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Prisão fecha ciclo de 'falcatruas' em diretorias da Petrobras, diz MPF

Procurador lembra que ainda falta a Lava-Jato investigar outros setores da estatal e crimes relacionados a outras obras

Com a prisão do ex-diretor de Internacional da Petrobras Jorge Zelada, o Ministério Público Federal entende que fechou a investigação sobre o ;núcleo principal das falcatruas; na petroleira. Segundo o procurador regional da República Carlos Fernando dos Santos Lima, a Lava-Jato praticamente ;exauriu; a investigação sobre as diretorias da Petrobras. ;Paulo Roberto Costa (ex-diretor de Abastecimento), Renato Duque (ex-diretor de Engenharia), Nestor Cerveró (que diretor de Internacional até 2008) e Jorge Zelada (que sucedeu Cerveró, entre 2008 e 2012) constituem o núcleo principal das falcatruas na Petrobras;, afirmou ele em entrevista coletiva nesta quinta-feira (2/7).

Porém, ele destacou que a Lava-Jato ainda precisa investigar outros setores da Petrobras e mesmo outras obras irregulares, identificadas para além da estatal.
;Depois de um ano, creio que não temos indicativos de maiores desvios em outras diretorias e outros diretores;, disse Carlos Fernando. ;Eventualmente, não vou dizer que não vá surgir porque eu me surpreendo a cada dia com o número de provas que vem surgindo. Temos ;n; outros crimes acontecendo que não foram identificados que não estão no nível de diretorias. Não está esgotada a investigação. No núcleo de diretores da Petrobras, creio que esta bem definida.;

O procurador disse que a Lava-Jato ainda supreende. ;Dia a dia estamos recebendo novos indicativos de crimes dentro da Petrobras e outros órgãos públicos;, contou Carlos Fernando.



China
Jorge Zelada, ligado ao PMDB e preso hoje pela Polícia Federal, transferiu US$ 1 milhão para a China, segundo avaliações preliminares dos delegados e procuradores da Operação Lava-Jato. Ele ainda retirou outros 7 milhões de euros da Suíça para Mônaco, onde ele teve 11 milhões de euros confiscados.

As transferências de valores aconteceram em julho e agosto de 2014, quatro meses após o estouro da Lava-Jato. ;Esse é o motivo da prisão, a tentativa de proteção desses valores para impedir que a justiça não o alcance;, afirmou Carlos Fernando dos Santos Lima.

A 15; fase da Lava-Jato foi apelidada de ;Conexão Mônaco;. Zelada, que esteve no cargo entre 2008 e 2012, será transferido hoje do Rio para a carceragem da Polícia Federal em Curitiba. Segundo o delegado regional de Combate ao Crime Organizado na PF no Paraná, Igor Romário de Paula, balanço preliminar mostra que foram apreendidos entre R$ 200 mil e R$ 250 mil na 15; fase da Lava-Jato, apelidada de ;Conexão Mônaco;. Ele disse na entrevista que Zelada deve chegar ainda hoje a Curitiba em um voo de carreira.

O ex-diretor recebia um salário de aproximadamente R$ 100 mil, segundo Carlos Fernando, mas não teria recursos para possuir tanto dinheiro no exterior. Na visão do MPF, tudo era propina pela celebração de contratos de navios-sondas. ;Quanto a esses valores não temos dúvida de que são originários de corrupção;, diz Carlos Fernando.
As transferências de dinheiro em 2014, após a Lava-Jato, mostram movimentação para atrapalhar a investigação. ;Isso demonstraria inequívoco propósito atual do investigado de continuar a ocultar o produto de seus crimes e dificultar a investigação;, afirmou a Procuradoria da República no Paraná, em comunicado à imprensa.

Navios
Segundo Carlos Fernando, houve irregularidades na contratação dos navios-sonda Pride-Ensco DS-5, fabricado pela Pride, em janeiro de 2008, e Titanium Explorer, fabricado pela Vantage Drilling, em janeiro de 2009. ;A própria Petrobras já indicou uma série de irregularidades e singularidades que favoreciam a parte que estavam contratando;, disse o procurador. ;Temos fortes indicativos que ele recebeu valores pela celebração contratos de aluguel de sondas.;

As auditorias se somaram à informação do dinheiro no exterior, obtida pelo Ministério Público em março. ;Uma série de fatos que não se coadunam com as normas e costume da Petrobras que favoreciam a outra parte e que tem a correspondência com os pagamentos no exterior;, relacionou Carlos Fernando.

