Jornal Correio Braziliense

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Sobra dos bilhetes aéreos não utilizados no ano passado chega a R$ 2 milhões

Valor daria para senadores comprarem 14 idas e voltas Porto Alegre-Macapá

A vida é uma festa quando se trata da rotina dos senadores. A liberação do uso do saldo da cota aérea acumulada vai proporcionar uma verdadeira farra aos parlamentares neste ano de eleição. Há uma sobra de quase R$ 2 milhões que não foi usada em 2009 e pode ser despejada agora. Com esse valor, cada um dos 81 senadores poderá comprar 14 viagens ida e volta de Porto Alegre a Macapá, atravessando o país num percurso que dura cerca de 8 horas.

Os senadores têm direito a uma verba aérea que corresponde a cinco trechos para ir da capital do estado de origem a Brasília e voltar. Por ano, são 60 bilhetes. Em pleno calor eleitoral, não é nada mau acrescentar quase 25% nesse total. As 14 passagens aéreas foram calculadas levando em conta uma tarifa média de R$ 1.720 para ir e voltar, numa consulta nas duas principais empresas aéreas brasileiras para uma viagem de última hora.

No preço mais caro, é possível comprar de cinco a 11 passagens, dependendo da companhia, para ir e voltar nesse mesmo trecho. Para uma viagem comum dos parlamentares entre Brasília e Rio de Janeiro, é possível comprar entre 12 e 24 idas e voltas, na tarifa cheia também de última hora, levando em conta os valores oferecidos pelas empresas. Na média dos preços, são 30 bilhetes a mais por ano para cada um dos 81 senadores para ir e voltar ao Rio partindo de Brasília.

O R$ 1,969 milhão entrou no Orçamento como restos a pagar, que são os valores empenhados, ainda no ano passado, para serem pagos em 2010. A informação foi confirmada por fontes da Diretoria-Geral. O Senado divulgou ontem que o valor total gasto pelos senadores com passagem em 2009 foi de R$ 9,4 milhões. No ano anterior, a despesa chegou a R$ 18,2 milhões. Levantamento do Correio no sistema de acompanhamento de gastos do Senado mostra que com todas as passagens nacionais, não só a despesa com os parlamentares, o gasto foi de R$ 12,5 milhões em 2009.

Até abril do ano passado, era possível gastar a cota da maneira que cada parlamentar quisesse. Tanto que a desordem levou ao escândalo da farra aérea. No auge, descobriu-se que deputados e senadores usavam dinheiro público para comprar bilhetes para qualquer canto do mundo para namoradas, sogras, amigos, atores e políticos aliados. Hoje, o benefício está restrito aos senadores e a assessores do gabinete só dentro do território nacional.

Apagar das luzes
Mas uma decisão no apagar das luzes do Senado, revelada pelo Correio na terça-feira, reverteu parte da moralização. Nos últimos dias do ano, a Mesa Diretora decidiu, na surdina, permitir que o valor acumulado ao longo dos anos seja utilizado em 2010. A proposta teria sido tomada para evitar que as empresas aéreas embolsassem o dinheiro dos créditos já emitidos sem prestar o serviço. O primeiro-secretário, Heráclito Fortes (DEM-PI), negou qualquer ligação eleitoral com a medida.

Uma medida que não tem padrinho. Até agora não apareceu quem patrocinou a bondade. Senadores da Mesa Diretora informaram que a decisão foi tomada em conjunto após um cálculo apresentado pela Segunda Secretaria, ocupada pelo senador João Vicente Claudino (PTB-PI). Ele informou que sequer participou da reunião que decidiu sobre o recuo na moralização. E disse ter sido pego de surpresa. Quando tentei anular meus créditos me disseram que havia esse ato, afirmou. Apesar disso, afirmou ser contra o excesso de restrições. Ele defende que os suplentes, que não estão no exercício do mandato, tenham uma parte da cota. Enquanto alguns apoiam menos restrições, a Mesa Diretora do Senado estuda reduzir o valor da verba de transporte aéreo levando em conta os 30% gastos a menos.

Num recuo da liberação total do ato que anulou parte das medidas moralizadores, os senadores da cúpula política da Casa estudam também estipular um prazo para o gasto do saldo acumulado. A ideia é permitir que a cota dos anos anteriores seja utilizada até junho, um mês antes do início da campanha. Isso seria uma resposta à polêmica de que haverá vantagem aos senadores que disputarão a eleição. No pleito de outubro, 54, ou dois terços das 81 cadeiras da Casa, estarão em jogo.

Confirmação de gastos
O Senado confirmou, como antecipou o Correio na terça, que pagou quase R$ 4 milhões em horas extras para os servidores num momento que a Casa está de recesso. Houve um aumento de R$ 83,9 milhões, em 2008, para R$ 87,6% milhões, no ano passado. Para tentar amainar os dados, o Senado limitou-se a dizer que houve uma queda de 35% no número de servidores que receberam horas extras no ano passado. Esse número é descartável levando em conta que o que vale é o custo para os cofres públicos.