Na pequena cidade em que nasceu o Luiz mais famoso do Brasil, o clima ameno de inverno e a névoa que cobre ruas e casas todas as manhãs não escondem a ansiedade dos moradores com a chegada de mais uma eleição presidencial. Em Caetés, no interior pernambucano, os moradores não têm água encanada, falta esgoto, asfalto e ônibus escolares, mas ninguém tem dúvida de que a candidata do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, Dilma Rousseff (PT), vai ganhar de lavada na região. Para a oposição, só resta evitar o confronto direto a fim de tentar roubar alguns votos para o tucano José Serra. O lema que vem sendo repetido na cidade diz tudo: ;Agora é Dilma contra Serra. Lula não é candidato;.
Com 26 mil habitantes, Caetés fica localizada ao lado de Garanhuns, considerada a Suíça pernambucana. O trajeto de uma cidade a outra pode ser cumprido em menos de 15 minutos. E é nesse tempo que se vê uma mudança brusca de paisagens e realidades. A cidade das flores dá lugar a campos branquinhos, semelhantes às dunas do litoral ; o detalhe é que a praia mais próxima está a pelo menos 200 quilômetros. Dizem que o solo peculiar de Caetés é o culpado pela pobreza na cidade. ;No frio, vira lama. No verão, deserto. E nada pega. Só mesmo feijão e mandioca;, explicam os moradores.
Embora parte da oposição alardeie que pouca coisa melhorou na vida dos moradores nesses últimos oito anos, quem visita a cidade tem a exata noção do que representa Lula para os seus habitantes. Logo na entrada da cidade, um muro pintado indica o orgulho do filho-herói: ;Caetés, terra do presidente;.
Na zona rural, onde Lula viveu com a família, as transformações seguem um ritmo lento. As ruínas da casa onde dona Lindu, mãe do presidente, esperou o pau de arara que levaria a família para São Paulo ainda estão lá. O que restou da casa fica em uma encruzilhada, próxima à entrada de Sítio Comprido, nome do povoado onde a família morava.
Um pouco mais adiante estão uma escola, um posto telefônico abandonado e uma casa com o número 45, do PSDB, pintado no muro. Foi o que sobrou das eleições municipais ; reflexo de que a rivalidade entre os dois partidos também existe na cidade. Lindolfo Almeida, candidato à prefeitura, perdeu as últimas eleições por uma diferença de 500 votos para um aliado de Lula, Aércio José de Noronha. Promete, agora, trabalhar pelo adversário José Serra, candidato ao Palácio do Planalto.
Em Sítio Comprido ainda não há sistema de abastecimento de água. Pelo menos uma vez por semana um caminhão-pipa corta a estrada de terra enchendo os reservatórios das famílias. Quem não tem onde armazenar conta com a solidariedade dos vizinhos. A população reinvindica a construção de uma barragem. Em 1998, ainda na gestão de Fernando Henrique Cardoso, um convênio para o projeto chegou a ser publicado. Por mais de 10 anos, a obra, inicialmente orçada no valor de R$ 75 mil, atravessou as gestões petistas e tucanas sem sair do papel.
A oposição na cidade pretende usar também esses dados para diminuir a vantagem que Lula tem em sua terra. ;Vamos mostrar que ele não fez tanto quanto poderia;, diz o vereador Severino José dos Santos, o Gordo (PSDB-PE). A Usina de Biodiesel construída na cidade com a promessa de gerar empregos também será atacada. ;Não funciona. Os únicos postos de trabalho criados foram dos três vigilantes;, alfineta o parlamentar, que está em seu primeiro mandato. Ele relaciona ainda problemas na saúde e na educação.
Bolsa
É pouco provável que a estratégia tenha sucesso. Se no Nordeste o presidente é visto como rei, nessa região específica do agreste ele é mais que rei. ;Votava 10 vezes se ele fosse candidato;, diz o agricultor Sebastião Venâncio, de 46 anos, pai de duas meninas de 16 e 13 anos. ;Como ele não pode, vou na Dilma;, completa. Ele argumenta que o governo está trabalhando bem. Comemora os R$ 90 que recebe mensalmente do programa Bolsa Família. ;Daí, não posso colocar uma outra pessoa.; Todo esse convencimento vem daquilo que viu, ouviu e aprendeu na televisão, principal fonte de informação e aliada na escolha dos políticos.
;Para a pobreza não teve melhor. Antes ninguém comprava nada. Agora tem o cartão da família e todo mundo pode fazer um feirinha;, defende a tia do presidente, Florência dos Santos Ferreira. Aos 62 anos, a senhora, vestida de vermelho e com os cabelos curtos desbotados pelo tempo, se escondia do frio de 18 graus dentro de casa. Já havia lavado vasilhas e roupas com a água gelada que pegou no reservatório de casa, o maior do povoado. ;Estamos ricos. Chegou energia e a água está mais perto;, conta, sem reclamar que ainda não tem encanamento.
É que há alguns anos a lamparina era a principal fonte de energia da casa e a caminhada até o açude mais próximo era diária. Na sala da casa, dois quadros dividem a atenção: o Sagrado Coração de Jesus e uma foto de Lula com o ex-prefeito da cidade, Zé da Luz. ;Ele é o orgulho da terra da gente;, resume a tia.