O Ministério Público Federal (MPF) precisou intervir em pelo menos três contratos da Natura Cosméticos com comunidades tradicionais para garantir uma correta repartição dos benefícios às populações que oferecem conhecimento e propriedades genéticas à indústria de cosméticos. Os pedidos para que o MPF acompanhe a execução dos contratos partiram das próprias associações.
No interior do Maranhão, a Natura explora as propriedades do babaçu. Em troca, reparte os benefícios com a comunidade local, como manda a legislação brasileira. Como faltam parâmetros para a definição dos valores, o MPF foi acionado, em 2008, para acompanhar a definição das cláusulas contratuais.
Dois anos antes, associações do Mercado Ver-o-Peso, reconhecido centro paraense de ervas medicinais e aromáticas, solicitaram a presença do MPF nas negociações. Os dois contratos com a Natura resultaram em inquéritos abertos pelo MP. No Acre, em 2007, os procuradores da República moveram uma ação civil pública contra a empresa por supostamente fazer aproveitamento ilegal do murumuru, fruto cujo conhecimento tradicional pertence aos índios ashaninka.
De acordo com a procuradora regional da República Eliana Péres Torelly, que atuou nos casos do Maranhão e do Pará, os valores oferecidos pela Natura ;foram muito baixos;. ;Quando as comunidades são procuradas, elas não têm ideia do que estão vendendo.; Os vendedores de ervas do Mercado Ver-o-Peso chegaram a um acordo com a indústria de cosméticos, mas o sigilo estabelecido para os valores contratuais dificultou as negociações com a comunidade que explora o babaçu, no interior do Maranhão.
Nos dois casos, segundo a procuradora, as autorizações foram concedidas pelo Conselho de Gestão do Patrimônio Genético (Cgen), ligado ao Ministério do Meio Ambiente (MMA). O Correio mostrou, no último dia 3 que, durante a gestão da senadora Marina Silva no MMA, o Cgen concedeu seis autorizações para a Natura explorar recursos genéticos da biodiversidade brasileira. Cinco sócios da Natura, entre eles o vice na chapa do PV que disputou a Presidência da República, Guilherme Leal, doaram R$ 12,4 milhões dos R$ 24,9 milhões arrecadados pela ex-candidata.
Para o ex-secretário de Biodiversidade e Florestas e presidente do Cgen entre 2003 e 2006, João Paulo Capobianco, não houve nenhuma facilitação à Natura. ;Toda a análise foi técnica, com a aprovação de um colegiado.; Segundo ele, que coordenou a campanha de Marina à Presidência, a empresa foi a que mais atuou ;proativamente; para regularizar, no MMA, o acesso a propriedades genéticas. Essa repartição de benefícios é regulamentada por uma medida provisória de 2001. Como há várias falhas na medida, o Cgen edita normas e resoluções para conceder as autorizações.
Para o diretor de Assuntos Corporativos e Relações Governamentais da Natura, Rodolfo Guttilla, o relacionamento da empresa com 26 comunidades tradicionais sinaliza que ;a Natura tem boa relação com os fornecedores;. ;A medida provisória é muito imperfeita. Procuramos oferecer valores justos e equitativos e, para isso, seguimos parâmetros de precificação do mercado internacional.; A diretora jurídica da empresa, Lucilene Prado, confirma que a Natura foi intimada nos inquéritos do MPF. ;O inquérito no Maranhão está suspenso, esperando o fim do contrato. No Pará, o inquérito será arquivado, pois o contrato foi cumprido;, diz Lucilene.