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Politica

Dilma começa trocar pronunciamentos burocráticos por falas menos técnicas

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A presidente Dilma Rousseff ainda não tem um discurso tão marcante quanto o do antecessor, Luiz Inácio Lula da Silva. Bordões, como o ;nunca antes na história deste país; ; repetido exaustivamente pelo petista ao longo dos oito anos de mandato ; são inexistentes. A distância entre os dois estilos, porém, vem diminuindo. As falas burocráticas, cheias de dados das áreas de economia e de infraestrutura, têm sido, aos poucos, substituídas. Apesar de ser a responsável pelo formato final das declarações, Dilma, agora, mantém as sugestões de assessores que eram da equipe de Lula e conhecem bem o estilo do ex-presidente.

Para perceber a mudança gradual no tom, basta comparar os pronunciamentos de Dilma. No primeiro discurso após a contagem dos votos que a conduziram ao Palácio do Planalto, por exemplo, ainda no fim de outubro de 2010, a fala foi extremamente formal, sem espaços para o improviso: ;O Brasil é uma terra generosa e sempre devolverá em dobro cada semente que for plantada com mão amorosa e olhar para o futuro. Minha convicção de assumir a meta de erradicar a miséria vem, não de uma certeza teórica, mas da experiência viva do nosso governo, no qual uma imensa mobilidade social se realizou, tornando hoje possível um sonho que sempre pareceu impossível;.


Hoje, embora sem a mesma desenvoltura que Lula, Dilma começa a se soltar e a lançar mão do improviso, embora tropece de vez em quando. Um episódio curioso ocorreu há duas semanas, em plena crise que acabou por derrubar o então ministro da Agricultura, Wagner Rossi. A presidente empolgou-se na 4; Marcha das Margaridas ; evento realizado em Brasília por mulheres que vivem no campo ; e, ao cumprimentar o governador do Distrito Federal, Agnelo Queiroz (PT), que participava do encontro, chamou-o de ;Agnelo Rossi;. E, ao se referir a Alberto Broch, presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag), chamou-o de Alfredo, nome do ex-ministro dos Transportes Alfredo Nascimento. Apesar das gafes, Dilma conquistou a plateia. Usando chapéu de palha enfeitado com um laço colorido, fez promessas e exaltou as campesinas. Sem, entretanto, apelar para a informalidade.

Analogias
Nos últimos tempos, Dilma tem copiado Lula em um aspecto: as analogias. Em vez de recorrer a comparações futebolísticas, no entanto, como fazia o antecessor, ela usa referências históricas. Para acalmar a bancada do PMDB, insatisfeita com as demissões de correligionários de cargos do primeiro e do segundo escalão do Executivo, Dilma citou a Roma antiga, quando os inimigos eram jogados aos leões.

;Essa pauta (de demissões) jamais vou assumir. Não se demite nem se faz escala de demissão, nem sequer demissão todos os dias. Isso não é a Roma Antiga. Qualquer atividade inadequada, malfeita, que for constatada no governo, mantida a presunção de inocência, tomarei providências. A forma como colocam a política do meu governo contra malfeitos, chamando-a de faxina, eu não concordo, acho extremamente inadequada. Combate-se o malfeito, não se faz disso meta do governo. Faxina, no meu governo, é contra a pobreza;, ressaltou, durante evento de anúncio de expansão do programa de microcrédito para empreendedores individuais e autônomos, na quinta-feira.

Para a professora da Universidade de Brasília (UnB) Denize Elena Garcia da Silva, linguista e especialista em análise de discurso, não há uma tentativa de Dilma em copiar Lula e as semelhanças pontuais entre os dois discursos representam uma maneira de reverenciar o padrinho político. ;Ela tem aprimorado o discurso. A linguagem é um passaporte para o poder e ela sabe usar esse recurso, mas, claro, não tem a mesma desenvoltura que o Lula;, destaca. ;A face de Dilma tem se mostrado nos discursos. Enquanto as falas de Lula eram apelativas, as da presidente são disciplinadoras, reguladoras, no sentido de orientar, mostrar quais são as regras, com uma personalidade muito forte, que é uma característica marcante dela;, conclui.