bem da República, e para preservar as instituições e a independência dos Poderes, o Poder Judiciário deve se ater principalmente a aspectos jurídicos, como se o processo não tivesse capa nem nome, e não sob a ótica política. Não é nada saudável esse tipo de intervenção", escreve o advogado da Câmara, Renato Oliveira Ramos.
Em seu despacho, Marco Aurélio entendeu que Cunha extrapolou suas atribuições ao arquivar a denúncia contra Temer, por entrar no mérito do pedido. O caso chegou ao gabinete do ministro por questionamento do advogado Mariel Márley Marra, que pedia o prosseguimento da denúncia apresentada por ele contra o peemedebista.
O advogado da Câmara argumenta que a decisão de Marco Aurélio desrespeita orientação da Corte sobre a competência do presidente da Casa e a impossibilidade de revisão judicial de matérias internas do Legislativo. Para a Câmara, a análise do presidente não fica restrita apenas às formalidades do pedido de impeachment, cabendo rejeição da denúncia quando for "despida de justa causa ou insubsistente".
A denúncia contra Temer protocolada na Câmara tem como base a assinatura pelo peemedebista, como interino da presidente Dilma, de quatro decretos que autorizavam a abertura de crédito suplementar sem autorização do Congresso Nacional e em desacordo com a meta fiscal vigente. O caso foi revelado pelo jornal O Estado de S. Paulo.
No recurso, o advogado que representa o presidente da Câmara alega que o pedido de impeachment não traz descrição adequada da conduta supostamente irregular do vice-presidente da República capaz de gerar a aceitação da denúncia. Ainda segundo a defesa, também não foram especificados os decretos que foram assinados por Temer. "Sendo certo afirmar que tais decretos foram assinados pelo vice-presidente da República antes de 22/07/2015, quando ainda não havia o conhecimento inequívoco de que a meta fiscal não seria atingida - circunstância fundamental para o afastamento da acusação e distingui-la da denúncia recebida contra a Presidente da República", diz a peça.
O advogado da Câmara cita ainda a decisão do ministro Celso de Mello que, um dia após o despacho de Marco Aurélio, negou um novo pedido para desarquivar uma denúncia contra Temer na Câmara, em defesa do princípio da separação dos poderes. Mais cedo, ao chegar para sessão no STF, considerou "normal no âmbito do Poder Judiciário" a divergência com o ministro Marco Aurélio Mello. "É preciso saber quais são os fundamentos da decisão, às vezes há aparentemente uma contradição, um conflito interpretativo que é normal no âmbito do poder judiciário. As normas jurídicas nada mais são do que sua própria interpretação. Não temos uma situação que possa ser considerada atípica", afirmou o decano.