Luiz Inácio Lula da Silva deixa a Presidência com um Ministério da Previdência Social bem diferente do retratado em seu primeiro ano de governo, 2003, quando, por um erro gerencial e falta de estrutura das agências, idosos com mais de 90 anos foram convocados para um recadastramento. Após o episódio, o governo Lula tomou como uma obsessão administrativa melhorar o atendimento dos beneficiários. Associando a tecnologia da internet a das centrais de atendimento telefônico, a pasta que será comandada pelo senador Garibaldi Alves (PMDB-RN), a partir do início do ano, conseguiu trocar as traumáticas filas por uma média de espera de 30 minutos.
Desde a criação do agendamento eletrônico, 316,9 milhões de pessoas foram atendidas utilizando o método de triagem. Por dia, a central da Previdência recebe uma média de 250 mil telefonemas. A ampliação do número de agências entrou como reforço da informatização do atendimento. Lula deixa a Presidência com 1.173 postos do Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS), 720 a mais, e a presidente eleita, Dilma Rousseff, assume com o compromisso de fazer outras 657 agências da Previdência em 2011. A certificação digital, método que garante a autenticidade de documentos enviados pela internet, também é um desafio para o próximo ano.
Se a melhora no atendimento caminha, o desafio para Dilma Rousseff é providenciar mudanças no sistema de gestão previdenciária. A discussão da reforma da Previdência é uma pauta já calculada pelos líderes governistas no Congresso. Se as Casas não tiverem unidade política para votar grandes reformas, os parlamentares se debruçarão pelo menos no debate do fator previdenciário. Apesar de o índice que calcula o valor das aposentadorias com base na expectativa de vida e tempo de contribuição dos beneficiários ter sido derrubado, o governo vai insistir na permanência do fator, apostando em novas regras.
Mau funcionamento
O atual rombo nas contas da Previdência é estimado em R$ 40 bilhões. Especialistas ouvidos pelo Correio apontam que o mau funcionamento de políticas sociais ; ligadas à geração de empregos formais e ao acolhimento de cidadãos com dificuldade de se manter no mercado de trabalho ; é responsável pelo consumo de grande parte dos recursos que pagam os benefícios dos contribuintes. De acordo com informações da assessoria da pasta, atualmente 7,1 milhões de trabalhadores rurais e 1,1 milhão de pessoas que nunca contribuíram recebem benefícios previdenciários.
REFORMA ASSISTENCIAL
Feito
; Agendamento eletrônico do atendimento previdenciário
; Criação de 720 novas agências, ampliando a rede para 1.173
; Redução do tempo de espera dos usuários para média de 30 minutos
; Envio de carta-aviso informando ao contribuinte que ele pode se aposentar
; Aumento da arrecadação entre os trabalhadores de regiões urbanas
; Programa de inclusão de trabalhadores informais na rede previdenciária
A fazer
; Criação 657 novas agências em 2011
; Implantação da certificação digital, que possibilitará que o beneficiado dê
entrada na documentação necessária para aposentadoria
ou pensão sem sair de casa
; Política fixa de reajuste para aposentados que ganham
mais de um salário mínimo
; Aprovação de um novo modelo para substituir o fator previdenciário
; Ampliação da cobertura da Previdência, que atualmente atinge apenas 67% dos brasileiros, com ênfase nos trabalhadores informais e da agricultura
; Política de popularização da previdência privada para garantir renda extra aos aposentados em virtude da redução do benefício
Ajustes na engrenagem política
; Ivan Iunes
Luiz Inácio Lula da Silva assumiu para o dia seguinte à despedida do Palácio do Planalto uma missão que, em oito anos de governo, não foi capaz de tocar: iniciar movimento para uma ampla reforma política no país. Desde que o atual presidente subiu a rampa, em 2003, todas as modificações no sistema político-eleitoral vieram do Judiciário ou por iniciativas populares. Ainda assim, as leis de Fidelidade Partidária e da Ficha Limpa são o único legado positivo em se tratando do tema.
Assim que Lula assumiu a Presidência, o sistema político brasileiro havia incorporado há pouco a reeleição e a verticalização, e se preparava para implementar a cláusula de barreira. A lei que restringia o acesso ao Fundo Partidário e o tempo na TV aos partidos que obtivessem menos de 5% dos votos entraria em vigor em 2007, mas acabou abortada em 2006. No mesmo ano, o Congresso sepultou a verticalização, regra adotada em 2002 que obrigava as coligação estaduais a repetirem a formação de alianças adotadas na campanha presidencial. Assim, no primeiro mandato de Lula, o pouco que existia de mudanças no sistema eleitoral foi pelo ralo.
O foco da modificação do sistema político acabou sendo alterado para o financiamento eleitoral, especialmente por conta do escândalo do Mensalão, que, em 2005, trouxe denúncias de caixa dois nas campanhas e de compra de votos de parlamentares. Tido como solução para a generalização da prática, o financiamento público de campanha sequer chegou a ser votado no Congresso. ;O sistema político é avesso a reformas, em geral. Você tem de constituir uma maioria muito onerosa, com alto custo para a máquina. Discute-se ainda hoje o financiamento público de campanha, mas sabemos que não há fiscalização que garanta essa origem única de recursos durante as eleições;, diz o cientista político do Instituto de Ensino e Pesquisa (Insper) Carlos Mello.
A primeira inovação na área foi a regulamentação da Fidelidade Partidária pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE), em 2007. Depois, com a força de 2 milhões de assinaturas a Lei da Ficha Limpa chegou ao Congresso no fim do ano passado. Inicialmente, punia com a inelegibilidade todo político condenado ou com denúncias de crimes graves sendo investigadas, mas acabou abrandada pelos parlamentares. ;Os políticos quando querem fazer reformas têm o intuito de constituir salvaguardas, se proteger da sociedade, e não o inverso. O nosso Congresso cobra um preço altíssimo para implementar a agenda de governo e da sociedade, mas há uma pressão muito grande para que o processo seja alterado;, aposta Mello.
NOVAS E ESPERADAS REGRAS
Feito
; Lei da Ficha Limpa: criada em maio deste ano a partir de um projeto de iniciativa popular, a legislação pune com a inelegibilidade os políticos condenados por órgão colegiado, desde que não consigam liminar em tribunal superior contra a condenação.
; Fidelidade partidária: estabelecida por decisão judicial em 2006, vincula o mandato ao partido e não mais ao político eleito. Com a mudança, em caso de desfiliação da legenda, o parlamentar também deve entregar o posto no parlamento.
A fazer
; Financiamento público: é visto por muitos políticos como um meio de baratear as eleições e diminuir a incidência do caixa dois
durante as campanhas.
; Voto em lista: pela regra, o eleitor votaria no partido ou na coligação de sua preferência, mas os nomes dos eleitos seriam definidos pela sigla.
; Voto distrital: substituiria a atual divisão por estados dos mandatos na Câmara dos Deputados por uma baseada na formação de distritos.
A intenção é aumentar a representatividade de regiões menos populosas.