O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, rebateu argumentos levantados pela defesa do presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ) e reiterou a denúncia feita ao Supremo Tribunal Federal (STF) contra o parlamentar. No documento, cujo sigilo foi levantado na segunda-feira (15/2) pelo ministro Teori Zavascki, o procurador afirma que Cunha "sempre se mostrou extremamente agressivo e dado a retaliações".
A avaliação sobre a postura de Cunha é feita por Janot ao analisar pedido da defesa do peemedebista para anular depoimentos do lobista Júlio Camargo. A delação de Camargo foi homologada, inicialmente, em outubro de 2014, pelo juiz Sérgio Moro, da 13; Vara Federal de Curitiba, responsável pela condução dos processos da Lava-Jato na primeira instância. Posteriormente, em julho de 2015, o delator prestou depoimento no qual citou Cunha. Só após a menção ao parlamentar o caso foi remetido ao STF.
"Realmente, embora censurável de um lado e passível de sanções, a colaboração de Júlio Camargo foi e está sendo efetiva, não justificando sua rescisão. A omissão do nome de Eduardo Cunha também foi justificável, à luz das circunstâncias concretas e, ainda, da especial circunstância de que Eduardo Cunha sempre se mostrou - não apenas enquanto na Presidência da Câmara - extremamente agressivo e dado a retaliações a todos aqueles que se colocam em seu caminho a contrariar seus interesses", escreveu Janot, ao argumentar que "não houve qualquer ilegalidade" na homologação feita em primeira instância.
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O lobista Julio Camargo afirmou em depoimento que o suposto operador do PMDB no esquema de corrupção na Petrobras, Fernando Soares, conhecido como Fernando Baiano, disse estar sendo pressionado por Cunha para pagamento de propina. Segundo Camargo, o peemedebista exigia US$ 5 milhões.
Na defesa ao Supremo, Cunha pediu a paralisação do processo até sua saída da presidência da Câmara. O argumento usado pelo parlamentar é de que, à frente da Câmara dos Deputados, está na linha sucessória presidencial e, pela Constituição, presidente da República não é responsabilizado durante o mandato por atos estranhos às suas funções.
Criatividade
Na manifestação ao Supremo, Janot diz que o argumento sobre a linha sucessória "alça patamares realmente criativos" e fora de "lógica". No parecer, Janot chama ainda de "confusões teóricas e sistêmicas" argumentos da defesa de Cunha e de "pueril" uma das hipóteses apontadas pelos advogados do peemedebista.
De acordo com o procurador-geral da República, o estabelecido pela Constituição é restrito à presidente da República e não cabe uso de analogia. "De início, verifica-se que o dispositivo é bastante claro a estabelecer uma restrição vocacionada apenas e tão somente para o Presidente da República - e não para aqueles que potencialmente possam sucedê-lo. Nesse ponto, a tese proposta pela douta defesa alça patamares realmente criativos e fora de qualquer parâmetro jurídico ou de lógica admissíveis no ordenamento brasileiro", escreveu o procurador-geral da República.
Janot escreve ainda na peça que Cunha busca "postergar" a análise do recebimento da denúncia no Supremo: "O denunciado Eduardo Cunha busca, em verdade, por vias transversas e sempre com o intuito de postergar e protelar a análise do recebimento da denúncia, conferir efeito suspensivo ao recurso, em flagrante burla a disciplina regimental."
A Procuradoria-Geral da República rebate os pontos levantados por Cunha em defesa e também pela ex-deputada Solange Almeida (PMDB-RJ), denunciada junto ao parlamentar. Cunha é acusado de praticar os crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro.
Janot aponta ainda na peça que a denúncia contra Cunha está baseada em "inúmeros e robustos elementos que apontam, de maneira uniforme, para o recebimento de valores por parte de Eduardo Cunha". Além de depoimentos de três delatores - Alberto Youssef, Julio Camargo e Fernando Soares, conhecido como Fernando Baiano -, a PGR sustenta que juntou documentos, provas e informações de metadados da Câmara dos Deputados que sustentam a acusação.
O ministro Teori Zavascki, relator da Lava-Jato no Supremo Tribunal Federal, estima que até o final de fevereiro libere o caso para julgamento pelo plenário. Na ocasião, os 11 ministros do STF terão de decidir se aceitam a denúncia e, por consequência, tornam Cunha réu perante o Tribunal. Só após o julgamento sobre o recebimento da denúncia, os ministros devem discutir o pedido de afastamento de Cunha da presidência da Câmara feito por Janot em dezembro.