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Confira íntegra de entrevista com Gilberto Kassab

Prefeito reeleito de São Paulo se encontra com Lula, pede mais recursos e defende Serra para 2010

São Paulo ; Oito dias depois de frustrar nas urnas a tentativa do PT de voltar ao comando da maior cidade do país, o prefeito da capital paulista, Gilberto Kassab (DEM), será recebido nesta segunda-feira (03/11) em audiência pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Será o primeiro encontro oficial dos dois em Brasília após a vitória do afilhado democrata do governador José Serra (PSDB) sobre a ex-prefeita e ex-ministra do Turismo petista, Marta Suplicy. Reeleito com mais de 3,7 milhões de votos, Kassab telefonou para Lula já na segunda-feira passada para cumprimentá-lo por seu aniversário. Em retribuição, o presidente deu parabéns a ele pela conquista da reeleição. Com o diálogo os dois ratificaram a disposição em continuar mantendo um bom relacionamento embora estejam em campos políticos quase opostos. Na pauta administrativa do dia, Kassab espera discutir com Lula, entre outros temas, obras no aeroporto de Congonhas, na zona sul da capital, e projetos para o Campo de Marte, na zona norte. Nesta entrevista concedida ao Correio na sexta-feira, o prefeito reeleito defende o nome do governador Serra como candidato de uma ampla aliança para disputar a sucessão de Lula em 2010. Refere-se ao padrinho tucano como "o comandante", "o grande líder" de uma aliança partidária entre DEM e PSDB, transformada também em amizade no nível pessoal. Foi no final de 2004 que Serra elegeu-se prefeito tendo Kassab como vice e, depois, renunciou para disputar e vencer as eleições para o governo estadual, em 2006. Nascia ali a sólida parceria que atribui a José Serra total autonomia para decidir passos comuns pelo menos até 2010. "Ele é nosso comandante. É ele quem decide", fala, com tranqüilidade, o engenheiro, economista e bom jogador de xadrez Kassab, no escritório de seu apartamento, em um elegante condomínio na zona oeste. A reportagem seguiu de helicóptero com o prefeito para a última vistoria surpresa feita por ele no Autódromo de Interlagos antes da corrida de Fórmula 1, vencida por Felipe Massa neste domingo (02/11). Foi ele quem negociou diretamente junto à FederaçãoInternacional de Automobilismo (FIA) a manutenção do GP do Brasil em São Paulo. Enquanto responde perguntas sobre política, eleição, futuro pessoal, o prefeito olha atento a vista aérea da cidade. Gosta de vê-la bonita. Ele reafirmou que fará poucas e pontuais alterações em sua equipe, já consultou sua vice, Alda MarcoAntonio para saber se ela quer ocupar também uma secretaria no novo governo e diz que a crise econômica é motivo de preocupação, mas que, se for necessário, a cidade está preparada para enfrentá-la sem fazer cortes nas áreas de saúde,educação e transporte público. Confira abaixo os principais trechos da entrevista: Correio; Temos ouvido que, reeleito, o sr trabalhará em duas frentes. Em uma, consolidando sua carreira, já que é seu primeiro mandato eleito para ser o prefeito. A outra seria trabalhar por alianças pró governador Serra 2010. Está correto? Qual será seu papel como articulador em nível nacional? Kassab - Em relação ao meu mandato posso ratificar a sua afirmação. Fui eleito para cumprir o mandato integralmente. É meu primeiro cargo majoritário e não teria nenhum sentido eu abrir mão do mandato inteiro. Não teria sentido, nem legitimidade. Eu não tenho biografia para isso. O Serra, quando assumiu a prefeitura e depois deixou, em primeiro lugar foi convocado pela cidade. A cidade pediu que ele saísse. No meu caso, a cidade pede para eu ficar. E depois o Serra tinha já sido senador, líder na Constituinte como deputado federal, duas vezes ministro... Correio-O Sr. também já foi deputado federal... Kassab - Sim, mas ele foi líder na Assembléia Constituinte. E candidato à Presidência, secretário de Planejamento, prefeito...ele tinha legitimidade, história, biografia para isso. Eu não tenho. Ficarei os quatro anos. E isso é um fato concreto e não tem a menor possibilidade de não acontecer. Em relação à candidatura do governador Serra, não é o momento de se discutir, está distante. É evidente que são as próximas eleições, mas não tem nenhum sentido, falta passar 2009. Mas em 2010 eu vou defender sim, dentro da nossa aliança, que ele seja o candidato. Acho que é bom para o país, ele está bem preparado. Mas com muito respeito. Ate porque eu vejo sempre no seu partido (PSDB) interpretações de que talvez o Aécio (Neves, governador de Minas Gerais) queira ser. Então, longe de mim querer afirmar: vai ser o Serra. Tenho muito respeito pelo Aécio. Mas acredito que seja o momento do Serra (....). O Brasil precisa de pessoas bem preparadas, com biografia. E o Aécio é mais novo, terá oportunidade de ser presidente da República, não tenho dúvida nenhuma. Mas acho que a hora e o momento são do Serra. Correio-Caso venha a ser ele o candidato da aliança, o sr. vai cuidar da negociação em nível nacional? Kassab - Não, eu não teria essa pretensão, não...