Jornal Correio Braziliense

Politica

Doador não teve privilégios

Em 2002, Marina Silva recebeu de uma fabricante de pneus recursos para a campanha. Depois, como ministra, foi favorável à aplicação de multa milionária à empresa

A candidata verde na disputa pela Presidência da República, a senadora Marina Silva (PV-AC), já recebeu doação de campanha de uma empresa altamente poluidora, multada em R$ 6,5 milhões pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) e julgada pela própria parlamentar ; quando era ministra do Meio Ambiente, em 2007 ; durante a análise dos recursos contra a multa. O grupo Pirelli, por meio da Pirelli Energia Cabos e Sistemas do Brasil, doou R$ 50 mil a Marina em 2002, quando ela foi eleita senadora pelo Acre. Três anos depois, a Pirelli Pneus S.A. foi autuada pelo Ibama ; a multa de R$ 6,5 milhões é o maior valor aplicado dentre as autuações a oito fabricantes irregulares ; por não recolher pneus usados, em descumprimento a uma resolução do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama) de 1999.

A doação da Pirelli, legal e registrada no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), foi a maior dentre as contribuições de campanha a Marina Silva em 2002. Naquele ano, a então candidata arrecadou R$ 224,2 mil. A participação da multinacional no processo eleitoral, por meio de irrigação de recursos a candidatos estratégicos, fez parte de uma intensa briga comercial travada entre as indústrias fabricantes de pneus novos e as fabricantes que adquirem pneus reformados, a maioria importada de outros países.

A importação de pneus, até a proibição total pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em 2009, foi um dos principais temas debatidos pelo Ministério do Meio Ambiente (MMA) durante a gestão de Marina Silva, de 2003 a 2008. A então ministra se posicionou contra a possibilidade de importação, inclusive num contencioso aberto pela Organização Mundial do Comércio (OMC) para discutir a questão.

Acusações
A ofensiva contra os pneus importados despertou a reação das indústrias que defendem o uso de pneus reformados. Depois de acusações de crime ambiental, oito fabricantes de pneus novos, entre eles a Pirelli, a Bridgestone Firestone, a Michelin e a Goodyear, foram multados pelo Ibama em mais de R$ 20 milhões por descumprirem a Resolução n; 258/99 do Conama. Pelo documento, a partir de janeiro de 2004, para cada pneu novo fabricado no país, outro velho precisa ser recolhido pelo fabricante. Os processos correm separadamente no Ibama, e a Pirelli já apresentou todos os recursos possíveis no trâmite do auto de infração.

O primeiro pedido de suspensão da multa foi feito em outubro de 2005, quatro meses depois de o Ibama lavrar o auto de infração. A Pirelli considerou o valor da multa ;exorbitante; e ;definido a esmo;. Após rejeitar o recurso, o Ibama encaminhou o processo ao MMA, em março de 2007. Primeiro, uma advogada da União manteve o indeferimento do recurso. Depois, em 17 de abril de 2007, a então ministra Marina Silva acolheu o parecer, mantendo o mesmo valor da multa aplicada e remetendo o processo de volta ao Ibama.

Mais uma vez, a Pirelli recorreu, sob o argumento de que ;mais de 40% da população não deixa os pneus velhos nos pontos de troca;. O processo seguiu para o Conama, última instância para apreciação da multa, que decidiu devolvê-lo novamente à Presidência do Ibama, no mês passado. Uma decisão da 9; Vara Federal do Distrito Federal (DF) de 2005 suspendeu a exigência da multa aplicada, em benefício da Pirelli. A Presidência do Ibama deve avaliar se a decisão judicial tem implicações na decisão administrativa de multar a empresa por deixar de recolher os pneus usados.

Sem garantia de salvo-conduto
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--> <-- --> Doações de campanha não são atestados de idoneidade, nem salvo-conduto a empresas doadoras. É o que afirma a senadora Marina Silva (PV-AC), por meio de sua assessoria de imprensa, em resposta ao fato de ter recebido dinheiro de uma companhia multada pelo Ibama por poluição ambiental. ;Quem errou tem de pagar pelo erro;, disse a candidata à Presidência.

Ainda segundo a assessoria de imprensa da candidata, Marina ;nunca escondeu de ninguém; as doações de campanha que já recebeu. ;E uma doação não é garantia de favorecimento.; Ela diz ser favorável ao financiamento público das campanhas eleitorais, ;justamente para evitar qualquer tipo de suspeita;. Uma parceria entre a Pirelli Pneus S.A. e as cooperativas de produtores de borracha natural de seringais do Acre, intermediada por Marina em 2002, garantiu a fabricação do primeiro pneu brasileiro com borracha também brasileira.

O Correio tentou ouvir a explicação da Pirelli sobre a multa de R$ 6,5 milhões aplicada pelo Ibama, mas, por meio da assessoria de imprensa da empresa no Brasil, o grupo disse que ;não comenta sobre ações em trâmite;. A Pirelli limitou-se a informar que, neste ano, não irá apoiar nenhuma campanha política.

Em 2002, além de Marina Silva, foram financiadas pela fabricante de pneus as candidaturas de Geraldo Alckmin (PSDB) a governador de São Paulo, de Jorge Viana (PT) ao governo do Acre, de Tarso Genro (PT) ao governo do Rio Grande do Sul e de outros candidatos a deputado estadual, federal e a senador.