Como antecipou o Correio em janeiro, os investigadores voltam suas atenções para o mercado de navios, que envolve valores de até US$ 500 mil dólares por dia em locação de embarcações para o pré-sal. ;Já tínhamos há muito tempo indicativo que essa área de aluguel de sondas era muito importante para a investigação, contratos de 500 mil dólares por dia. Significa muito dinheiro.;

20% da propina
Segundo Carlos Fernando, as prisões se baseiam também em delações premiadas, como a do o ex-gerente de Serviços e Engenharia Pedro Barusco. ;Barusco já relatou uma parte para ele, uma parte para o Duque e eventualmente para o próprio Zelada.; Em depoimento à Polícia Federal, o delator disse que Zelada participava da divisão de propinas vindas da contratação de fornecedores da Petrobras. Barusco afirmou que uma parte dos pagamentos eram destinadas ao PT e outra, aos funcionários, a chamada ;Casa;. Da parte da ;Casa;, 50% ficava com o então diretor de Engenharia e Serviços Renato Duque, 30% com o próprio Barusco e 20% com Zelada.

Segundo delator, Zelada recebeu propinas na construção de plataformas, como a P-51 e a P-52. Um desses pagamentos foi de R$ 120 mil, entregues em espécie na casa do ex-diretor de Internacional da Petrobras, de acordo com declarações de Barusco prestadas à PF em sua delação premiada, no dia 24 de novembro de 2014. O delator disse à polícia que ;acha; que Zelada recebia propina no exterior por ter conta no mesmo banco que Renato Duque.

TVP Solar
Hoje, Zelada foi preso preventivamente e a PF fez buscas em quatro endereços no estado do Rio de Janeiro: três na capital fluminense e um em Niterói (RJ). Um deles, foi na empresa TVP Solar do Brasil, que pertence ao ex-diretor de Internacional. Uma das buscas foi feita na casa da ex-mulher do ex-dirigente, e outros endereços também são ligados ao ex-funcionário. Segundo Igor Romário, ali ele guardava materiais

Carlos Fernando disse que as autoridades brasileiras ainda levantam os valores exatos escondidos na China, porque a cooperação jurídica com os asiáticos não é tão boa como com a Suíça e Mônaco.

[SAIBAMAIS]Ele voltou a criticar as empreiteiras acusadas de cartel, fraude em licitações da Petrobras e superfaturamento em contratos ganhos de maneira ilícita e dos quais era extraídas propinas para políticos e funcionários da estatal. Segundo Carlos Fernando, a petroleira colabora com as investigações e age ;de maneira moderna,ao contrário de muitas empresas, que preferem tapar o sol com a peneira fingindo que nada aconteceu;.

Para o procurador, o prejuízo da Petrobras é superior aos R$ 6,5 bilhões apurados pela estatal e pela subsidiária Transpetro. No entanto, seria difícil mensurá-lo totalmente.

Totalidade
A Procuradoria suspeita que a totalidade dos 11 milhões de euros depositados em Mônaco sejam fruto de subornos obtidos ;em razão do cargo exercido na Petrobras;. O valor foi confiscado em março, junto com outros 20,5 milhões de euros do ex-diretor de Engenharia da Petrobras Renato Duque, preso pela Lava-Jato em outra ocasião.

Segundo o Ministério Público, Zelada é suspeito de corrupção passiva e lavagem de dinheiro. A Polícia Federal afirma que os investigados da operação de hoje também responderão por desvio de verbas e fraude em licitações. A prisão de Zelada é preventiva, ou seja, não tem data para terminar e ficará a cargo do juiz da 13; Vara Federal de Curitiba, Sérgio Moro.

Odebrecht
Zelada também foi denunciado pelo Ministério Estadual Público do Rio de Janeiro em 2014 por favorecimento em licitações à Odebrecht. Em entrevista à revista Época, o lobista e ex-funcionário da Petrobras João Augusto Henriques disse que ;montou; um contrato de prestação de serviços na área de meio ambiente e segurança para ser vencido pela empreiteira.

O contrato foi fechado em US$ 825 milhões, mas depois foi revisto por uma auditoria interna na Petrobras. Desse valor, afirmou Henriques, US$ 8 milhões foram parar na campanha presidencial de Dilma Rousseff em 2010, nas mãos do então tesoureiro João Vaccari, hoje preso na Lava-Jato. O lobista afirma que Zelada também recebeu uma parte do dinheiro.

A Odebrecht e a Petrobras brigam na Justiça por causa da mudança no valor do contrato. A empreiteira e os demais acusados já negaram as acusações. Segundo Carlos Fernando, qualquer prova vinda de outros processos judiciais poderá vir a ajudar nas investigações da Lava-Jato e servir como elemento de convicção do Ministério Público e da Justiça.