Oito anos de governo e quatro ministros sanitaristas depois do início da era Lula e o retrato da saúde no Brasil fechará o ciclo com importantes avanços na universalização do Sistema Único de Saúde (SUS), mas com sérios problemas de financiamento. O sistema de saúde que o presidente legará a Dilma Rousseff traz um quadro modificado pela implementação do Samu, o crescimento das equipes de Saúde da Família e a queda de vários índices importantes, como o da mortalidade infantil e o de doenças como hanseníase e tuberculose. Ainda houve um aumento considerável no número de leitos oferecidos pelo SUS. Mas, mesmo com as conquistas alardeadas pelo governo, a saúde termina como a área do governo Lula mais mal avaliada pela população brasileira. Segundo pesquisa CNI/Ibope, 54% da população desaprovam a atuação do Palácio do Planalto no setor.
A estatística tem como explicação grandes lacunas da saúde, não preenchidas pelo atual governo. Embora o número de equipes de Saúde da Família tenha saltado de 19 mil para 35 mil em oito anos, falta atendimento especializado à maior parte da população. Mesmo com as passagens de Humberto Costa, Saraiva Felipe, Agenor Alves e José Gomes Temporão pela pasta, não houve força política que arrumasse uma saída para o financiamento do setor, que ainda perdeu R$ 40 bilhões de financiamento com o fim da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF) em 2007. ;Embora meritórias, as iniciativas dos ministros da Saúde e suas equipes foram insuficientes para reverter a participação de coadjuvante da saúde no governo Lula;, critica a doutora em Saúde Pública Lígia Bahia, do Laboratório de Economia da Saúde da UFRJ.
Debruçados sobre os números dos oito anos do governo Lula, os especialistas são unânimes em ressaltar que houve avanços importantes. A taxa de mortalidade infantil caiu de 23,9 por 100 mil nascidos vivos, em 2003, para 19 por 100 mil, por exemplo. Ao mesmo tempo, o Samu, criado em 2003, já soma 1,9 mil ambulâncias em todo o país, entre outros veículos de atendimento de urgência. A quantidade de leitos de UTI no SUS saltou de 11.293, há sete anos, para 16.390. No mesmo período, os transplantes aumentaram 60% e chegaram a 20,2 mil no ano passado. Os óbitos por malária caíram pela metade. Cerca de 550 farmácias populares foram abertas, além de 13,1 mil credenciados, com medicamentos mais baratos do que os oferecidos em estabelecimentos convencionais.
Ao mesmo tempo, o Ministério da Saúde ainda conseguiu ser determinante para a aprovação de questões como as pesquisas com células-tronco e a política de prevenção à gravidez. Em contrapartida, não se conseguiu incluir a questão do aborto como agenda de saúde pública e viu-se chegar a 4 mil o número de cidades infestadas pelo mosquito da dengue ; em 1995 eram 1,7 mil.
Estados e municípios
Embora consideráveis, todos esses avanços ocorreram em um ritmo muito inferior ao demandado pela população ; o que resulta na baixa aprovação das políticas de saúde. O saldo, para os especialistas, é de que os ganhos teriam sido muito superiores, caso o governo federal tivesse encontrado, enfim, uma solução para o financiamento da saúde. Hoje, a maior parte dos recursos que chegam para a área são aplicados pelos estados e municípios.
A Emenda Constitucional 29, que estabelece parâmetros fixos para aplicação no setor, padece em uma das gavetas do Congresso Nacional. ;O que se faz com o pouco dinheiro que se tem já é um milagre. Os gastos com saúde no país são muito baixos, cinco vezes menores do que em países mais desenvolvidos, mas com populações bem menores;, diz Renilson Reher de Souza, ex-secretário adjunto de Saúde de São Paulo (2007-2008) e secretário de Atenção à Saúde do Ministério da Saúde no governo Fernando Henrique Cardoso (1995-2002).
A herança
Índice - 2003 - 2010
Mortalidade infantil - 23,9 por 100 mil habitantes - 19 por 100 mil habitantes
Leitos de UTI no SUS - 11,2 mil - 16,3 mil
Número de transplantes - 12,7 mil - 20,2 mil
Casos de hanseníase - 51,9 mil - 36,7 mil
Estabelecimentos de saúde - 65,3 mil - 94 mil
Fonte: Ministério da Saúde