Jornal Correio Braziliense

Politica

Deputado José Edmar vai ficar sem comer até que processos que enfrenta na Justiça sejam acelerados

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Considerado um parlamentar de atuação discreta, o deputado federal José Edmar (PR-DF) encontrou nos processos que tramitam contra ele na Justiça uma forma de chamar atenção. Ontem, o parlamentar anunciou no plenário da Câmara que fará greve de fome até que o Supremo Tribunal Federal (STF) dê celeridade aos inquéritos referentes à Operação Grilo da Polícia Federal, que em 2003 desbaratou um esquema de grilagem de terras no Distrito Federal. Na época, Edmar era deputado distrital e foi preso durante a ação policial. Seis anos depois, o parlamentar, sem constrangimentos, anunciou para um plenário quase vazio que está disposto a morrer para não ser mais injustiçado. ;Por que a justiça não tem prazo para receber ou rejeitar uma denúncia? Não posso mais viver com essa injusta acusação. Isso tem que ter um fim ou será meu próprio fim;, apelou, referindo-se ao fato de que a tramitação dos processos em que figura como acusado aguarda há meses pelo parecer do Ministério Público Federal sobre a aceitação das denúncias. O deputado disse que não vai participar dos festejos pelo aniversário de Brasília, permanecendo em silêncio até que as autoridades tomem providência sobre seu caso. Para justificar a decisão, até o feriado nacional virou argumento. ;Quero anunciar que entro hoje, em 20 de abril, em homenagem ao aniversário de Tiradentes, em greve de fome. Vou aguardar uma posição das autoridades. Não tenho mais como viver aguardando;, anunciou ontem o parlamentar. Durante o discurso de improviso, Edmar disse que sua atitude também tem o objetivo de sensibilizar o governo a aprovar a proposta do imposto único federal, pela qual ele briga há anos. ;O Planalto fica apresentando medidas paliativas para os efeitos da crise, mas não decide por questões que realmente importam. Vou ficar sem comer até que esse debate caminhe. Posso até morrer de fome;, disse. Em julho de 2003, José Edmar, então deputado distrital pelo PMDB, foi preso e indiciado com outras oito pessoas na ação da Polícia Federal. As acusações eram de grilagem de terras, lavagem de dinheiro, falsidade ideológica e formação de quadrilha. No STF, há duas denúncias contra o deputado. Ambas chegaram à Corte em novembro do ano passado, quando Edmar assumiu o mandato como suplente e ganhou o direito ao foro privilegiado. (Colaborou Ana Maria Campos)
Leia o discurso completo do deputado José Edmar "Sr. Presidente, Sras. e Srs. Deputados, como eu disse de manhã, hoje parece ser um dia especial. Ao chegar a esta Casa, eu tinha a esperança de pôr em prática os estudos e um vasto trabalho de mais de 20 anos elaborado por toda uma equipe, a despeito do malfadado sistema tributário brasileiro. Apresentei nesta Casa projeto que visa a criar um imposto único federal. Cumprimos toda a burocracia: elaboramos o projeto, colhemos mais de 200 assinaturas e conseguimos dar entrada à PEC nº 296. Realizamos vários discursos e reuniões, produzimos a impressão de separata e vivemos a ânsia de ver esta proposta apreciada. Tivemos toda a calma, mas surgiu a crise e, com ela, todos sabem, tudo o que está acontecendo. Na esteira do nosso raciocínio, vimos o Ministro Mantega e o Presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, baixarem o IPI e reduzirem o Imposto de Renda, medidas que atenuaram a crise, mas não o suficiente para impedir a demissão de mais de 1 milhão de brasileiros. Os jornais e a televisão nos mostram o sofrimento do povo, sofrimento não percebido pelos ditos representantes do povo. Não posso ficar inerte a esta realidade, não faz parte do meu comportamento. Sempre dediquei meu mandato às causas populares. Não vejo outro caminho, senão lançar um gesto de solidariedade com os milhares de pessoas que sofrem, em especial, os funcionários públicos, que não receberão aumento. Junto-me aos Prefeitos dos Municípios brasileiros que não têm como pagar a folha de pagamento e já anunciam demissão em massa. Precisamos dar um grito. Chega de crise! Chega de injustiça! Estamos vivendo uma crise moral. Todos os jornais falam o tempo todo em crise: crise moral paralisa a Câmara, crise moral, greve, a sociedade inteira. É hora de mudar esse quadro. Esta ainda é a Casa de Ulysses Guimarães e de Tancredo Neves, ainda é a Casa da democracia. Tenho também outro motivo para esta manifestação: o sofrimento de um homem público que vive sob o crivo de uma injustiça. Sofrimento tornou-se palavra comum na minha família. Não tenho medo de morrer, porque sinto que no sofrimento morro a cada dia. Descobri que o homem não deve simplesmente viver. O homem deve marcar a sua existência. O homem não escolhe o dia de nascer, mas deve morrer lutando, e morrer por uma luta deixa seguidores, os quais, geralmente, mudam a página da História. Há 6 anos vivo com uma espada sobre minha cabeça. Sou inocente. Sou inocente. No decorrer desses 6 anos, descobri que fui preso e achincalhado por esta cidade no lugar de um outro Deputado, que tinha como protetor o seu pai Governador. Ele, filho bastardo, não poderia jamais ser preso. Brasília ia descobrir toda essa outra história que vive encoberta, e o modo mais fácil foi me colocar no lugar desse outro Deputado. O inquérito não segue, não tem jeito, não tem como seguir. Não faço parte da quadrilha. A prisão já foi considerada ilegal. E, se foi ilegal, sou vítima. Mas por que a Justiça não tem prazo para aceitar ou recusar uma denúncia? Não posso mais viver com essa injusta acusação. Isso tem que ter um fim, ou será meu próprio fim. Meu grito mudo também é por essa injustiça. Chega de injustiça, chega de sofrimento. Esse meu sofrimento não será nada diante de tudo o que eu e minha família já passamos. Quero anunciar que entro hoje, dia 20 de abril ; também em homenagem a Tiradentes, que tem seu aniversário de morte amanhã, dia 21 ; , em greve de fome nesta Casa. Estarei aguardando algum posicionamento das autoridades. Não tenho mais como continuar vivendo aguardando. Acho que as milhares de pessoas no País que vivem essa situação de esquecimento também têm que ser lembradas. Sr. Presidente, não participo mais de festa, não sou homem de festas. Portanto, ficarei aqui no meu silêncio, mudo nesta Casa, pelo menos por esses dias, aguardando um posicionamento. Esta Casa tem que dar uma resposta a essa paralisia moral. A imprensa e a comunidade, o povo inteiro pede isso. Nós temos como mudar essa situação. Muito obrigado, Sr. Presidente. "