O projeto conhecido como Ficha Limpa impede candidaturas de pessoas que tiverem sido condenadas pela Justiça em decisão colegiada, que praticarem crimes de corrupção, abuso de poder econômico, homicídio e tráfico de drogas. O projeto também amplia os casos e o período de inelegibilidade, estabelecendo em oito anos o tempo em que o político fica impedido de se candidatar quando for condenado por crimes eleitorais, hediondos, contra o meio ambiente, racismo e outros.
Atualmente, a Lei Complementar 64/90, que estabelece casos de inelegibilidade, fixa prazos que variam de três a oito anos para impedir a eleição de pessoas condenadas pela Justiça. Pelo Ficha Limpa, o prazo geral fixado para inelegibilidade passa a ser de oito anos para todos os casos, contanto que a condenação do político tenha sido proferida por órgão colegiado da Justiça ou em decisão transitada em julgado (quando não pode mais haver recurso). Outra exigência para tornar o candidato inelegível é que o condenado receba pena de mais de dois anos de prisão, devido a situações nas quais houve dolo.
Aprovado sob a forma de substitutivo pela Câmara - de autoria do deputado José Eduardo Cardozo (PT-SP) -, o projeto original surgiu a partir da iniciativa popular, tendo recebido 1,6 milhões de assinaturas colhidas pelo Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral. Foi apresentado ao Congresso em setembro de 2009 e relatado inicialmente pelo deputado Índio da Costa (DEM-RJ), encarregado de emitir o parecer do grupo de trabalho criado pelo presidente da Câmara, Michel Temer, para examinar o assunto.
O substitutivo de Cardozo tomou como base esse texto de Costa, e também apensou outros nove projetos similares que tramitavam na Câmara, entre os quais o projeto de iniciativa popular, que tramitou como Projeto de Lei Complementar 518/09.
Principais itens do projeto:
Corrupção: Entre as novas causas de inelegibilidade, seja com sentença transitada em julgado ou condenação por colegiado, o projeto inclui o crime de corrupção eleitoral, inclusive compra de votos, prática de caixa dois ou conduta proibida em campanhas para os que já são agentes públicos. É necessário, entretanto, que o crime implique cassação do registro ou diploma, em julgamento na Justiça Eleitoral. Será declarada também inelegível a pessoa condenada com a suspensão dos direitos políticos por ato doloso de improbidade administrativa com lesão ao patrimônio público e enriquecimento ilícito.
Processo administrativo: A inelegibilidade também poderá ocorrer quando magistrados e integrantes do Ministério Público deixarem os cargos na pendência de processo administrativo. Serão ainda inelegíveis, salvo anulação ou suspensão do ato pela Justiça, os demitidos do serviço público devido a processo administrativo e os condenados por órgão profissional à perda do direito de trabalhar na área, em decorrência de infração ética ou profissional.
Efeito suspensivo: Segundo o substitutivo, o candidato poderá pedir que tenha efeito suspensivo o recurso que ele apresentar contra uma decisão colegiada. No entanto, isso dará mais rapidez ao processo, que terá prioridade de julgamento. Se o recurso for negado, será cancelado o registro da candidatura ou o diploma do eleito. Segundo Cardozo, o efeito suspensivo tem o objetivo de conciliar dois fatores: o desejo da sociedade de evitar que pessoas sem ficha limpa disputem cargos eletivos e o direito ao contraditório e à ampla defesa. O julgamento do recurso com efeito suspensivo só não terá prioridade sobre o julgamento de mandados de segurança e habeas corpus. O texto prevê também que a prática de atos pela defesa com a mera intenção de ganhar tempo (recursos protelatórios) provocará a revogação do efeito suspensivo. Quando o projeto virar lei, os recursos já apresentados contra a decisão de um colegiado poderão ganhar o efeito suspensivo com prioridade de julgamento, caso a defesa faça tal solicitação.
Renúncia: O projeto pune os políticos que renunciarem ao mandato para evitar abertura do processo de cassação, incluindo essa prática na Lei Complementar 64/90 como um dos motivos para tornar o político inelegível. Quem renunciar para não ser cassado, não poderá, portanto, se candidatar nas eleições seguintes. Essa norma vale para os titulares do Executivo e do Legislativo em todas as esferas (federal, estadual, distrital e municipal).
Cônjuges: A simulação de vínculo conjugal ou seu rompimento para burlar a inelegibilidade de parentes é outro caso a ser considerado como motivo de inelegibilidade. De acordo com a lei em vigor, já são proibidas as candidaturas de cônjuges para os cargos de prefeito, governador e presidente da República.
Doação ilegal: São declaradas inelegíveis as pessoas físicas ou os dirigentes de pessoas jurídicas condenadas por doações ilegais pela Justiça Eleitoral, em decisão de colegiado ou transitada em julgado.
Crimes dolosos: O texto também aumenta a lista de crimes que impedem a candidatura em processos iniciados por ação penal pública. Além daqueles contra a economia popular, a fé pública, a administração e o patrimônio públicos, são incluídos crimes contra o meio ambiente e a saúde pública, bem como crimes de lavagem de dinheiro, tráfico de drogas, prática de trabalho escravo e os delitos cometidos por organização criminosa ou quadrilha, entre outros. Quanto aos crimes de abuso de autoridade, a inelegibilidade ficou restrita aos casos em que o réu for condenado à perda do cargo ou ficar impedido de exercer função pública.
Contas rejeitadas: A inelegibilidade causada pela rejeição de contas por irregularidade incorrigível passará a ser condicionada aos casos em que isso seja considerado ato doloso de improbidade administrativa. Atualmente, a lei permite a candidatura se a Justiça estiver analisando o processo. O projeto Ficha Limpa é mais específico e permite a candidatura apenas se a decisão do Tribunal de Contas for suspensa ou anulada pela Justiça.
Colaboração: Os processos por abuso do poder econômico ou do poder de autoridade também terão prioridade no Ministério Público e na Justiça Eleitoral, exceto sobre os pedidos de habeas corpus e mandados de segurança. As polícias judiciárias, os órgãos de Receita, os Tribunais de Contas, o Banco Central e o Conselho de Atividade Financeira deverão ajudar a Justiça Eleitoral e o Ministério Público Eleitoral na apuração dos delitos relacionados às eleições, com prioridade sobre as demais atribuições.