O governo conseguiu eleger o deputado federal Marco Maia (PT-RS) presidente da Câmara com ampla maioria. Seguindo as previsões mais otimistas, o petista alcançou 375 votos (73,7%), apesar das ameaças de integrantes da base aliada de optar pela dissidência como sinal de alerta ao novo governo. O recado foi dado, mas não na intensidade que os governistas temiam. Juntos, Sandro Mabel (PR-GO), Chico Alencar (PSol-RJ) e Jair Bolsonaro (PP-RJ) conseguiram 25,7% dos votos. Um número suficiente para mostrar que parte dos integrantes da Casa não está disposta a seguir à risca as orientações e os desejos palacianos, mas insuficiente para ameaçar votações consideradas arriscadas, como a do reajuste do salário mínimo, que o governo pretende deixar em R$ 545.
Apesar do clima de vitória antecipada instaurado na últimas semanas, ontem o deputado Marco Maia se assustou com o lançamento da candidatura de última hora de dois oponentes, além do embate já anunciado com Sandro Mabel. Teve de ir à luta. Convocou os petistas aliados e alguns peemedebistas mais dedicados à sua campanha para se reunir com pelo menos cinco deputados de outras legendas e convencê-los a seguir a orientação partidária de apoiá-lo.
Na fila de votações, Maia também não descansou. Tenso, viu-se obrigado a responder as acusações feitas pelo principal adversário de que sua vitória representaria a permissão para a ingerência do Executivo na Casa. Também foi pressionado a igualar as promessas feitas por Mabel para não correr mais riscos. No discurso de campanha, ele garantiu que iniciará as discussões para a construção de um novo anexo e fez defesa das emendas individuais parlamentares, ameaçadas de cortes pelo governo. ;Todos nós sabemos da importância das emendas. Elas representam um instrumento completo de democratização da aplicação de recursos públicos. Vamos fazer com que nossas emendas tenham efetividade;, prometeu Maia.
Empolgado em seu discurso, o petista também entrou em um debate que é a bandeira do governo Dilma Rousseff. Disse que a Câmara deve contribuir decisivamente para ajudar na erradicação da pobreza no Brasil. ;Para isso estabeleceremos metas nos próximos seis meses para debater e aprovar projetos sobre essa temática.;
Mesa Diretora
A disputa pela Presidência da Câmara não se refletiu nos outros cargos da Mesa Diretora. Pautado em um acordo prévio de respeito à proporcionalidade, os partidos lotearam os cargos de acordo com a votação obtida pelas legendas nas eleições do ano passado. Pela divisão, a 1; Vice-Presidência ficou com Rose de Freitas (PMDB-ES); a 2; Vice-Presidência com Eduardo da Fonte (PP-PE); a 1; Secretaria com Eduardo Gomes (PSDB-TO); a 2; Secretaria ficou com Jorge Tadeu Mudalen (DEM-SP); a 3; Secretaria com Inocêncio de Oliveira (PR-PE) e a 4; Secretaria com Júlio Delgado (PSB-MG). O único posto disputado foi a função de segundo-secretário, já que a estreante Rebecca Garcia (PP-AM) se lançou na disputa com Eduardo da Fonte. Ela ainda conseguiu 211 votos, graças ao discurso de última hora de que era a representante do corporativismo. Não por acaso, a função pleiteada por ela também tem a prerrogativa de analisar a conduta dos deputados.
Mozart se despede
A sessão que consagrou a nova Mesa Diretora também foi marcada pela despedida de Mozart Viana da secretaria-geral da Câmara. No cargo há mais de 20 anos, o secretário sempre foi conhecido pelo amplo conhecimento do processo legislativo e pela disposição de orientar assessores e jornalistas. Mozart foi aplaudido de pé pelos deputados e recebeu o agradecimento do presidente eleito, Marco Maia (PT-RS). Ele deixa a Câmara para ser assessor especial do senador Aécio Neves (PSDB-MG).
PERSONAGEM DA NOTÍCIA
Guinada na carreira política
Até então considerado um deputado do baixo clero da Câmara dos Deputados, Marco Maia (PT-RS) conseguiu desbancar companheiros de partido e de bancada governista na disputa pelo terceiro posto na linha sucessória do país. Ex-metalúgico, gaúcho de Canoas, o petista conseguiu alcançar a Presidência da Câmara em seu terceiro mandato. Antes da Câmara, havia tentado somente eleições à prefeitura de sua cidade natal. Acabou derrotado.
O triunfo na Câmara, que marca uma guinada na carreira política do deputado, foi ligado às ações do Poder Executivo, que colocou todas as digitais possíveis para garantir sua eleição. Se no início da disputa o governo pendia a balança para Cândido Vaccarezza (PT-SP), assim que Maia conseguiu a indicação da bancada petista, a máquina trabalhou com todas as armas para inflar a sua candidatura.
O apoio, que incluiu o contingenciamento de emendas, o adiamento de nomeações para cargos do segundo escalão e até ameaça de expulsão de Sandro Mabel do PR, terá a fatura cobrada já nos primeiros dias da gestão de Maia à frente do parlamento.
Embora defenda a independência da Câmara e alterações nas regras para liberação de emendas, o deputado gaúcho dificilmente terá uma posição de grande resistência em relação ao Planalto. Ao todo, a bancada governista chega a quase 400 deputados ; suficiente para ter tranquilidade e até aprovar emendas constitucionais sem necessidade de grandes articulações.
O novo presidente da Casa ainda colocará em curso, já nos primeiros dias de gestão, promessas feitas a setores da Casa. A principal delas será a votação do novo Código Florestal. O deputado prometeu à bancada ruralista limitar em um mês a discussão da matéria e votar o projeto final até o fim de março, sem adiamentos. No debate do salário mínimo, Maia se comprometeu apenas a não influenciar o debate, no que deve ser o primeiro termômetro sobre o grau de independência do Executivo que a gestão de Maia à frente da Câmara imprimirá nos próximos dois anos. (II)