O Ministério Público Federal (MPF) pedirá à Justiça da Itália documentos que indiquem novos indícios da participação de autoridades brasileiras na Operação Condor, a aliança entre regimes militares da América do Sul destinada a reprimir seus opositores. Procuradores da República pretendem aproveitar a investigação feita pelos italianos para instruir o único inquérito aberto no país a fim de verificar o desaparecimento de militantes esquerdistas durante a ditadura brasileira. A primeira linha de apuração no caso, que seria a checagem de listas de passageiros de empresas de ônibus, foi frustada. O MPF queria confirmar se dois cidadãos ítalo-argentinos embarcados em Buenos Aires teriam sido seqüestrados antes de chegar a Uruguaiana (RS).
A esperança de a investigação brasileira tomar um rumo são os documentos existentes na Promotoria de Justiça italiana. Um dos integrantes do órgão esteve em países da América Latina, inclusive no Brasil, levantando provas para denunciar autoridades locais que supostamente atuavam na Operação Condor. No Rio Grande do Sul, dois ítalo-argentinos e um padre, também de origem estrangeira, teriam sido levados para Buenos Aires. ;Apesar de vários brasileiros que estão sendo acusados terem morrido, os documentos da Justiça italiana podem nos ajudar a fazer o primeiro julgamento relacionado a essa situação, o que nunca ocorreu no país;, afirma Ivan Cláudio Marx, procurador da República em Uruguaiana.
Foi depois de o Ministério Público em São Paulo ter instaurado processo administrativo contra militares que a Procuradoria da República no Rio Grande do Sul decidiu abrir o inquérito, conduzido pela Policia Federal. Até então, só o coronel Carlos Alberto Ustra, ex-chefe do DOI-CODI, e um outro oficial que serviu na mesma corporação respondiam a processo. No caso de ambos, o MP pede uma indenização da União para as vítimas.
Anistia
A possibilidade de revisão da Lei de Anistia e de punição a militares torturadores gerou uma cizânia no governo. Os ministros da Justiça, Tarso Genro, e da Secretaria Especial dos Direitos Humanos, Paulo Vannuchi, defenderam a abertura de investigação criminal. Já Nelson Jobim, da Defesa, e José Antonio Toffoli, advogado-geral da União, se manifestaram pela manutenção da anistia ampla. Apesar do impasse, o Ministério Público em Uruguaiana decidiu pelo inquérito, que tramita em Porto Alegre. A primeira fase das apurações ficou em torno de checagem de passageiros que embarcaram na capital argentina com destino ao Rio Grande do Sul e, posteriormente, ao Rio de Janeiro.
;A empresa que teria feito o transporte não tem mais nenhum registro por causa de um incêndio ocorrido depois do seqüestro dos cidadãos;, diz Marx. ;Agora, vamos buscar, por meio de carta rogatórias, o que apurou as autoridades italianas, que inclusive condenaram brasileiros pelo suposto envolvido na Operação Condor;, acrescenta o procurador. No retorno do recesso forense, Marx viajará para o Uruguai para tentar coletar novos documentos.