A Procuradoria da República no Distrito Federal afirmou à 10; Vara Federal de Brasília que o lobista Mauro Marcondes, preso na Operação Zelotes, tinha "acesso facilitado" ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva quando se negociava a aprovação de Medida Provisórias que beneficiavam o setor automobilístico. O petista não é réu no caso, mas, as alegações finais em que o Ministério Público Federal reforça que uma organização criminosa pagava propinas e lavava dinheiro para beneficiar montadoras, os procuradores dizem que Marcondes tinha "livre trânsito" com Lula ; que é chamado de "amigo" do lobista ; e com o seu chefe de gabinete à época, Gilberto Carvalho, que também não é alvo da ação criminal.
No documento, entregue na segunda-feira (28/3) ao juiz Vallisney Oliveira, o MPF pede que sejam condenados ex-dirigentes da montadora Mitsubishi, os lobistas e ex-servidores do Senado e da Casa Civil da Presidência da República. Todos negam as acusações.
A Procuradoria destaca mensagem de correio eletrônico em que Marcondes pede a Carvalho uma audiência com Lula, ;recorrendo mais uma vez ao amigo, para cumprir esta incumbência daquela forma informal e low profile que só você consegue fazer sem as formalidades e no momento oportuno;."Conforme se vê acima, fica claro a informalidade e o acesso fácil a Lula", dizem os procuradores no documento.
Segundo os procuradores, ao contrário de simples lobby em favor de interesses privados, o grupo ; liderado por Marcondes, Alexandre Paes Santos, o APS, e José Ricardo Silva ; na verdade pagava subornos para obter o andamento e a aprovação da Medida Provisória. O custo dos serviços, dizem, era mais elevado do que o de outras consultorias renomadas, porque envolveria ilegalidade.
Um dos exemplos disso seria o acesso a Lula. Em dezembro de 2009, um ofício da empresa de José Ricardo, a SGR, para a montadora Caoa menciona a produção de relatórios sobre o caso a órgãos públicos, mas esses relatos não foram entregues. Para o MPF, nenhum serviço foi prestado. "O preço pago pelos ;serviços; somente se justificava diante do acesso
privilegiado acesso de Mauro Marcondes à Presidência da República." Marcondes enviara carta a Lula, por meio de Carvalho em julho de 2009.
Documento apreendido na casa de APS mostra as anotações, uma ao lado da outra, ;kit do material que foi enviado ao Gilberto Carvalho; e ;o trabalho a ser desenvolvido na modalidade prestação de serviços ; os ;valor terão; tratamento diferenciado;. Para o MPF, o tipo de tratamento referido nos papéis está ligado a Lula.
"É coerente afirmar que o acesso direto ao então presidente da República possui um preço ;diferenciado;, ou seja, mais elevado, o que seria possível em razão da relação de amizade que existia entre Luís Inácio Lula da Silva e Mauro Marcondes", explica a Procuradoria.
Os procuradores narram a ligação de amizade entre os dois conforme relato do senador Delcídio Amaral (ex-PT-MS) em sua delação premiada na Operação Lava-Jato. O parlamentar acrescentou que Lula pediu a ele que impedisse o Marcondes e seu filho, o empresário Luís Cláudio Lula da Silva, de serem convocados na CPI do Carf, que faz apurações paralelas à Operação Zelotes.
O MPF conclui que "as anotações, assim como o livre trânsito que Mauro Marcondes possuía junto a Gilberto Carvalho e o ex-presidente da República Lula, apresentam harmonia com o restante conjunto probatório, e demonstram o vínculo existente entre os envolvidos, bastando para isso que se faça uma leitura sistemática das provas carreadas aos autos".
Sem provas
Ainda assim, a Procuradoria destaca que não há provas, no momento, de que Lula, Carvalho e outros agentes públicos cometeram crimes "em favor da organização criminosa" na MP 471. Isso porque a eventual participação do ex-presidente no caso é apurada em um inquérito à parte, que apura a "compra" de outras medidas provisórias, a MP 512 e a MP 613.
O ex-presidente Lula tem negado qualquer participação nos crimes investigados pela Polícia Federal e pelo Ministério Público na Zelotes. Ele disse à PF em 6 de janeiro de 2016 que as MPs 471 e 512 foram benéficas para o país e negou a relação dela com a atuação de lobistas e corruptores. Lula disse que teve contato com Marcondes, então representante da associação das montadoras (Anfavea), mas "não atendeu a nenhum pedido formulado" por ele enquanto foi presidente da República.
Lula afirmou que o lobista nunca lhe pediu ajuda no governo quando deixou o Palácio do Planalto, "tampouco não houve qualquer oferta de valores". O ex-presidente disse que, ao que sabe, a relação entre Gilberto Carvalho e Marcondes e sua esposa, Cristina Mautoni, "era estritamente institucional". Ele disse que, certa vez, o então chefe de gabinete lhe repassou carta do lobista para marcar reunião sobre investimentos de empresas suecas no Brasil.
O ex-presidente disse que "nunca foi procurado por lobistas" da SGR, de José Ricardo, da empresa de Marcondes, a M Diplomacia Corporativa, para tratar de interesses da Mitsubishi e da Caoa Hyundai ou de prorrogação de benefícios fiscais e Medidas Provisórias.
Em nota, o Instituto Lula já afirmou que as MPs 471 e 512 "geraram dezenas de milhares de empregos de qualidade em sete parques industriais na Bahia, Pernambuco, Ceará, Amazonas e Goiás". "Ambas resultaram de reivindicações e diálogo com lideranças políticas, governadores, sindicalistas e empresários, amparadas em exposições de motivos ministeriais que levaram em conta a geração de empregos, renda, incorporação de tecnologia e arrecadação para os Estados em decorrência dos incentivos federais."