O presidente da Comissão de Constituição e Justiça, Demostenes Torres (DEM-GO), disse que pretende formar um grupo de parlamentares para fazer uma devassa nas contas do Senado. O objetivo é evitar que eles sejam surpreendidos pelos seguidos escândalos de farra com o dinheiro público, como a que permitiu o uso da cota aérea acumulada(1) em 2009 em viagens durante o período de campanha eleitoral este ano.
Demostenes quer convidar os senadores Francisco Dornelles (PP-RJ), Tasso Jereissati (PSDB-CE), Pedro Simon (PMDB-RS), Eduardo Suplicy (PT-SP) e o líder do PT, Aloizio Mercadante (PT-SP), todos titulares da comissão. ;Do jeito que está, a cada dia nós somos surpreendidos por algo novo;, afirmou Demostenes. Ele já tinha previsto criar uma comissão similar no final do ano passado para analisar a reforma administrativa.
O problema é que medidas anunciadas para combater as irregularidades na Casa são sempre reativas e demoram a sair do papel. A reforma administrativa do Senado, por exemplo, sequer está em vigor. Contratada por R$250 mil para cumprir a tarefa, a Fundação Getulio Vargas apresentou três propostas da reforma. Mesmo numa ideia para moralizar, o Senado tentou encontrar uma brecha para aumentar despesas. A última versão das mudanças apareceu com 1.200 funções comissionadas, o triplo do original.
Essa tentativa de moralização ainda depende de transparência, na avaliação de senadores. Esse é um fator, por exemplo, que levou o senador Renato Casagrande (PSB-ES), presidente da Comissão de Fiscalização e Controle, a demonstrar ceticismo com uma profunda mudança no Senado. Segundo ele, só a pressão da opinião pública pode alterar o rumo da Casa. A burocracia do Legislativo, a falta de compromisso dos parlamentares e a pressão dos servidores são fatores que dificultam maior controle dos gastos, ponderou o senador.
Os próprios senadores demonstram pouca vontade até com a proposta da CCJ. O segundo secretário do Senado, João Vicente Claudino (PTB-PI), disse que a Comissão terá seu foco desviado. ;É um erro colocar uma função administrativa e tirar a função primordial dela, que é a análise constitucional;, disse.
[SAIBAMAIS]Não bastasse a má vontade com a iniciativa, há senadores que enxergam no mais recente escândalo um ;suspiro da crise;, como disse o senador capixaba. Esse novo desgaste com a opinião pública, avaliou, terá pouco efeito prático no ano eleitoral. ;Isso mostra o quanto o Senado ainda tem que mudar, porque a renovação da validade dos créditos não tem quase efeito nenhum.;
Nessa tentativa de minimizar o escândalo, os senadores chegam a apelar. Admitem até que Brasília ficará às moscas durante a campanha eleitoral. O senador Álvaro Dias (PSDB-PR) disse que haverá uma queda dos gastos com passagens em 2010. Isso porque os candidatos à reeleição no Senado estarão empenhados em garantir votos na base eleitoral e farão menos viagens à capital federal para o trabalho legislativo. ;A utilização acaba sendo menor porque vamos ter parlamentares em campanha que vão fazer menos viagens a Brasília;, disse o tucano. Ele esqueceu, no entanto, que a cota aérea pode ser usada em qualquer trecho, desde que se apresente como ;desculpa; a tarefa parlamentar.
1 - Trechos
Os senadores têm direito a uma verba aérea que corresponde a cinco trechos para ir da capital do estado de origem a Brasília e voltar. Por ano, são 60 bilhetes. O Senado divulgou que o total gasto pelos senadores com passagem em 2009 foi R$ 9,4 milhões. Levantamento do Correio no sistema de acompanhamento de gastos do Senado mostra que com todas as passagens nacionais, não só a despesa com os parlamentares, o gasto foi de R$ 12,5 milhões, em 2009.
E EU COM ISSO?
O novo escândalo no Senado mostra como é mal tratado o dinheiro público pelos parlamentares. A partir de impostos, você paga para que o Congresso funcione e deveria receber em troca um serviço de qualidade do Congresso. Mas ocorre o contrário. Em ano eleitoral, a principal preocupação dos parlamentares é a campanha ; a votação de matérias relevantes fica em segundo plano.