; Vinicius Sassine
Enviado especial
Goiânia ; Dentro do movimentado mercado popular no centro de Goiânia, Marina Silva interrompe a caminhada: quer comprar um vidro com pimenta. O tipo da pimenta ; popularmente chamada de biquinho ; chamou a atenção de Marina, que já conhecia o tempero. A candidata do PV à Presidência da República paga os R$ 6 cobrados pelo vendedor. E faz mais uma comparação, entre tantas ao longo do dia. ;Essa pimenta não arde. É o melhor jeito de fazer política: sem agredir as pessoas.;
A campanha de rua em Goiânia, que durou uma manhã, uma tarde e um bom pedaço da noite, revelou uma candidata com estilo bem próximo ao do presidente Luiz Inácio Lula da Siiva, o principal capital político da candidata petista Dilma Rousseff, adversária de Marina. Mais uma Silva a ambicionar a Presidência, como fez questão de reforçar, Marina abusou das metáforas, foi apresentada como a ex-ministra de Meio Ambiente de Lula, contou histórias de vida até então pouco reveladas, reforçou sua origem, foi do centro da cidade a um dos bairros mais periféricos de Goiânia. O objetivo era um só: clarear ao eleitor qual é a outra opção de voto, além de Dilma e de José Serra (PSDB).
;Quem é essa mulher?;, ainda se ouvia muito durante o corpo a corpo de Marina com os eleitores no centro de Goiânia. Ela chegou à cidade em meio a um isolamento político, que parece ter pego de surpresa a própria coordenação da campanha.
Em Goiás, o PV ; que segue sozinho na disputa pela Presidência ; não tem candidato a governador, ao contrário da realidade do partido na maioria dos estados. A decisão foi apoiar o candidato do governador Alcides Rodrigues (PP), Vanderlan Cardoso (PR). Nem um nem outro acompanharam a caminhada de Marina. Os dois estão alinhados a Lula e Dilma.
Questionada sobre esse isolamento, após a caminhada que envolveu 100 militantes do PV em Goiânia, Marina devolveu o questionamento: ;Isso aqui é solidão? Nunca me senti tão bem acompanhada. Vamos tirar o eleitor do anonimato, que vai eleger uma Silva, uma mulher presidente do Brasil.; A estratégia de Marina em Goiânia foi se apresentar ao eleitor, e para isso a candidata adotou o contato direto com os moradores da cidade ; ela caminhou do ponto principal da capital, a Praça do Bandeirante, até o mercado central, passando pelas vias mais movimentadas ;, além de usar a imprensa para transmitir o seu recado político.
Entrevistas
O primeiro compromisso foi uma entrevista a uma emissora de rádio e o segundo, uma visita à Organização Jaime Câmara, proprietária da emissora afiliada da Rede Globo e de outros veículos de comunicação. Depois da caminhada no centro de Goiânia, que durou mais de duas horas, Marina improvisou na agenda uma visita à sede da Rede Record em Goiás, e seguiu então para a inauguração de mais uma ;Casa de Marina;, projeto que espalha comitês domiciliares pelo país. A residência escolhida fica no Bairro Floresta, um dos mais pobres e isolados de Goiânia.
Mesmo pouco conhecida, Marina se ocupou a maior parte do tempo com o discurso da sustentabilidade ambiental, com uma linguagem que tenta maior proximidade a seus interlocutores. A candidata do PV, evangélica da Assembleia de Deus, também fez a ponte com três igrejas neopentecostais em Goiânia: Universal do Reino de Deus, ao visitar a Record; Fonte da Vida, onde visitou uma emissora de televisão; e Luz para os Povos, que organiza por três dias, em Goiânia, um encontro nacional de fiéis. ;Esse não é um bom modelo de desenvolvimento, que destrói o que Deus nos deu;, disse a candidata. Ela criticou o ;uso da máquina administrativa; por Dilma, Lula e Serra. ;O patrimônio carismático não dá o direito de extrapolar. A observância da lei vale para todos.;
Pregação aos evangélicos
Num evento evangélico com 10 mil fiéis, que adentrou pela noite, Marina foi a convidada de honra. Ela chegou às 21h15 e faria uma pregação bíblica. Evangélica, Marina reforçou ontem que é contra o casamento gay e contra pesquisas com células- tronco. Ao chegar ao evento, no Ginásio Goiânia Arena, a senadora ignorou o candidato ao governo de Goiás, Vanderlan Cardoso (PR), que não participou da caminhada mais cedo ao lado da presidenciável pelas ruas da capital. Desde o início da campanha oficial, foi a primeira vez que Marina realizou uma pregação a fiéis de uma igreja pentecostal.
Histórico de sofrimento
Dentro da casa que, agora, é um comitê domiciliar do PV, Marina Silva contou como respondeu a uma pergunta da filha: ;Mãe, o que é um chuveiro?;, indagou uma das filhas, quando era criança. ;Eu furei uma lata, enchi de água e pendurei para ela ver como era.; Aos atentos ouvintes da ;Casa de Marina;, ela disse que já foi atendida como indigente em um hospital. Mais cedo, na entrevista à rádio 730 AM, Marina relatou que, quando tinha 17 anos de idade, teve cinco dentes arrancados contra sua vontade, por falhas no atendimento público de saúde.
O trauma que tem de aviões, segundo a candidata, surgiu no início da carreira política no Acre, quando fazia campanhas em ;avião monomotor, a pé, de canoa, de mula;. Marina ressaltou que foi empregada doméstica, que só se alfabetizou aos 16 anos e que é, ;com muito orgulho;, professora.
Na casa da bordadeira Cleuza Maria Rodrigues, de 34 anos, e do lanterneiro Valdeir Batista, 40, pais de duas crianças e uma adolescente, Marina se emocionou com a dupla sertaneja que a recebeu. E quis saber dos moradores: ;Vocês já me conheciam?; ;Pela TV;, respondeu Cleuza, cunhada de um candidato a deputado federal em Goiás pelo PV e há 14 anos moradora do Bairro Floresta, um dos mais pobres de Goiânia.
Cleuza e Valdeir, que recebem R$ 100 do Bolsa Família, transformaram a residência deles na ;Casa de Marina;. ;Com o Lula já melhorou bastante, não posso reclamar. Mas por que não dar mais uma mudada?;, disse Cleuza. (VS)
Ouça trecho de entrevista com a candidata do PV à Presidência, Marina Silva