As investigações referem-se ao conjunto de denúncias veiculadas na imprensa no segundo semestre do ano passado envolvendo Erenice Guerra e parentes dela. Erenice assumiu a Casa Civil quando Dilma Rousseff saiu da pasta para disputar as eleições presidenciais. Ela era considerada braço direito da presidenta Dilma Rousseff quando era ministra de Minas e Energia e, em seguida, chefe da Casa Civil do governo de Luiz Inácio Lula da Silva.
[SAIBAMAIS]O foco das apurações da CGU foram as irregularidades administrativas e financeiras. Somente em referência aos contratos firmados entre os Correios e a empresa MTA para a prestação de serviços de transporte de carga por meio da Rede Postal Aérea Noturna, a CGU analisou quatro contratos celebrados em 2010, alguns decorrentes de pregões eletrônicos e outros dispensados de licitação, com valor total de R$ 59,8 milhões. A MTA está no centro do episódio que envolve um dos filhos de Erenice, Israel, em tráfico de influência e cobrança de propina para ajudar a empresa dentro do governo. A investigação apontou que os Correios mantinham um contrato com a MTA para transporte de carga postal aérea de São Paulo para Manaus, ao preço unitário de R$ 1,99 por quilograma transportado. Em seguida, a ECT celebrou outro contrato com a mesma empresa, para o trecho Brasília-Manaus, ao preço de R$ 3,70 por quilo.
As inspeções feitas pela CGU nos depósitos e terminais da estatal nos aeroportos revelaram que os Correios estavam enviando, de caminhão, grandes quantidades de carga de São Paulo para Brasília, de onde era embarcada, nos aviões da MTA, para Manaus. ;A ECT passou a desembolsar R$1,71 a mais por cada quilo transportado desde Brasília, do que pagaria por essa mesma carga se a embarcasse desde São Paulo; isso sem contar o que gastava com o transporte por caminhão de SP para Brasília;, apontou a CGU.
;Diante das constatações, a CGU recomendou à ECT [Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos], entre outras medidas, a instauração de procedimentos apuratórios para identificar os causadores dos danos, promover as respectivas responsabilizações e quantificar valores das multas a serem aplicadas, bem como valores pagos a mais pela ECT à MTA, para efeito de cobrança de ressarcimento ao Erário;, diz o relatório.
Outra irregularidade considerada grave de Erenice foi constatada na outorga do Serviço Móvel Especializado (SME), na subfaixa de 411 MHZ, concedida à empresa Unicel pela Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel). A Unicel tinha como funcionário o marido da ex-ministra, José Roberto Camargo. As apurações feitas pela controladoria concluíram que Erenice atuou para beneficiar a Unicel. De acordo com a CGU, o chamamento público feito em janeiro de 2004 e no qual se baseou a agência para outorgar, sem licitação, o SME à Unicel ;não pode ser considerado válido para fins de aferição do eventual interesse de outras de empresas na exploração do serviço na subfaixa de 411 MHz;.
No edital de chamamento não havia prévia destinação da faixa para esse serviço, nem regulamentação da canalização e uso da faixa. Diante disso, a CGU não aceitou o argumento da Anatel de que a regulamentação, a posteriori, da subfaixa de 411 MHz convalidaria o chamamento público. ;Não poderia convalidá-lo, pois, sem a prévia destinação do serviço à faixa, o certame não permitiu aos interessados saber apropriadamente o que estava em disputa;, diz o relatório.
A CGU também não aceitou os argumentos apresentados pelo presidente da Anatel, Elifas Chaves Gurgel do Amaral, no sentido de que a regulamentação da faixa é condição apenas para a expedição do termo de autorização, e não para o chamamento público. A auditoria da CGU ressalta ainda que o chamamento público ocorreu em janeiro de 2004, vários anos antes da concessão da outorga. ;Em um setor que passa por intensa modificação tecnológica, parece bastante inapropriado assumir que as condições de exploração e os interesses de mercado se mantêm os mesmos;, avalia a CGU em seu relatório.
No relatório a CGU recomendou a imediata anulação da outorga, além da apuração de responsabilidades pela decisão de dispensar a licitação.
Quanto as apurações sobre um acordo firmado entre o Ministério das Cidades e a Fundação Universidade de Brasília (FUB) para a elaboração de estudos de planos diretores integrados de mobilidade urbana, a CGU também constatou graves irregularidades como o pagamento de R$ 2,1 milhões por um produto que não atendeu à demanda previamente estabelecida pelo ministério. De acordo com o relatório, houve falta de critérios na escolha da instituição para a realização dos serviços; inexistência de formalização do procedimento de dispensa de licitação; prestação de contas com documentação incompleta; ausência de instauração de tomada de contas especial; subcontratação de entidade privada sem qualquer vínculo aparente com o tema mobilidade urbana; e, por fim, o não alcance do objetivo pretendido com a contratação.
O acordo entre o Ministério das Cidades e a FUB foi firmado em 2007, com valor de R$ 10,5 milhões. A FUB recebeu o valor integral e contratou, por R$ 2,1 milhões, a execução de serviços de coleta e organização de informações, mas a prestação de contas sobre a aplicação desse montante não explicava a utilização do dinheiro nem evidenciava o cumprimento das ações previstas.
Segundo o relatório, o Ministério das Cidades cobrou reiteradamente a devolução do dinheiro, o que não ocorreu, assim como não foi instaurado procedimento especial de tomada de contas, igualmente recomendado. A FUB só devolveu ao ministério os restantes R$ 8,4 milhões.
Outra irregularidade apontada no relatório da CGU foi a subcontratação, pela FUB, da Fundação Universitária de Brasília (Fubra), sem licitação, para a execução dos serviços de coleta e organização de informações. O Ministério das Cidades havia justificado a contratação da FUB com o argumento de que a instituição tinha expertise no desenvolvimento desse tipo de trabalho, elevado conceito nacional e internacional, dispondo de quadro técnico altamente especializado no assunto, além de trabalhos científicos publicados na área de mobilidade urbana. O relatório concluiu que, se isso era verdade, a FUB pnão recisaria subcontratar a Fubra e, esta, subcontratar uma instituição privada, o Ibesp, que tem como objeto social a promoção do bem-estar de servidores públicos, para ser o principal agente no processo.
Ao final, o Ibesp recebeu cerca de R$ 1,8 milhão, que correspondem a mais de 85% dos recursos despendidos. O relatório aponta que a CGU não encontrou quaisquer informações acerca dos trabalhos realizados pelo Ibesp ou qualquer tipo de comprovação dos pagamentos realizados, como notas fiscais e recibos.