Nos corredores do Congresso, frequentemente se podem observar grupos de congressistas em clima de festa, cercados de convidados que representam setores específicos da sociedade, fazendo discursos acalorados em defesa de diferentes temas. Trata-se da liturgia em torno do nascimento das frentes parlamentares(1). Criadas a todo momento, elas deveriam servir para que assuntos polêmicos fossem debatidos e legisladores fizessem o acompanhamento periódico da tramitação de projetos. Na prática, no entanto, não é o que acontece.
Os grupos se formam diante de eventos e muito barulho, conseguem espaço na mídia, mas pouco ou nada fazem depois que os holofotes se apagam. Lucro mesmo, somente para os próprios integrantes desses aglomerados, que conseguem colocar no currículo político a marca de defensores do tema e colhem frutos eleitorais.
Em 2009, foram criadas 19 dessas frentes. A maioria delas, no entanto, não realizou mais do que dois encontros, segundo levantamento de técnicos da Câmara. Desde 2007, as publicações com a criação desses grupos somam 92. Em 2008, por exemplo, foi lançada a Frente Parlamentar em Defesa do Centro Espacial de Alcântara, por iniciativa do deputado Ribamar Alves (PSB-MA).
Em seu lançamento, reuniu os ministros de Minas e Energia, Edison Lobão, que também é maranhense, e de Ciência e Tecnologia, Sérgio Rezende, sem contar o então governador do Maranhão Jackson Lago (PDT). Depois da festa de lançamento, não se teve mais notícia de outros eventos da frente.
Além das mais diversas explicações para a falta de reuniões e de uma agenda efetiva em defesa dos assuntos tratados, os parlamentares demonstram desconhecimento sobre o trabalho e a existência de grupos semelhantes criados anteriormente. Na intenção de estabelecerem relações mais estreitas com determinados setores, chegam até a repetir a finalidade e o assunto de frentes já em funcionamento.
Este ano, por exemplo, o Congresso criou a Frente Parlamentar Voltada para a Modalidade de Educação Profissional e Tecnológica, a Modalidade de Educação a Distância e Novas Tecnologias. Liderada pelo deputado Alex Canziani (PTB-PR), o aglomerado de parlamentares se propõe a discutir tema semelhante ao da Frente Parlamentar do Ensino a Distância, criada em agosto de 2008 e coordenada pelo deputado Ricardo Barros (PP-PR).
Objetivo igual também existe entre a Frente Parlamentar Mista em Defesa da Vida e Contra o Aborto, oficializada em agosto de 2007, e a Frente Parlamentar Contra a Legalização do Aborto e pelo Direito à Vida, cuja criação foi publicada quatro meses antes. Pelo menos teoricamente, ambas estão em funcionamento.
Desencontros
Além das repetições de temas, a falta de reuniões e discussões dá uma prova de que a intenção dos grupos passa, muitas vezes, mais pela necessidade de fazer lobby a favor de um tema específico do que pela intenção real de trabalhar e legislar sobre os assuntos.
;Participamos de audiências em ministérios representando os produtores de leite. Não é preciso reunião oficial para fazer o nosso trabalho. Nossa atuação é de bastidor mesmo;, comenta o deputado Antonio Andrade (PMDB-MG), que preside a Frente Parlamentar da Cadeia Produtiva do Leite.
;As frentes realizam um trabalho mais interno e menos de relação com a sociedade. Por isso, não aparecem tanto. Mas participamos de audiências com os órgãos do governo representando setores específicos e discutimos com os ministérios propostas para esses setores;, completa o deputado Ricardo Barros (PP-PR), que preside dois grupos em funcionamento.
Na intenção de divulgar o trabalho realizado, duas das frentes criaram páginas de internet e atualizam frequentemente as notícias sobre suas atuações: a Frente Parlamentar da Leitura e a Frente Parlamentar em Defesa do Trânsito Seguro. Os demais grupos, no entanto, trabalham de forma discreta e as informações sobre o que realizam e como realmente atuam os parlamentares a favor dos setores dificilmente se tornam públicas.
1 - O que são
As frentes parlamentares são associações suprapartidárias de pelo menos um terço dos integrantes do Poder Legislativo Federal destinadas a aprimorar a legislação referente a um tema específico. As frentes parlamentares estão regulamentadas pelo ato 69/05, da Mesa Diretora. Toda frente tem um representante oficial. Pelas regras de criação desses grupos, elas podem utilizar o espaço físico da Câmara, desde que suas atividades não interfiram no andamento dos outros trabalhos da Casa e não impliquem em contratação de pessoal nem fornecimento de passagens aéreas.
O número
92 - Número de frentes criadas no Congresso desde 2007