Mais novo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), José Antonio Dias Toffoli tomou posse ontem sem que haja um consenso, entre os colegas, sobre o caso do ex-ativista italiano Cesare Battisti. A incerteza na Corte é em relação à situação de Toffoli no julgamento. Ainda não se sabe se ele vai poder votar no julgamento do pedido de extradição de Battisti - o que pode ser decisivo para encerrar o imbróglio. O processo de extradição começou a ser discutido em 9 de setembro e foi interrompido por um pedido de vista. O placar está em 4 a 3 pela volta do italiano à Europa.
O presidente da Corte, Gilmar Mendes, deixou claro que ainda não há uma decisão sobre a polêmica. "Não temos um juízo sobre essa questão (se Toffoli vai votar ou não). Temos que fazer uma avaliação interna", disse Mendes, logo após a solenidade de posse. Em 30 de setembro, Toffoli admitiu a possibilidade de votar no processo. Durante sabatina na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado, ele afirmou que não estaria impedido de se manifestar porque não se manifestou sobre o caso quando estava à frente da Advocacia-Geral da União (1). Na ocasião, ele ponderou, no entanto, que ouviria os colegas para tomar uma decisão.
Ontem, Toffoli não comentou o assunto. Logo após tomar posse, em uma rápida cerimônia que contou com a presença do presidente Lula, de governadores e de políticos, limitou-se a falar sobre as novas atribuições. "A vida de magistrado é voltada à nação brasileira, ao serviço público, ao povo brasileiro, tendo em conta a função da Suprema Corte, que é a de guardar a Constituição. É dessa forma que irei trabalhar, com muita vontade, com parâmetro na Constituição brasileira e sempre em defesa daqueles elementos que são essenciais para a pessoa: a vida, a liberdade e o seu patrimônio", afirmou o ex-advogado-geral da União.
Empate
O julgamento sobre o futuro de Battisti deve ser retomado em breve. O ministro Marco Aurélio Mello prometeu entregar seu voto na próxima semana. Foi ele que pediu vista do processo. A tendência é que mantenha o posicionamento exposto no plenário quando a ação entrou em pauta pela primeira vez - ele sinalizou ser contrário à extradição do ex-ativista italiano. Se Toffoli entrar na discussão, poderá definir a situação de Battisti.
Além de Marco Aurélio, o presidente do STF ainda não votou. Se confirmada a expectativa de que Mendes defenda a extradição de Battisti e Toffoli, a permanência dele no Brasil, haveria um empate. Nesse caso, há uma grande chance de o tribunal adotar procedimento semelhante ao julgamento de habeas corpus: o réu é beneficiado quando há empate. Em outras palavras, as chances de permanência de Battisti no Brasil aumentam se o novo ministro votar contra a extradição.
Impasse
Cesare Battisti, 54 anos, tornou-se pivô de um impasse que coloca Brasil e Itália em lados opostos. Condenado à prisão perpétua no país de origem, foi considerado refugiado político pelo governo brasileiro em janeiro. Desde então, a Itália trava uma batalha pela extradição.
Líder de uma organização extremista batizada de Proletários Armados pelo Comunismo (PAC), que fazia oposição ao governo italiano na década de 1970, Battisti foi condenado por quatro homicídios ocorridos entre 1978 e 1979. O julgamento terminou em 1993, mas o ex-ativista nunca cumpriu pena. Fugiu para a França, onde viveu até 2004, quando o então presidente do país, Jacques Chirac, se posicionou favoravelmente à extradição. O italiano fugiu novamente e veio parar no Brasil, onde a legislação proíbe a extradição de condenados por crimes políticos. Em março de 2007, Battisti foi preso no Rio de Janeiro e transferido para Brasília. O ex-ativista nega a autoria dos crimes e afirma ser vítima de perseguição política.
1 - Política
José Antonio Dias Toffoli começou ontem uma nova fase em sua carreira. Ele passa a ocupar uma das 11 cadeiras da mais alta Corte de Justiça do país com apenas 41 anos. Antes da função, o agora ministro Dias Toffoli atuou nas últimas três campanhas presidenciais do presidente Lula. O último cargo foi o comando da Advocacia-Geral da União (AGU). O comando do órgão passou às mãos de Luís Inácio Adams, ex-procurador da Fazenda Nacional
Críticas de todos os lados
Daniel Pereira
Se José Antonio Dias Toffoli é um petista de carteirinha, como repetem caciques da oposição, o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Gilmar Mendes, atuaria afinado politicamente com o PSDB. É o que dizem ministros próximos ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Em conversas reservadas, eles criticam Mendes por ter sugerido que as viagens realizadas por Lula e a ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, para vistoriar e inaugurar obras desrespeitam a legislação eleitoral. "Admiro-o pela coragem de defender as ideias dele, mesmo quando polêmicas. Agora, o ministro Gilmar Mendes verbaliza com muita facilidade os sentimentos da oposição", diz um dos auxiliares mais influentes do presidente da República.
Ex-advogado-geral da União, Mendes foi indicado ao Supremo em 2002, último ano do governo Fernando Henrique Cardoso. No comando do tribunal, colecionou rusgas com o Palácio do Planalto. Por exemplo: ao criticar a atuação da Polícia Federal, seja pela espetaculização das ações, seja pelo vazamento de grampos telefônicos. Na semana passada, o ministro declarou que a Justiça Eleitoral deveria analisar o tour de três dias de Lula e Dilma, pré-candidata à Presidência, pelas obras do Rio São Francisco. "Estão testando a Justiça Eleitoral e o Ministério Público Eleitoral. Nem o mais cândido dos ingênuos acredita que isso é fiscalização de obras", disse Mendes. Oposicionistas e governistas reagiram de forma diferente à declaração.
No dia seguinte, PSDB, DEM e PPS recorreram ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) contra a suposta campanha antecipada de Dilma. Já Lula preferiu não polemizar com o presidente do STF. Sem mencioná-lo, afirmou apenas que continuaria a percorrer o país. Sempre com a ministra a tiracolo, sob o pretexto de checar o andamento do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e do Minha Casa, Minha Vida, cuja meta é construir um milhão de moradias populares. "Vai ter um absurdo de inaugurações em 2010. O presidente voltará ao São Francisco em março", declara um ministro.
Desde o início de 2009, o governo trabalha a fim de garantir investimentos pesados em infraestrutura no próximo ano, quando será disputa a sucessão presidencial. Nesta semana, por exemplo, incluiu o Minha Casa, Minha Vida no PAC. Com a medida, assegurou que cerca de R$ 30 bilhões dos dois programas fiquem de fora do cálculo do superávit primário - a economia realizada para o pagamento de juros da dívida - e possam ser desembolsados sem desembaraço no ano que vem.