Uma decisão do Tribunal de Contas da União (TCU) permite o acúmulo de aposentadorias do serviço público com salários de parlamentares além do limite do teto constitucional definido pelo Supremo Tribunal Federal (STF): R$ 25,7 mil. A decisão mantém o teto como regra geral, mas diz que a sua implementação, no caso de servidores de esferas de governo ou poderes distintos, depende da regulamentação da Constituição e da criação de um sistema nacional de dados sobre remunerações de ativos e inativos, com informações da União, dos estados e dos municípios, algo que não tem prazo previsto para entrar em funcionamento. Estima-se que poderão ser beneficiados pela decisão do tribunal dezenas de parlamentares do Congresso. Entre eles, os presidentes da Câmara, Michel Temer (PMDB-SP), e do Senado, José Sarney (PMDB-AP).
Temer é aposentado como procurador do estado de São Paulo, enquanto Sarney tem dupla aposentadoria: como ex-governador e funcionário do Tribunal de Justiça do Maranhão. O presidente do TCU, Ubiratan Aguiar, e o relator do processo que define a aplicação do teto constitucional, Augusto Nardes, são aposentados como ex-parlamentares, mas já sofrem o corte dos vencimentos excedentes a partir do limite de R$ 25,7 mil, porque as duas fontes pagadoras (Câmara e TCU) integram o mesmo Poder e estão na mesma esfera de governo.
A decisão foi tomada pelo tribunal em resposta a uma consulta feita pela Câmara. O TCU havia decidido, inicialmente, que deveria ser respeitado como limite para remuneração, em caso de acúmulo com aposentadoria, o salário dos ministros do STF. O diretor-geral da Câmara, Sérgio Sampaio, e o presidente da Comissão de Turismo, Afonso Hamm (PP-RS), apresentaram recurso em julho deste ano contestando a decisão. Na última quarta-feira, o ministro Augusto Nardes emitiu um parecer, aprovado pelo plenário, que cria a regra transitória.
No relatório, o ministro expôs a dificuldade de aplicação do teto constitucional: ;Devo reconhecer as dificuldades operacionais que estão a afligir diversos outros órgãos federais para fazer incidir adequadamente o teto constitucional, especificamente quando se trata de servidores cujos pagamentos têm origens em órgãos, governos e/ou poderes distintos;. O presidente em exercício do TCU, Benjamin Zymler, explicou assim a decisão do tribunal: ;Se, no limite, a gente considerasse que todos esses casos estariam abrangidos pelo Artigo 37, nós chamaríamos essa norma de eficácia contida, porque faltam as regras de implementação do artigo terceiro da Lei 10.887/2004 (leia quadro).
Dúvidas
Zymler tentou desfazer algumas dúvidas geradas pela decisão. ;O Artigo 37 estabelece o teto constitucional de forma abrangente. Vale para aposentadorias, pensões e vencimentos. O tribunal disse que esse teto vale para proventos de aposentadoria de magistrados que sejam deputados federais. Essa é a regra geral. Agora, existe uma lei que estabelece algumas medidas, pressupostos para operacionalizar a incidência do teto para o caso de proventos somados com remuneração de inativos. É o Artigo 3; da Lei 10.887/2004;, explicou o ministro.
Ele acrescentou: ;Qual é o grande problema? Se você tiver alguém recebendo, por exemplo, aposentadoria do estado de São Paulo com a remuneração de deputado, pela União, quem vai fazer o abatimento, como vai ser a questão tributária, o Imposto de Renda, a questão previdenciária? A pessoa pode fazer uma opção por onde receber? Então, é preciso um banco de dados nacional, um sistema integrado de dados, que permita operacionalizar o artigo 37. Isso é algo que depende de uma ação integrada de todos os níveis de governo;.
Outra dúvida surgida é se a decisão vale para qualquer tipo de aposentadoria ou apenas para magistrados. Zymler entende que terá que ser analisado caso a caso: ;A resposta do tribunal foi em relação a magistrados. O tribunal se expressa pelas suas decisões. Tudo o que não for decisão do tribunal é opinião. Eu teria que avaliar algum tipo de peculiaridade do procurador, mas acho que isso é um problema geral, para todos os aposentados. Depende de uma avaliação caso a caso;.
O presidente em exercício foi questionado sobre a situação de um aposentado de um tribunal de justiça de um estado, caso do presidente Sarney. ;O TCU não disse isso no acórdão, mas, se você perguntar minha opinião como pessoa física, sim, valeria. O Artigo 37 é abrangente. Fala do somatório de qualquer provento, vindo do regime previdenciário público com a remuneração pelo serviço ativo.;
As decisões do TCU
Regra geral
O magistrado inativo, eleito para o Congresso Nacional, poderá receber a remuneração da aposentadoria somada à do cargo eletivo, desde que seja respeitado o limite fixado para os salários dos ministros do Supremo Tribunal Federal: R$ 25,7 mil.
Regra transitória
Quando há acumulação de cargos em diferentes esferas de governo ou de poderes, a definição do teto levará em conta dois dispositivos. O primeiro depende da criação de um sistema integrado de remunerações envolvendo União, estados, municípios e o DF. Tal ferramenta está prevista no art. 3; da Lei n; 10.887/2004. Além disso, é necessário criar um padrão, por meio de normatização infraconstitucional suplementar, para determinar a qual teto aplicar o limite e de quem seria a responsabilidade pelo corte de valores excedentes. A mesma norma indicaria qual a proporção do abate nas diferentes fontes, o destino dos recursos decorrentes da redução dos ganhos e se haveria possibilidade de o próprio funcionário optar pela fonte de onde cortaria o salário que superou o teto previsto.