Duas promessas de campanha da presidente Dilma Rousseff são os entraves para a votação do Código Florestal na semana que vem, na Câmara dos Deputados. Durante a eleição do ano passado, Dilma se comprometeu a vetar dois dos principais pontos defendidos pela bancada ruralista na proposta de revisão da lei. Em reunião travada ontem entre os principais líderes, quatro ministros de governo e o relator Aldo Rebelo (PCdoB-SP), ficou acertada a inclusão de oito das 10 sugestões feitas pelo Palácio do Planalto ao texto que será votado na semana que vem. Os dois até agora sem consenso são a liberação das reservas legais para pequenos produtores e a redução das áreas de preservação permanente (APPs) às margens de rios.
Às vésperas do segundo turno, para atrair o apoio do PV de Marina Silva, a então candidata se comprometeu a vetar quaisquer tentativas de redução das áreas de reserva legal e APPs. ;Sobre o Código Florestal, expresso meu acordo com o veto a propostas que reduzam áreas de reserva legal e preservação permanente, embora seja necessário inovar em relação à legislação em vigor;, prometeu Dilma. Por conta desse compromisso, o Palácio do Planalto esticou a corda com a bancada ruralista e indicou que, caso as alterações nas reservas legais e APPs passem no plenário da Câmara e do Senado, o veto é iminente.
Durante a reunião de ontem na Câmara, os ministros Luiz Sérgio (Relações Institucionais), Izabella Teixeira (Meio Ambiente), Wágner Rossi (Agricultura) e Afonso Florence (Desenvolvimento Agrário) tentaram por quase três horas convencer Rebelo e os ruralistas a recuarem nos dois pontos (veja quadro ao lado). O esforço foi em vão. ;Chegamos a um consenso em oito questões, já incorporadas ao Código, mas em duas há divergências. Só que chega uma hora em que você tem que fazer o casamento, não dá mais para ficar ajustando o vestido;, disse Rebelo.
A proposta do relator é de que as propriedades rurais menores de quatro módulos fiscais ou 150 hectares fiquem isentas de manter reservas legais. O Palácio do Planalto exige que a regra seja aplicada a todo proprietário rural, mesmo os pequenos produtores. No outro ponto de divergência, Rebelo pretende diminuir pela metade as APPs às margens de rios defendidas pelo governo. Enquanto o relator defende estabelecer um limite de 7,5m para as áreas já desmatadas e 15m para as demais, o Planalto quer manter os índices em 15m e 30m, respectivamente. Rebelo alega que a reivindicação foi feita pelas entidades de defesa da agricultura familiar, em especial a Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag).
Cientistas
Para tentar pressionar os ruralistas a acatar os dois pontos de divergência, o PT ameaça não votar o Código na semana que vem. O presidente da Câmara, Marco Maia (PT-RS), pediu a Aldo que ceda nos pontos de divergência. ;Se fosse ele (Aldo), incorporaria ao relatório as sugestões e propostas do governo porque isso favoreceria a votação do Código. Qualquer proposta diferente dessa, trará dificuldades para votar a matéria;, afirmou Maia. O PT ainda pediu pelo menos uma semana para analisar a proposta, antes da votação em plenário. Como Rebelo adiou a entrega do texto para a segunda-feira, um dia antes da data para o início das discussões em plenário, o principal partido da base governista ameaça esvaziar a votação. ;Um dia não é o suficiente para apresentação de um relatório como esse. Se ele (Aldo Rebelo) entregar o texto até quarta-feira (hoje), poderemos votar na semana que vem. Se só tivermos contato com ele na segunda-feira, não há possibilidade;, avisou o líder petista na Câmara, Paulo Teixeira (PT-SP). A posição foi acompanhada pelo PV.
A oposição, em sua maioria defensora do relatório de Aldo Rebelo, estrilou. O próprio relator chegou a esmurrar a mesa, cobrando o acordo fechado para a votação no dia 4. ;O PT está jogando com a sociedade. É uma questão que não deve ser mais empurrada pela barriga. Se ela (Dilma) prometeu o que não pode cumprir, que enfrente as consequências;, criticou o líder do PSDB na Câmara, Duarte Nogueira (SP). Com o impasse colocado, pelo menos mais uma reunião de líderes partidários com representantes do governo deve ser necessária até o fim da semana, para tentar contornar os pontos pendentes.
Mesmo com a possibilidade de desgaste por um possível veto, o próprio governo anunciou que não pretende protelar a votação por dois anos, como defendeu a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC). As modificações no Código Florestal são analisadas pela Câmara desde 2002. ;A ciência não é absoluta, nem dá razão de fé a ninguém. O fato de um cientista falar, não quer dizer que é a última palavra;, justificou o líder do governo, Cândido Vaccarezza (PT-SP).