Os gritos da comunidade de Manguinhos, no Rio de Janeiro, a favor da permanência do presidente Lula no cargo mostraram o que os petistas já desconfiavam: o debate sobre a possibilidade de abrir uma brecha para o terceiro mandato tem confundido a população sobre o candidato do PT e dificultado a decolagem da candidatura da ministra Dilma Rousseff. Para tentar evitar futuros estragos, os petistas vão articular uma verdadeira ofensiva para que a base aliada enterre de vez a questão. Terão dificuldades. O peemedebista Jackson Barreto (SE), que teve sua Proposta de Emenda Constitucional devolvida depois que a oposição retirou as 15 assinaturas, promete fazer uma nova coleta e reapresentar a matéria. Barreto é incentivado pelo lÃder da legenda, Henrique Eduardo Alves (RN), que em várias ocasiões já afirmou ser um defensor da tese, apesar de publicamente dizer que o debate somente pode prosseguir se tiver o aval do atual presidente.
Barreto insiste que o tema deve ser discutido mesmo contra a vontade de Lula porque diz respeito também à possibilidade de governadores e prefeitos terem direito a duas reeleições consecutivas. ;Não é um caso isolado. Se o presidente não quer, que não seja o candidato. O que não podemos é ignorar a necessidade de debater esse assunto. Nosso objetivo não tem nada a ver com ajudar ou enfraquecer a Dilma;, diz. O PT, por sua vez, argumenta que o debate é uma pauta da oposição e interessa apenas aos que tentam atrapalhar a candidatura da ministra Dilma. ;Acho que isso é um absurdo. Integrantes da base não deveriam insistir nisso porque só atrapalha os planos do nosso partido. Acho que é pura pirotecnia de ambos os lados. Quem apresenta a matéria quer aparecer. A oposição, por sua vez, insiste que somos a favor da tese para confundir as pessoas;, comenta o deputado Devanir Ribeiro (PT-SP), um dos vice-lÃderes do seu partido.
Ofensiva
A pedido do diretório, os parlamentares petistas ; principalmente os 54 que na semana passada assinaram o manifesto reafirmando a candidatura da ministra Dilma ; vão receber a missão de convencer os colegas a trabalharem para abortar as manifestações a favor do terceiro mandato. A ideia é tentar convencer integrantes da base que ensaiam alianças com o PT para 2010 de que não há tempo para aprovar a matéria. Além disso, devem ressaltar as poucas chances de a proposta ser aprovada no Senado e dizer que o partido, atendendo ao presidente Lula, não deve mesmo estudar um plano alternativo à candidatura da ministra Dilma.
Das 183 assinaturas de apoio ao projeto de Barreto, 31 eram de petistas. A esmagadora maioria, 46, era de integrantes do PMDB. Em reuniões reservadas, os peemedebistas convergem na ideia de que é preciso garantir a possibilidade do presidente Lula se re-reeleger para o caso de a ministra Dilma não ter saúde para enfrentar uma campanha eleitoral. Ao PMDB não interessa correr o risco de deixar o poder e entrar em uma aliança sem chances de vitória.
As assinaturas de apoio à PEC do terceiro mandato incluÃram também oposicionistas: cinco tucanos e dez democratas. Treze deles desistiram de apoiar a matéria depois das pressões das lideranças. As justificativas para tentar explicar o porquê de apoiarem a matéria foram as mais diversas. A maioria disse que assinou sem saber qual era o verdadeiro conteúdo da PEC. Walter Ihoshi (DEM-SP) foi além e disse que não sabe como seu nome foi parar na lista de apoiadores. ;Fiquei perplexo ao ver meu nome na lista. Nunca assinaria tal documento em sã consciência;, disse. Para a próxima semana, Jackson Barreto precisa de mais cinco assinaturas.
CrÃticas no Supremo
Mirella D;Elia
Na cúpula do Poder Judiciário, a possibilidade de o Congresso aprovar uma mudança na Constituição para proporcionar um terceiro mandato ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva não é vista com bons olhos por alguns ministros e suscita polêmica. O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Gilmar Mendes, já se posicionou publicamente contra a ideia. ;É notório que essa proposta está sendo colocada num quadro de casuÃsmo;, reafirmou Mendes ao Correio (leia ponto crÃtico na página ao lado). Outro magistrado que já atacou abertamente a tese é o presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Carlos Ayres Britto, também integrante do Supremo. Recentemente, o ministro chegou a declarar que o terceiro mandato fragiliza o sistema republicano e reaproxima o Brasil da monarquia.
Ainda que pareça remota no atual cenário, a mudança, se concretizada, pode ser anulada pelo próprio STF. Uma das hipóteses é de que a oposição questione, em uma ação direta de inconstitucionalidade (Adin), princÃpios constitucionais como o da isonomia no processo eleitoral. Esse foi um dos argumentos usados pelo PT, pelo PDT, pelo PCdoB e pelo então PL (hoje PR) para pedir a anulação da emenda constitucional da reeleição, aprovada em 1997, na gestão do então presidente Fernando Henrique Cardoso. Em março de 1998, o tribunal negou uma liminar pedida pelas legendas. Mas a ação não foi julgada em definitivo até hoje. De lá para cá, o perfil do STF mudou radicalmente. Dos 11 ministros da atual composição, apenas dois permanecem na Corte: Marco Aurélio Mello e Celso de Mello.
Ponto crÃtico
Você é a favor do terceiro mandato?
SIM
Jackson Barreto, autor da pec da nova reeleição