Um caminhão de mudança estacionou pouco antes das 8h de ontem em frente ao Bloco D da 112 Norte e começou a esvaziar o imóvel de 180m², pertencente ao Senado. O antigo ocupante morava lá irregularmente: era filho do ex-diretor de Recursos Humanos da Casa João Carlos Zoghbi, que anunciou que iria devolver o apartamento há quase um mês.
Foram duas viagens para levar toda a mobília do ex-morador, cujo pai já foi responsável por administrar uma folha de pagamento de R$ 2,1 bilhões anuais e sonhava em ocupar a Diretoria Geral do Senado. A meta de Zoghbi ruiu depois de o Correio revelar que o imóvel funcional estava sendo usado por um de seus filhos, sem pagar aluguel, enquanto o então diretor vivia numa luxuosa casa no Lago Sul, comprada em 1992. Ou seja, Zoghbi demorou para se desgarrar do benefício concedido pelo Senado ainda em 1999.
Funcionários do Bloco D informaram que o filho de Zoghbi já não morava mais no local. Mas a promessa de que desocuparia o imóvel logo depois da exoneração do pai no Senado demorou quase um mês. Um apartamento no mesmo bloco não é alugado por menos de R$ 2,1 mil mensais. Ao bolso de Zoghbi, custava R$ 388 referente à taxa administrativa.
Esse é o desfecho de uma novela que assola o ex-diretor desde outubro do ano passado, quando teve que exonerar a mulher e dois filhos que ocupavam cargos de confiança no Senado. Um dos filhos, Ricardo, aparece como dono da residência no Lago Sul. Esse era o argumento usado por Zoghbi para negar que morasse na casa. Mas o Correio mostrou que foi ele, sim, quem adquiriu a propriedade em 1992, colocando-a em nome do filho, então adolescente. Além disso, moradores e funcionários do prédio confirmaram que o servidor jamais viveu no imóvel funcional.
Quando admitiu que o uso do imóvel era irregular, foi avisado de que teria que pedir exoneração. O presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), não estava disposto a assumir o desgaste de ter que afastá-lo. O acerto foi o mesmo da solução encontrada para afastar o então diretor-geral do Senado, Agaciel Maia, que caiu após a divulgação que ocultou uma propriedade avaliada em R$ 5 milhões no Lago Sul.
Desde que seu ex-chefe saiu do cargo, Zoghbi tentou se colocar na linha sucessória e conquistar o cargo de Agaciel. E chegou a ganhar apoio de parlamentares do PMDB para se tornar diretor-geral. Agora, os dois, Zoghbi e Agaciel, estão nos quadros dos servidores efetivos comuns do Senado.
Alívio
O fim do episódio é um alívio ao presidente do Senado e ao primeiro-secretário, Heráclito Fortes (DEM-PI), incomodados com os rotineiros episódios de irregularidades administrativas na Casa. Para buscar uma saída às sucessivas denúncias no âmbito administrativo da Casa, Sarney anunciou um acordo para a Fundação Getúlio Vargas (FGV) realizar uma auditoria e o corte de algumas subsecretarias, cujo chefe tinha status de diretor. Os primeiros alvos da FGV foram justamente o Departamento de Recursos Humanos, comandado por Zoghbi, a gráfica e o Prodasen.
Alguns fantasmas já começaram a aparecer, entretanto. O maior contrato, no valor R$ 6,7 milhões anuais, da gráfica é com Steel Serviços Auxiliares Ltda. Entre os funcionários da empresa, há parentes de servidores. Reportagem do Correio de quarta-feira passada identificou pelo menos cinco famílias inteiras trabalhando no setor. Um sobrinho de Agaciel, Jerian Maia dos Santos, é operador de acabamento da Steel. Ele ainda é irmão de Janete Maia dos Santos, servidora efetiva do Senado.
A coordenadora da Steel é Auricelly Christiane Oliveira. Ela foi indicada pelo responsável pelo contrato da gráfica e diretor de matérias-primas Luiz Augusto da Paz Júnior. Christiane, como é conhecida, é irmã de Mércia Sabrina Oliveira Ferreira, empregada pela Steel no serviço de fotomecânica. O namorado de Christiane, João Evaristo Júnior, também trabalha no mesmo local.