O governo fechou acordo com a oposição para conseguir votar o Projeto de Lei do Orçamento ainda este ano. Ontem, após negociação, parlamentares da Comissão Mista de Orçamento aprovaram o relatório preliminar do senador Gim Argello (PTB-DF). O consenso permitiu ao governo esticar para o início do ano, já com os novos parlamentares no Congresso, as votações mais polêmicas, como o valor do novo mínimo, do Bolsa Família, a Contribuição Social para a Saúde (CSS) e o aumento das compensações aos estados exportadores por causa da Lei Kandir. Alguns pontos, como o mínimo, devem ser editados por Medida Provisória para serem convertidos em lei somente com a nova composição do Congresso Nacional.
A rápida aprovação do texto só foi possível porque deputados e senadores aceitaram retirar da discussão as propostas de aumento do mínimo acima dos R$ 540 defendidos pelo governo, calculados pela inflação do ano passado mais o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) de 2009. A oposição, que queria R$ 600, concordou em diminuir o valor. Os parlamentares mais irredutíveis estão na própria base governista e insistem em R$ 580. Eles alegam que o crescimento do PIB neste ano, estimado em 7,6%, daria conta desse aumento.
O governo conseguiu acordo com a oposição ao garantir a destinação de recursos para obras assistenciais e a retirada de pauta de temas polêmicos, como o reajuste do Bolsa Família. O montante de recursos destinados à lei Kandir, previsto em R$ 7 bilhões, também foi reduzido e passou a R$ 3,9 bilhões. O Executivo também aceitou reservar pouco mais de R$ 1 bilhão para corrigir a diferença da destinação per capita do Sistema Único de Saúde (SUS) aos estados. Atualmente, o SUS destina R$ 112 per capita para cuidar da saúde dos paraenses e R$ 187 aos sul-mato-grossenses.
A estratégia do governo ao cooptar a oposição foi de conseguir controlar a própria base para manter uma folga no Orçamento que permita investimentos em infraestrutura, de forma a não deixar a futura presidente Dilma Rousseff engessada no primeiro ano de gestão. Mesmo com a intenção de enxugar gastos, o Palácio do Planalto ainda terá de enfrentar várias rodadas de negociação pelo novo valor do salário mínimo.
Negociação
Amanhã, os sindicalistas têm reunião marcada com Bernardo para tentar chegar a uma cifra de consenso. Os dois lados, no entanto, já estão com a corda esticada. ;A oposição utiliza o critério de R$ 600 porque é o que o Serra prometeu, mas ele perdeu a eleição. O acordo pode ser revisto. O problema neste ano é que o PIB do ano passado foi zero. Temos uma reunião com o Paulo Bernardo na quinta-feira, mas o governo colocou o pior cara para negociar conosco;, reclamou o deputado federal Paulinho da Força (PDT-SP).
O ministro do Planejamento disse ainda que para cada R$ 1 de aumento no salário mínimo, seriam R$ 286 milhões perdidos para investimentos. ;Uma mudança na discussão sobre esse critério (de reajuste do salário mínimo) pode ser feita, mas que tenha valor por quatro anos. Não dá para quando o PIB for menor, usarmos o critério estabelecido e quando ele for maior, mudarmos os parâmetros;, critica Bernardo. Outro reajuste polêmico é o dos aposentados que ganham mais de um salário mínimo. O governo prevê 5,1%, de acordo com a inflação deste ano, mas pode esticar o percentual com a aprovação de um novo critério para o aumento dos benefícios.
De acordo com o ministro, o Palácio do Planalto também não vai reajustar o valor da Bolsa Família. O aumento neste ano seria inconstitucional por causa da lei eleitoral. O relatório aprovado ontem tem uma brecha para que o novo governo aprove um novo valor no ano que vem. Bernardo também voltou a pedir uma discussão sobre mais repasses para a saúde. ;A discussão é se queremos pôr mais dinheiro ou não. Se o valor está bom e precisamos apenas melhorar a gestão ou se é preciso mais recurso. Se o Congresso e a sociedade acharem que é preciso melhorar a gestão, é só regulamentar. Agora, temos de dizer de onde esse dinheiro iria sair;, disse.
Validade imediata
Ao ser aprovado por medida provisória, o novo salário mínimo passa a vigorar assim que o presidente da República assinar o aumento, sem a necessidade de aprovação imediata do reajuste pelo Congresso. Para o aumento ser validado, no entanto, deputados e senadores terão de referendar a MP em um prazo de 120 dias e podem, inclusive, mudar o texto. Se não for convertida em lei dentro desse prazo, a medida perde a validade.
PONTO A PONTO PAULO BERNARDO
SALÁRIO MÍNIMO
;Nós temos acordo a partir das centrais. Mandamos a proposta segundo o acordo estabelecido, que era reajustar pela inflação mais o crescimento do PIB de dois anos atrás. É o melhor critério. Somente no governo Lula reajustamos o mínimo 60% acima da inflação. Agora, querer pagar R$ 600 significa transformar investimentos em despesas correntes, já que os recursos teriam de ser retirados da infraestrutura.;
CORTES
;Se nós aumentarmos o salário para um patamar maior, nós vamos ter que cortar alguma coisa. O Minha Casa, Minha Vida, que tem previsão de R$ 44 bilhões no próximo ano, juntamente com o PAC, será o primeiro a ser cortado;
COPA DE 2016
;Em regra, o governo federal não colocará recursos para a construção de estádios. Iremos custear e financiar obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), como os corredores exclusivos para ônibus e os veículos leves sobre trilhos. Havendo desejo do novo governo de modificar essa intenção, basta mandar um ofício ao atual governo e alteramos o projeto, mas duvido que isso aconteça.;
CONTRIBUIÇÃO PARA A SAÚDE
;Temos a Emenda Constitucional 29, que é essencial ser regulamentada. A rigor, o governo federal repassa o que a emenda exige, mas os estados não e os municípios acabam tendo de cobrir o rombo. A CPMF não era destinada à saúde como deveria e acabou indo para o tesouro para cobrir as despesas crescentes. A discussão aqui é se precisamos de mais dinheiro para a saúde e de onde ele viria.;
REAJUSTE AOS APOSENTADOS
;Acho que não é viável. Não sei se temos condições de fazer o mesmo com todas as aposentadorias. Com certeza deve ser uma emenda muito criativa, mas é inviável.; (Sobre conceder o mesmo índice de reajuste do mínimo aos aposentados que ganham mais de um salário.)
LEI KANDIR
;A questão da lei Kandir ficou definida que é discussão do Congresso. Se nós colocarmos R$ 4 bilhões, os estados vão achar que é o piso.;