É evidente que, se eu defendo essa posição, o que eu puder fazer para mostrar às lideranças do país que é importante a sua candidatura (de Serra) farei. Mas, primeiro, não é o momento, será em 2010. E, depois, quem coordena uma campanha é o candidato. Se o Serra definir que quer colocar realmente seu nome à disposição, a partir desse nosso chamamento, ele é quem irá definir as pessoas que irão ajudá-lo. E eu, bem, vou ajudar naquilo que for a minha dimensão... Correio -Mas, com seu perfil articulador, é o senhor que vai ajudar prefeito, não é? Kassab - Eu...com o maior prazer irei ajudar o governador Serra no que eu puder. Correio - O governador Aécio é sempre lembrado como político diplomático, habilidoso, de perfil muito agregador, qualidades que o sr. também demonstra. Já o governador Serra é visto como alguém de temperamento mais duro, talvez mais quieto... Kassab - Mas o Serra também é agregador. Veja aqui em São Paulo a aliança tão ampla que ele tem. Conosco (DEM), com o PMDB agora. Nos elegemos com esta aliança. Ele foi o grande líder da aliança no segundo turno. Somou o seu partido, o PSDB, sem nenhum dissidência, todos muito motivados na minha campanha, o PMDB, outros partidos. E a mesma coisa no plano estadual. Então Serra também é agregador talvez ele seja mais quieto só. Correio-O sr acredita ser possível unificar o PMDB em torno de Serra para 2010? Kassab - O PMDB tem uma situação mais complexa. Os Democratas e o PSDB têm tendência de caminhar unidos com uma candidatura que eu espero que seja do Serra (...). O PMDB, todos sabem, é um partido que não tem tanta homogeneidade. É mais uma federação de partidos. É um partido respeitado, forte, teve um expressivo resultado agora. Eu não descartaria que caminhasse em nível nacional com Serra, mas seria precipitado afirmar isso agora. Correio - Mas é uma direção a ser buscada? Kassab ; Falar agora de um partido que faz parte da base do governo Lula, seria ainda muita precipitação. Mas pode ser um bom caminho. Fortaleceria bastante. Mas não vamos esquecer que, hoje, o PMDB esta na base de Lula. Correio -E se vocês conseguirem uma configuração como em São Paulo este ano? Kassab - É o ideal. O ideal é que tivéssemos uma aliança PMDB, PSDB e Democratas. Seja para ganhar as eleições, seja para ter governabilidade Correio - O sr. é favorável à presença do PMDB na presidência das duas Casas no Congresso? Kassab ; Seria prematuro me manifestar antes das lideranças do meu partido. É um assunto que tem, na discussão interna no Senado e na Câmara, sua face mais importante. O importante é que haja harmonia entre as bancadas (...). Estou saindo de uma campanha municipal (...). Para falar sobre o caso do PMDB eu não estaria preparado, posso dizer que defendo a representatividade. O PMDB é muito consolidado seja na Câmara, seja no Senado. Mas não vejo falta de legitimidade em ele ter as presidências. Correio -A partir de sua vitória, o DEM realmente quadros para disputar o governo estadual? Kassab - Não, esse trabalho de preenchimento de cargos será coordenado pelo governador Serra. Ele é o líder. Então caberá a ele indicar os candidatos às outras vagas, para governador, vice-governador, senador...Quando existe uma aliança, a aliança faz o papel dos diversos partidos. (...) Ele é o líder da aliança. E nós confiamos muito nele. Correio - Como foi feita aliança tão sólida? Aliados de diferentes siglas só respondem 'Nosso comandante é o governador Serra'... Kassab - Sim, mas ele é. É porque ele é. E quem falar que não é, é porque não está conhecendo a realidade. Ele é o grande coordenador da aliança. Correio - Como ficou a relação com Alckmin, é um quadro para disputar cargo majoritário em 2010? Kassab - Por que não? É evidente que tudo tem seu momento. Nas próximas eleições eu já te falei que quem vai coordenar é o Serra. Mas ele é um quadro de primeira grandeza. Correio -Mas ele terá de se integrar a um time que tem comandante? Kassab - Ah, o time tem comandante, claro. Aliás como eu também, estou integrado, não é? Temos comando e líder para definir para cada um de nós quem