Loteado por partidos da base do governo, o Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM) se transformou em um órgão que oferece tratamento diferenciado aos parlamentares em busca de licenças para pesquisar e explorar o subsolo brasileiro. Sem estrutura de deliberação colegiada, a direção do DNPM e suas superintendências decidem, sozinhos, quem ganhará o direito de uso sobre grande jazidas de minerais de alto interesse comercial. O atual quadro de diretores do departamento mostra que pelo menos nove das 25 superintendências estaduais são dirigidas por apadrinhados políticos do PMDB.
Apuração do Correio identificou 10 parlamentares da base governista que são donos de empresas de mineração ou parentes de primeiro grau de mineradores que têm autorizações e concessões ativas no DNPM para pesquisar e extrair ouro, diamante, prata, magnesita, quartzo, granito, argila, areia, cascalho e até mesmo água mineral. A ;bancada do minério; inclui o senador Lobão Filho (PMDB-MA). Ele é sócio da mineradora Vale do Sol, que tem licenças para extrair e pesquisar areia e cascalho nos municípios de Imperatriz, Pindaré Mirim e Ribamar Fiquene, todos no Maranhão. O senador é filho do ministro de Minas e Energia, Edison Lobão, pasta que abriga o DNPM. Dados do sistema do departamento registram que a empresa usou a outorga para explorar outros minerais, não inclusos no título concedido à firma, que se restringia a areia e cascalho. O Correio procurou a assessoria do parlamentar, mas não obteve resposta.
Grande empresário do ramo da mineração, o senador Acir Gurgacz (PDT-RO) explora jazidas de granito por meio de duas empresas, nos municípios de Machadinho d;Oeste, Rondolândia e Rio Crespo, em Rondônia. As concessões também dão direito à exploração de ouro. O senador afirma que as licenças foram dadas antes de ele ser eleito. Também em Rondônia, João Raupp, irmão do senador Valdir Raupp (PMDB-RO), ganhou o direito de pesquisar e extrair diamante de jazidas. O senador afirma que a concessão é antiga, que o irmão não chegou a extrair minerais e a família não atua no ramo. ;Ele (João Raupp) tem uma fazenda em Espigão d;Oeste e, como naquela região tem uma incidência forte de diamantes, requereu essa área lá, mas não a explora. Ele trabalha com a distribuição de baterias.; Na bancada mineradora do Senado, também está Blairo Maggi (PR-MT). A Maggi Energia tem processos no DNPM para extração de areia, argila e cascalho. A assessoria do parlamentar informa que ;o material é utilizado em obras da companhia, como pequenas centrais hidrelétricas;.
A seara do deputado Valdemar Costa Neto (PR-SP) na mineração é a extração de areia e de água mineral. De acordo com registros da Junta Comercial de São Paulo, o parlamentar mantém vínculos societários com duas empresas que ganharam licença do DNPM para pesquisar e extrair recursos do subsolo, a JCO Mineração e a Dona Emília Mineração.
Atividades encerradas
Já o vice-presidente da área de mineração da Frente Parlamentar de Infraestrutura, deputado Bernardo Santana de Vasconcellos (PR-MG), solicitou, por meio de uma empresa de agropecuária, a 2V, licença para pesquisar jazida de quartzo no DNPM de Minas Gerais. O parlamentar, no entanto, afirma que não encontrou o mineral e encerrou as atividades. ;A empresa pediu autorização de pesquisa em áreas que estão em região de fazenda e deu negativo. Não explorei.; Ainda em Minas, a família do deputado Antonio Andrade (PMDB) tem uma prestadora de serviços para mineradoras que exploram a região de Paracatu. O parlamentar não atendeu a reportagem.
Servidores exclusivos para os parlamentares
Para sanar as pressões dos parlamentares que reclamavam da demora na análise de seus processos, o Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM) destacou três funcionários para cuidar especificamente das demandas dos políticos. Apesar de trabalharem nas superintendências de Santa Catarina, Rio Grande do Sul e Pernambuco, os funcionários exercem a função de ;assessor; do diretor-geral Sérgio Dâmaso.
O deslocamento dos assessores das superintendências de origem para a sede em Brasília é custeado por diárias, que somam R$ 32 mil só esse ano. Um dos funcionários responsável por analisar processo dos parlamentares teve a lotação alterada para a sede do departamento em setembro e os outros dois continuam nas superintendências, mantendo o deslocamento para Brasília.
Em resposta ao Correio, a assessoria do departamento afirmou que ;observa; a data de entrada do processo para reduzir a fila de solicitações que existem no departamento. ;A sequência cronológica dos processos é o primeiro critério a ser observado. O interesse público e a política de governo complementam esse critério.;
Trâmites
Questionada sobre a influência política de deputados e senadores no trâmite dos processos de outorga e o número de empresas de políticos atendidas pelo órgão, a assessoria do departamento admite que os parlamentares também costumam fazer lobby até para firmas que não sejam de familiares.
;Podemos afirmar que suas solicitações (dos parlamentares) são de terceiros que recorrem a eles (deputados) devido ao grande contencioso de processos que recebemos de todo o Brasil diariamente. Também ressaltamos que a maioria das demandas é diretamente dos titulares, as quais chegam via e-mail, telefone, fax, protocolo e audiências;, disse o DNPM, em nota enviada ao Correio.
Ao justificar o elevado gasto com as diárias dos três servidores que atendem às demandas parlamentares, o departamento também explicou que os funcionários das superintendências destacados para esse serviço ;deslocam-se periodicamente a Brasília para prestar assessoria ao gabinete do diretor-geral;. (JJ)
Reservas subterrâneas
Veja algumas das questões debatidas hoje
no novo Marco Regulatório da Mineração
Problemas das regras atuais
; A outorga é o único instrumento de gestão
; O governo detém poucos instrumentos de intervenção
nas lavras de exploração
; Empresários utilizam artifícios jurídicos para manter licenças inoperantes, fazendo reservas do subsolo
Mudanças propostas
; Mecanismo para acabar com a especulação
; Criação de conselho que ligue o departamento de licenças à Presidência da República
; Criação da Agência Nacional de Mineração, órgão colegiado
; Substituição da concessão de lavra por contratos, dando ao
Estado mecanismo proporcional de participação nos lucros
; Limitação do tempo de outorga e prazo máximo para renovações
Domínio do PMDB nas regionais
Depois de emplacar o diretor-geral do DNPM, Sérgio Dâmaso, o PMDB também conseguiu o comando das superintendências de São Paulo, Bahia, Pará, Goiás, Maranhão, Minas Gerais, Rio de Janeiro, Rio Grande do Norte e Santa Catarina. Além do PMDB, PP e PR têm influência no departamento. O senador Gim Argello (PTB-DF) mantém aliados políticos lotados no órgão