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José Dirceu envia judicialmente oito perguntas a Lula em busca de subsídios para sua defesa

O ex-ministro José Dirceu (PT) quer a aprovação do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Em documento incluído no processo contra ele que corre no Supremo Tribunal Federal, o deputado cassado apresentou oito questões para Lula responder. Elas tratam dos papéis que Dirceu desempenhou na campanha presidencial de 2002, à frente da Casa Civil e internamente no Partido dos Trabalhadores.

O mais importante é que José Dirceu quer que Lula corrobore a versão de que ele não participou de qualquer negociação financeira na campanha de 2002. E, no específico, quer ouvir do titular do Planalto que não tratou do acordo entre PT e PL (hoje PR). Segundo o ex-presidente da legenda, deputado Valdemar Costa Neto (SP), o negócio foi fechado em R$ 10 milhões.

O ex-ministro quer o aval do presidente para reforçar sua tese de que não teve qualquer envolvimento no escândalo do mensalão e não fez negociata político-financeira com partidos, com o PT ou com o publicitário Duda Mendonça, responsável pela campanha de 2002 e réu no caso do mensalão.

Dirceu também pede para Lula afirmar se ele, ;enquanto exerceu o cargo de ministro-chefe da Casa Civil, administrava questões internas do PT;. Na pergunta de número quatro, questiona se o presidente pode afirmar se, como ministro, ;praticou algum ato indevido para beneficiar entidades privadas;, especificamente no que se refere a crédito consignado.

Um auxiliar do presidente ouvido pelo Correio leu o documento e disse que Lula não responderia a todas as perguntas. Achou descabido questionar o presidente sobre assuntos internos do PT. ;Essa pergunta é para o Genoino;, afirmou, citando o deputado José Genoino (1) (PT-SP), também réu no mensalão, que na época era o presidente da legenda.

Núcleo base
Dirceu, Genoino e o ex-tesoureiro Delúbio Soares são apontados pelo Ministério Público como o núcleo político do mensalão. Delúbio é considerado o operador do esquema por ter distribuído o dinheiro aos partidos aliados. Antes da eleição, segundo as investigações, houve uma reunião entre PT e PL para discutir o apoio, que só teria sido fechado graças ao compromisso de repassar R$ 10 milhões. Em depoimento à CPI dos Correios, em 2005, Valdemar disse que o repasse foi negociado com Delúbio e isentou o presidente Lula de qualquer participação. Sequer citou Dirceu. Depois, em entrevistas, o deputado do PL afirmou que Dirceu tratou pessoalmente do valor e disse que Lula soube do acordo financeiro. Se conseguir convencer o ministro Joaquim Barbosa de que essa negociata não teve o dedo do ex-ministro, a defesa do ex-ministro acredita que dará um passo importante para inocentá-lo.

Na avaliação do auxiliar do presidente, Dirceu deveria ter se limitado a três perguntas e não se alongar em questionamentos sobre se houve ilicitudes na votação das reformas (2) da Previdência e Tributária, como feito nos questionamentos de números cinco e seis, ou se há problemas em um ministro receber representantes de empresas privadas ou financeiras. A defesa termina o questionário perguntando se Lula conhece algum fato que desabone a pessoa de José Dirceu de Oliveira e Silva. Essa questão também foi classificada como subjetiva e desnecessária pela fonte ouvida pela reportagem.

O presidente ainda não respondeu as questões formuladas e encaminhadas pelo Ministério Público há cerca de três meses. As perguntas de Dirceu, elaboradas por sua defesa, estão dentro do processo cujo relator é o ministro do Supremo Joaquim Barbosa. Isso não significa que o presidente figure como testemunha de algum dos réus, especialmente de Dirceu. O deputado cassado Roberto Jefferson (PTB), que denunciou o mensalão, tem se recusado a enviar os questionamentos por entender que Lula deveria responder como acusado. O julgamento sobre se o presidente vira réu ou não estava marcado para quinta-feira da semana passada, mas foi adiado. Há uma expectativa dessa análise ficar para a próxima semana. Ministros têm dito que dificilmente isso ocorrerá, sustentando que o próprio Ministério Público não incluiu Lula na denúncia.

Procurada, a assessoria de imprensa de Dirceu informou que ele prefere se manifestar sobre a ação penal somente perante o Supremo Tribunal Federal.

1 - Renúncia à Presidência
No processo do mensalão, José Genoino foi denunciado por corrupção. Ele é acusado de negociar o pagamento a parlamentares da base aliada do governo Lula em troca de apoio político em votações importantes para o Executivo. Como consequência das denúncias, renunciou à Presidência do partido. Tempos depois, elegeu-se deputado federal.

2 - Repasses e votações
Durante a CPI dos Correios, a oposição elaborou um gráfico que tentava coincidir os saques de agências bancárias em Brasília por deputados e assessores com votações importantes do governo, como as reformas da Previdência e Tributária. Os governistas rechaçam qualquer vinculação e negam que os repasses a partidos aliados tenham sido motivados pelas votações. O dinheiro serviu, na versão do PT, para saldar dívidas de campanha através de caixa dois.

; Memória
Recompensa aos partidos fiéis


O acordo entre o PT e o PL só foi efetivado porque os petistas se comprometeram a repassar R$ 10 milhões aos cofres da legenda aliada, segundo a versão do então presidente da legenda e deputado Valdemar Costa Neto (PR-SP). Esse valor, de acordo com ele, jamais foi pago integralmente. Durante o governo, o tesoureiro do PT, Delúbio Soares, repassou em prestações um total de R$ 6,5 milhões, que Valdemar admite ter recebido. O Partido dos Trabalhadores também pagou ao PTB, de Roberto Jefferson, que reconheceu que embolsou R$ 4 milhões.

Segundo Delúbio, depois da vitória de Lula, o PT acumulou dívidas imensas e difíceis de serem quitadas. Foi quando teria aparecido um facilitador, o empresário Marcos Valério de Souza, que abriu as portas financeiras de bancos de conhecidos dele, pegando empréstimos em nome de suas agências de publicidade SMPB e DNA Propaganda e repassando ao partido aliado.

Nessa época, os envolvidos contam que o PT vivia em bonança; deputados e assessores se revezavam para sacar dinheiro, dívidas eram quitadas sem pestanejar. O complicador do esquema é a suspeita de fraude em fundos de pensão para desviar recursos ao esquema. O segundo problema é que dinheiro público teria irrigado os caixas do escândalo. O Banco do Brasil, que administra o fundo da Visanet, antecipou pagamento de R$ 23,3 milhões para a DNA Propaganda, de Marcos Valério, por um serviço que suspeita-se não ter sido realizado.