terá as missões em 2010. Correio -Os quadros mais próximos a ele poderão ter cargos na sua nova gestão? Kassab ; Não tem porque não ter. Ele tem muita gente qualificada que esteve com ele. Não vou fazer nenhuma alteração no governo, mas surgirão rotineiramente substituições porque é natural pessoas que queiram sair mudar de área. Correio - O sr. sempre fala bem do presidente, mas parece separar ele do PT... Kassab - Minha relação com o PT é boa também muito correta, a própria bancada de vereadores, de deputados estaduais, federais, eu tenho uma boa relação com o PT. Mas é evidente que é um partido que tem outras posições. Correio -O deputado estadual Rui Falcão (PT) já disse, em entrevistas, que Serra fez da prefeitura uma 'secretaria estadual para assuntos da capital. Como o sr analisaria a afirmação?' Kassab ; É uma maneira muito depreciativa de falar de uma boa e saudável relação da prefeitura com o governo do estado. Lamento se falou isso, não tenho conhecimento. Mas, se falou, mostra seu estado de espírito em relação às parceiras. Ele esquece de registrar que também é muito boa minha relação com o presidente Lula, aliás, com quem, como já disse,vou estar segunda-feira.(...) Me espanta que uma pessoa com sua experiência faça uma afirmação dessas. Ele deveria registrar orgulho e satisfação de ver trabalhando próximos prefeitura e estado. E vou me esforçar para estar cada vez mais próximo, porque ganha a cidade. Correio-Em 2006, em comícios pela reeleição, Lula chegava a dizer que a mídia podia até 'bater' nele, porque a campanha estava como fermento em massa de bolo. Quanto mais batiam, mais ele crescia. Tivemos isso em São Paulo este ano? Kassab - Não, não foi assim. A campanha da adversária (Marta Suplicy) perdeu tempo em não fazer campanha. Dizer que eu sou da turma do Pitta não é fazer campanha e não sei porque usaram isso se tentaram em 2004 e já não havia dado certo. Porque essas coisas não funcionam quando não são verdade. Fazer campanha é comparar o que ela fez com o que eu fiz pra ver quem fez mais e melhor.Comparar as propostas dela com as minhas, é isso que o eleitor quer saber. Na medida em que ela ficou preocupada com outras questões ela deixou de fazer campanha. Foi uma campanha errática, totalmente equivocada. Correio -Cientistas políticos têm dito que o sr tem requisitos para ser um grande político, independente de José Serra. Em contrapartida, entre seus adversários há quem lembre a passagem no governo Pitta, que fale até em bom produto de marketing... Kassab ; (...) Quando fui vereador, deputado estadual, federal, a imprensa me acompanhava. Não tinha muita visibilidade na opinião pública mas as pessoas conversam entre si e sabem o que é verdade. O PT perdeu tempo com uma campanha equivocada. Eu sou eu. Com o meu partido, minha aliança, com o Serra, com os companheiros do governo que fazem um excelente governo. Minha única missão é ser um bom prefeito. Eu não consigo enxergar nada além de ser bom prefeito. Correio -Não? Kassab - Não consigo. Porque se eu for um bom prefeito, tenho um rumo na minha vida. Se eu não for, tenho outro rumo. O bom prefeito é o caminho do respeito, credibilidade, da estima que as pessoas vão ter por mim. Se eu for um mau prefeito vai ser um caminho contrário a todos estes adjetivos. (...).Se daqui quatro anos estiver na mesma posição e, eu, gosto da vida pública, gosto do que eu faço, evidentemente, vou ter oportunidade de começar outras missões com o mesmo respeito. Se não, não vão existir as oportunidades. Correio -Daqui seis anos terá 54 anos.... Kassab - Eu vou cumprir o mandato em 2012. As próximas eleições são 2014. Se eu disputar eleições eu posso ser deputado estadual, deputado federal, senador, vice-governador, governador. Tem também eleições de vice-presidente e presidente. E o Serra será candidato. Se Deus quise, ele se elege em 2010 e se reelege em 2014. Correio - Eventualmente, se chegar a haver uma era Serra, de oito anos, no final o sr. terá ainda 58.. Kassab - Um menino... Correio - O sr tem esse sonho...(de ser presidente?) Kassab - Não, não, não. Acho que o cargo de prefeito o é um cargo com dimensão muito grande. (...) E daqui prá frente são as circunstancias que têm de ser favoráveis.(...)Eu quero é ser um bom prefeito e o resto é só o resto. Correio - Boa avaliação, baixa rejeição, inteligente, bem relacionado no ambiente político, dificil não haver circunstâncias. Kassab - Tudo muda rapidamente na vida pública. Não as minhas avaliações, porque vou me esforçar, mas as circunstâncias. Eu quero e tenho que ser bom prefeito. E estou muito feliz assim.