Anunciada em 2003 como uma medida para reduzir a dependência a empresas multinacionais no setor de hemoderivados, a Empresa Brasileira de Hemoderivados e Biotecnologia (Hemobrás) foi criada em março de 2005. Orçada em R$ 327 milhões, a fábrica da Hemobrás vai produzir cerca de 500 mil litros de plasma por ano, gerando economia anual em torno de R$ 400 milhões. O objetivo do empreendimento é tornar o Brasil auto-suficiente na produção de albumina, imunoglobulina e dos fatores de coagulação 8 e 9. Nesse último caso, a autonomia alcançará 35%. Cinco anos após o anúncio, porém, a fábrica ainda está no papel. Na semana passada, foram iniciadas as obras de terraplanagem em área de Goiana (PE). A estatal afirma que o cronograma está sendo ;rigorosamente; cumprido. As obras serão concluídas no final de 2010 e a fábrica atingirá capacidade plena de funcionamento em 2015.
Os estudos começaram em 2003, portanto no início do governo Luiz Inácio Lula da Silva, quando o Ministério da Saúde identificou suspeitas de superfaturamento na compra do fator 8 nos quatro anos anteriores. Esse produto ajuda na coagulação do sangue e impede o avanço de infecções. Uma nova licitação feita naquela época resultou numa economia de R$ 25,7 milhões. As suspeitas seriam confirmadas pela Operação Vampiro, que apontou casos de corrupção em processos licitatórios para a compra de hemoderivados de multinacionais. O escândalo acelerou a tramitação do projeto de lei enviado pelo governo ao Congresso. A existência da estatal foi autorizada em dezembro de 2004, mas a burocracia governamental atrasou o processo de implantação da fábrica.
A Hemobrás foi criada oficialmente em março de 2005, por decreto presidencial. A primeira diretoria só tomou posse em setembro. Os recursos para a implantação da fábrica já estavam previstos no Plano Plurianual (PPA) para o período 2004/2007, mas o primeiro orçamento de custeio foi aprovado somente no final de 2005 e só seria executado em 2006. Os primeiros recursos para investimentos tiveram que sair por medida provisória, em julho deste ano.
Decisões
A primeira diretoria, presidida por João Paulo Baccara, preparou em 2006 o planejamento estratégico da empresa, prevendo ações de 2007 até 2011. Durante dois anos, formou o seu quadro de funcionários, grande parte cedida de outros órgãos públicos. Hoje, são 60 trabalhadores. A primeira decisão foi entre desenvolver e validar nova tecnologia ou comprar uma já existente. Como a primeira hipótese demandaria prazo de seis ou sete anos, a diretoria decidiu por negociar a tecnologia. Outra questão delicada: onde seria implantada a fábrica, disputada pelos governos de São Paulo, Rio e Minas Gerais.
Foi escolhida a opção menos provável: Pernambuco, pela distância da matéria-prima e do maior centro consumidor, São Paulo, onde há o maior número de hemofílicos. ;A decisão foi tomada pelo foco desse governo na responsabilidade social. O desenvolvimento e o conhecimento têm que ser levados para outras regiões do país;, argumenta Baccara. Ele afirma que não houve pressão do ex-ministro da Saúde Humberto Costa, pernambucano e responsável pelo projeto da Hemobrás. Pela distância dos centros consumidores, o preço do produto terá uma elevação de apenas 0,8%, afirma. Outra tarefa foi a criação do plano de carreira da empresa.
Em outubro do ano passado, a Hemobrás assinou o contrato de transferência de tecnologia com uma estatal francesa, o Laboratório de Fracionamento e Biotecnologia (LFB), que venceu concorrência internacional. A compra da tecnologia para produção de albumina, imunoglobulina e fatores 8 e 9 custou R$ 8 milhões. A empresa ofereceu mais dois produtos ; complexo protrombínico e fator de von Willebrand. A tecnologia adicional custou mais R$ 8 milhões. Pouco considerando o consumo anual do país: cerca de R$ 800 milhões, levando em conta os setores público e privado.
Baccara afirma que o cronograma de implantação está sendo seguido. Em novembro, será lançado o edital para a construção do primeiro bloco, que vai abrigar a câmara fria. Se não forem apresentados recursos ao processo de licitação, as obras iniciam em janeiro do próximo ano, quando estará concluída a terraplanagem. Já foram aprovados o plano de controle ambiental e até o resgate arqueológico da área de 250 mil m². O prédio inteiro estará concluído no final de 2010, último ano do governo Lula. A fábrica vai começar a funcionar em 2011, com capacidade para 250 mil litros/ano. A produção plena será atingida em 2015, ou seja, 12 anos após o anúncio da criação da estatal.
Linha do tempo
Agosto de 2003
Ministério da Saúde anuncia o projeto de criação da Hemobrás
Dezembro de 2004
Congresso autoriza o Executivo a criar a estatal
Março de 2005
Decreto do presidente Lula institui e regulamenta a Hemobrás
Setembro de 2005
Nomeada a diretoria da estatal
Dezembro de 2005
Aprovado primeiro orçamento da empresa (para 2006)
Julho de 2006
Medida provisória aprova primeiros recursos para investimentos
Outubro de 2007
Empresa estatal francesa é escolhida para fornecer tecnologia
Julho de 2008
Começam as obras de terraplanagem para fábrica em Goiana (PE)
Novembro de 2008
Será lançado edital para construção do primeiro bloco da fábrica
Dezembro de 2010
Conclusão das obras da fábrica
Dezembro de 2015
Fábrica atingirá plena capacidade de funcionamento