Quase 15 horas de negociações e debates não se mostraram suficientes para garantir a aprovação do novo Código Florestal brasileiro. Apesar do acordo costurado para a votação e da aparente sensação de que nem governo nem ruralistas tinham ganho a queda- de-braço, um telefonema do ministro da Casa Civil, Antonio Palocci, para o líder governista Cândida Vaccarezza (PT-SP), às 23h20 de ontem mudou o curso da história. Depois que a maior parte dos partidos da base aliada tinha encaminhado voto contrário ao pedido de adiamento da votação, o ministro avisou ao seu representante na Câmara que a presidente Dilma Rousseff não estava confortável com o texto apresentado pelo relator Aldo Rebelo (PCdoB-SP) e não queria enfrentar o desgaste de negociar no Senado as mudanças pretendidas.
Depois de ouvir atentamente as orientações, Vaccarezza chamou o relator para uma conversa no canto do plenário e avisou que, apesar do que havia sido acordado, iria pedir o adiamento. Segundo o líder, parte da base governista tinha avisado que apoiaria os destaques ou que precisava marcar posição contrária ao relatório. ;Não temos segurança da aprovação e a presidente não está confortável com o teor do relatório. Vou mudar o encaminhamento e adiar a votação;, explicou o petista, ao pé do ouvido do relator.
Na mesma hora, Vaccarezza surpreendeu o plenário pedindo que a base mudasse o voto. Irritou alguns e deixou sem jeito líderes governistas que tinham encaminhado a votação de acordo com o que achavam que interessava ao Planalto e tiveram de dar um jeito de disfarçar a subserviência. ;Nós realmente não concordamos com alguns pontos desse texto e precisamos de mais tempo para negociar e analisar a questão. O PT encontrou alguns problemas e estamos inseguros. Ao insistir na votação de hoje, a oposição quer pescar em águas turvas;, disse o líder do PT, Paulo Texeira (SP), ao justificar sua mudança de posição para seguir o comando palaciano, mesmo depois de ter orientado a bancada a rejeitar o pedido de adiamento da votação e ter defendido o texto do relator minuto antes.
O líder do PMDB, Henrique Eduardo Alves (RN), chegou a dizer ao líder governista que não obedeceria à orientação do Planalto, mas mudou de ideia logo depois. ;Vamos aceitar o adiamento, mas informo que o PMDB não vai votar mais nada enquanto esse assunto não for apreciado;, ameaçou. À 0h15, por falta de quórum, o presidente da Câmara, Marco Maia (PT-RS), encerrou a sessão, confirmando o adiamento da votação.
Acordos e desacordos
Na tentativa de garantir a votação de ontem, todos os lados tinham cedido ao longo do dia. Na política de costurar os acordos possíveis, ambientalistas e governo aceitaram a liberação da exigência de reserva legal em propriedades com menos de quatro módulos fiscais e que não apresentavam mata preservada em 2008. Já os ruralistas e o relator Aldo Rebelo concordaram em permitir a abertura de uma brecha para que o governo decida por meio de decreto presidencial sobre cultivo de produtos em áreas de preservação permanente (APPs), principalmente nas áreas próximas a rios. Foi nesse ponto que o Planalto temeu a derrota. Apesar dos anúncios de que aceitariam aprovar a proposta, as contas governistas não apontavam para a vitória.
O relatório que seria levado à votação no plenário permitia a ocupação de APPs em casos de utilidade pública, interesse social e baixo impacto. Um regulamento do Executivo definiria a forma como as áreas consolidadas pela agricultura seriam permitidas. Ao contrário do que era esperado, e divulgado pelo próprio relator da proposta, não foram listadas as culturas que seriam permitidas em APPs.