O lobista Julio Camargo, representante dos japoneses do Grupo Mitsui e da Camargo Corrêa no esquema de cartel e corrupção na Petrobras, detalhou em depoimento à Justiça Federal os pagamentos que efetivou a partir da pressão exercida pelo presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), para que fosse repassado o restante dos US$ 10 milhões em propina referentes a dois contratos na Diretoria de Internacional, que ele intermediou.
"Eu paguei em depósitos ao Alberto (Youssef) no exterior, paguei através de operações com a GFD (empresa de fachada do doleiro) e fiz pagamentos diretos às empresa do senhor Fernando Soares", afirmou Julio Camargo, em depoimento na manhã desta quinta-feira 16, ao juiz federal Sérgio Moro, que conduz as ações da Lava-Jato.
Camargo afirmou que o deputado tinha US$ 5 milhões a receber de um total de US$ 10 milhões restantes da propina a serem pagas por dois contratos de navios-sondas, para exploração de petróleo em águas profundas, assinados em 2006 e 2007 pela coreana Samsung em parceria com a japonesa Mitsui. Os contratos eram da Diretoria de Internacional, área comandada pelo PMDB, e envolveram ao todo US$ 30 milhões de propina, segundo o processo em que Julio Camargo e Fernando Baiano são réus ao lado do ex-diretor da área Nestor Cerveró.
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"Eu chamei o Alberto, com quem eu tinha relacionamento de confiança, e, se não me engano, até pedi se ele conhecia o deputado Eduardo Cunha porque eu estava com problema com o deputado", afirmou Julio Camargo, que disse que teve de se organizar para efetivar os pagamentos.
"O deputado Eduardo Cunha não aceitou que eu pagasse somente a parte dele. Ele disse: ;olha Julio, eu não aceito também que você faça uma negociação para pagar só a minha parte. Você pode até pagar o Fernando mais dilatado. O meu eu preciso rapidamente mas eu faço questão de você incluir no acordo aquilo que você ainda falta pagar o Fernando", detalhou o delator.
"Aí chegou entre 8 e 10 milhões de dólares", confessou Julio Camargo ao juiz Sérgio Moro.
Caminho do dinheiro
Julio Camargo foi questionado pelo juiz da Lava-Jato se ele poderia identificar os pagamentos de propina feitos após a pressão exercida pelo presidente da Câmara. Todos os dados foram apresentados à Procuradoria Geral da República, em forma de planilha, onde corre inquérito em que Cunha é investigado.
"Fiz três depósitos indicados pelo senhor Alberto Youssef, 20 de outubro de 2011, através da minha empresa Vigela para uma empresa indicada por ele que chama RFY e outra de nome DGX. São dois pagamentos de US$ 2,3 milhões e outra de US$ 400 mil."
"Depois pagamentos efetuados à empresa do Fernando, uma de nome Technis no valor de US$ 700 mil, e outra, vários pagamentos, nove pagamentos, para empresa dele de nome Hawk Eyes, no valor total de US$ 3,2 milhões", informou.
O lobista disse que o restante foi pago em reais no Brasil via investimentos em empresas do doleiro Alberto Youssef. "Pagamentos que eu fiz ao senhor Alberto e ele pagou Fernando Soares."
Perguntado se efetivamente foi beneficiário do esquema, Julio citou Fernando Baiano, o presidente da Câmara e ele próprio. "Acho que o Fernando foi o beneficiário, como meu parceiro, da mesma maneira que eu ganhei ele ganhou também. Eu não sabia que ele tinha um sócio oculto, que era o deputado Eduardo Cunha, que também ganhou."
Processo
Julio Camargo foi ouvido como réu no processo em que o ex-diretor de Internacional Nestor Cerveró e Fernando Baiano - braços do PMDB no esquema de desvios na Petrobras - são acusados pelo recebimento de US$ 30 milhões na contratação de dois navios-sonda, firmados em 2006 e 2007.
O doleiro Alberto Youssef, peça central da Lava-Jato, já havia afirmado à Justiça Federal que o presidente da Câmara era um dos "destinatários finais" da propina de cerca de R$ 4 milhões operacionalizados por ele nesses contratos feitos pelo grupo Samsung em parceria com a Mitsui.
"Quando o senhor conversou com Julio Camargo ele falou quem eram os beneficiários das operações? Ou ele só falou no Fernando Soares?", perguntou o magistrado. O doleiro respondeu: "Falou no Fernando Soares e contou a história da pressão que o Eduardo Cunha estava fazendo para que ele pudesse pagar o Fernando Soares, dando entendimento que esse valor fosse também na época para o deputado."
Mais tarde, questionado pelo seu advogado sobre quem seriam os "destinatários finais" desta propina, Youssef reiterou ter ouvido de Camargo que eram "Fernando Soares e Eduardo Cunha".
O presidente da Câmara vem negando com veemência o envolvimento no esquema de desvios na Petrobras.
A Mitsui & Co. afirmou que o sr. Júlio Camargo "nunca foi representante ou consultor em nenhum dos projetos da empresa."