A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) entende que a polÃcia do Senado não tem prerrogativa para abrir inquéritos e conduzir investigações. Ontem, em reunião do Colégio de Presidentes de Seccionais, a entidade afirmou que cabe à PolÃcia Federal apurar as denúncias de corrupção na área administrativa da Casa. Para o diretor do Conselho Federal da Ordem, Ophir Cavalcante Júnior, a apuração do Senado pode até representar uma resposta polÃtica, mas não tem respaldo jurÃdico.
A cúpula do Senado deixou a PF de fora e colocou sua própria polÃcia para investigar as supostas irregularidades no crédito consignado oferecido aos servidores. Caberá também a ela apurar as supostas fraudes na contratação de terceirizados. Ao optar por essa estratégia, a direção do Senado mantém a apuração sob rédea curta. Até porque parte das denúncias atingem em cheio a Primeira-Secretaria, comandada nos últimos anos pelos senadores Efraim Morais (DEM-PB) e Romeu Tuma (PTB-SP).
Em sete anos de constituição, a polÃcia da Casa nunca criou problemas para senadores ou servidores do alto escalão, mesmo quando acionada em escândalos como o que se envolveu o ex-presidente Renan Calheiros (PDMB-AL). Pelo contrário, foi acusada de tentar abafar o testemunho de um segurança que presenciou retiradas de documentos da sala do ex-diretor-geral Agaciel Maia nos dias anteriores à Operação Mão-de-Obra, ação conjunta da PF e do Ministério Público que tinha como alvos irregularidades em contratos com prestadoras de serviço.
No encontro da OAB, os presidentes regionais da entidade afirmaram que a Constituição definiu que só as polÃcias Civil e Federal são consideradas polÃcias judiciárias dos estados e da União, respectivamente. Com isso, só elas têm poder de investigar. ;A legislação deu ao Senado a possibilidade de criar sua própria corporação, mas não a prerrogativa para abrir inquérito. O inquérito não tem validade, já que só há duas polÃcias judiciárias no paÃs;, ressalta Ophir Cavalcante, diretor da OAB nacional. ;Qualquer investigação da PolÃcia Legislativa seria inconstitucional e poderia ser anulada;, acrescenta.
O entendimento dos advogados é referendado pelo presidente da Associação Nacional dos Delegados da PF (ANDPF), Sandro Avelar, que também usa a Constituição para questionar o poder dado à PolÃcia Legislativa. ;Existe a necessidade de se definir as atribuições;, afirma.
É a também Constiuição que serve de argumento para quem defende a PolÃcia Legislativa. ;Está na Constituição: compete ao Senado (e à Câmara) dispor, entre outras matérias, sobre sua polÃcia;, afirmou o diretor da PolÃcia do Senado, Pedro Ricardo Araújo Carvalho. O advogado-geral da Casa, Luiz Fernando Bandeira de Mello, lembrou que anteontem foi publicado acórdão do Tribunal Regional Federal da 1ª Região em que a competência da polÃcia do Senado para conduzir inquéritos foi reafirmada. Vandir Lima, vice-presidente da Associação da PolÃcia do Congresso, ressaltou que a PolÃcia Legislativa ;é fruto do princÃpio da isonomia entre os poderes constituÃdos;.
Chapa fria no almoço
Entre as ferramentas que dispõe para conduzir investigações, a PolÃcia do Senado conta até com carro chapa fria ; um Ford Fiesta, placa JKQ 5171 (DF). Ontem, o Correio flagrou o veÃculo nas ruas de BrasÃlia. Estava estacionado na comercial da 405 Norte, na hora do almoço, à disposição de Pedro Ricardo Araújo Carvalho, diretor da polÃcia da Casa. Mais tarde, no Senado, Carvalho explicou que o Fiesta é um ;carro descaracterizado para ser usado em investigações pela polÃcia legislativa, mas devidamente cadastrado no Detran;. Perguntado se, na 405 Norte, era realizada alguma investigação, ele respondeu que não. O diretor admitiu que usou a ;viatura; para almoçar. ;Hora de almoço também é hora de trabalho. Meu horário do Senado inicia à s 8h30 e vai até as sete, oito da noite;, argumentou. Com a chapa fria, o Fiesta passa despercebido por uma pesquisa mais simples realizada nos sistemas das polÃciais Civil e Militar do Distrito Federal. (Marcelo Rocha)
Tuma pressionado a sair
Leandro Colon
O senador Romeu Tuma (PTB-SP) tem sido aconselhado por colegas a se afastar da Corregedoria do Senado, órgão responsável pelas investigações internas. O parlamentar está acuado depois da denúncia do ex-diretor de Recursos Humanos João Carlos Zoghbi de suposto envolvimento dele num esquema de corrupção na contratação de empresas terceirizadas. Em conversas reservadas, senadores admitem um contrangimento na permanência do senador no cargo de corregedor.
Segundo Zoghbi, Tuma teria participação de irregularidades na época em que foi primeiro-secretário, entre 2003 e 2005. ;É mentira deslavada;, disse o senador. ;Estou pronto a prestar qualquer esclarecimento que for necessário. Não posso deixar a Corregedoria em razão da acusação que ele fez;, afirmou. No ano passado, o senador enterrou as apurações sobre as suspeitas que recaÃam contra seu sucessor na Primeira-Secretaria, Efraim Morais (DEM-PB). Tuma arquivou o caso sem ouvir qualquer testemunha. Pressionado, preferiu não levar adiante as dúvidas sobre as relações entre Efraim e o lobista Eduardo Bonifácio Ferreira, acusado pelo Ministério Público de negociar as licitações do Senado com empresas terceirizadas. Ferreira tinha a chave do gabinete de Efraim, segundo a PolÃcia Federal. Tuma optou por não aprofundar essa investigação. Agora, chegou a contratar um advogado para se defender das acusações de Zoghbi. ;Não me dou por suspeito, porque não há razão;, disse o parlamentar.
Balanço
Ontem, o plenário foi palco mais uma vez de discussão sobre a crise administrativa que tomou conta do Senado desde o começo de março. O presidente José Sarney (PMDB-AP) fez um balanço dos três meses à frente do comando da Casa. O senador enumerou suas medidas administrativas e anunciou que a Fundação Getulio Vargas (FGV) apresentará na semana que vem a primeira exposição sobre o estudo interno que vem fazendo na gestão do Senado. ;Nós submeteremos por 30 dias esse trabalho aos senhores senadores, para que possam opinar, fazer sugestões a respeito das reformas;, afirmou Sarney.
O senador José Nery (PSol-PA) chegou a sugerir, em discurso, o debate para criar uma comissão parlamentar de inquérito (CPI) para investigar as irregularidades no Senado, inclusive as fraudes em licitações. ;Caso este câncer tenha, na sua metástase, alcançado e envolvido algum senador ou senadora, caberá ao Conselho de Ética apurar com igual rigor estas condutas;, disse.
A proposta, porém, tem resistências internas. ;Uma CPI levaria o Senado a uma crise sem fim. Seria o extremo do extremo. Acho que devemos esgotar todas as alternativas;, disse o lÃder do PSDB, Arthur VirgÃlio (AM). O tucano apresentou uma proposta para acarear Zoghbi e o ex-diretor-geral Agaciel Maia numa reunião da Mesa Diretora. ;Não é tolerável que nós tenhamos Agaciel Maia, ou Zoghbi, ou quem mais seja, enodoando a imagem do legislativo brasileiro. Não podemos aceitar isso.;