Fiel ao seu estilo, o Senado aprovou nesta quarta-feira (09/07) na surdina a criação de mais um cargo de confiança para os 81 senadores. Numa rápida reunião a portas fechadas, os integrantes da Mesa Diretora deram aval para que os parlamentares possam contratar mais um ;assessor técnico;, cujo salário é de R$ 9.979,24.
Somando os já inchados gabinetes de cada senador, mais os das lideranças partidárias e membros da Mesa, o novo cargo vai gerar um custo mensal de R$ 900 mil, fora despesas com encargos sociais e horas extras. Num ano, a despesa chega a, pelo menos, R$ 11,7 milhões.
A criação desse cargo vinha sendo orquestrada desde maio pelo primeiro-secretário da Casa, Efraim Morais (DEM-PB), e o diretor-geral, Agaciel Maia. No dia 23 daquele mês, o Correio revelou a articulação para que esse milionário aumento de gastos fosse aprovado. Pressionados, os responsáveis pelo movimento recuaram. Passados quase dois meses, aproveitaram que essa discussão esfriou e decidiram reacender o tema antes do apagar das luzes com o recesso parlamentar que começa na semana que vem.
Ontem, o presidente do Senado, Garibaldi Alves Filho (PMDB-RN), colocou o assunto em discussão na reunião com os demais seis integrantes da Mesa. Não querendo assumir sozinho o ônus dessa medida, o peemedebista avisou aos colegas que era contrário à criação desse cargo. Mas não adiantou.
Prevaleceu a pressão de Efraim. Garibaldi ficou isolado. Restou à Mesa aprovar a medida alegando que os líderes partidários já haviam assinado o ato que trata dessa nova função. Ou seja, o discurso agora é o de que a culpa é de todos, e não só da Mesa. ;Os líderes assinaram. Já estava tudo pronto;, argumentou Magno Malta (PR-ES), quarto-secretário.
Em maio, quando foi revelada a intenção de se criar esse cargo, Garibaldi afirmou que se ;rebelaria; para evitar que isso ocorresse. Ontem, derrotado, preferiu lamentar. ;Fui voto vencido. Fiquei isolado. Venceu a maioria;, limitou-se a dizer ao Correio, sem esconder o incômodo em ter que comentar o assunto.
A criação do cargo foi uma reação dos senadores à decisão da Câmara em abril de aumentar a verba de gabinete dos deputados de R$ 50,8 mil para R$ 60 mil. Para evitar um desgaste, o Senado buscou um caminho discreto, sem alarde. Os senadores podem ainda transformar o cargo de R$ 9 mil em quatro vagas de R$ 2,4 mil.
Discrição
As recentes decisões do Senado têm sido tomadas na mais absoluta discrição. Na semana passada, o Correio revelou que a Casa renovou por mais um ano o contrato de R$ 426 mil mensais com a Conservo, que oferece mão-de-obra terceirizada. A empresa é acusada pelo Ministério Público Federal de fraudar a licitação vencida no Senado.
Entre 2006 e 2008, a Casa pagou R$ 428 mil para a Construssati, construtora que reformou o comitê de imprensa. A empresa pertence ao estudante de direito André Scarassati, 26 anos, filho de José Alcino e Maria Regina Scarassati, tendo os dois últimos já trabalhado no Senado.
Análise da notícia
Um Estado paralelo
O aumento de mais um cargo de confiança para os senadores é fruto de um Estado paralelo que existe no Congresso. Enquanto líderes partidários negociam as votações em plenário, um outro grupo prefere se agarrar no aumento das regalias oferecidas com o dinheiro público.
Um grupo que atua com discrição, longe dos holofotes. Liderada pelo primeiro-secretário, Efraim Morais (DEM-PB), essa ala de senadores tentou impedir por anos a divulgação da prestação de contas da verba indenizatória de R$ 15 mil mensais paga a cada parlamentar. Pressionado, o presidente da Casa, Garibaldi Alves Filho (PMDB-RN), topou ceder. Mas pela metade. Divulga-se o quanto foi gasto, mas não como. As notas fiscais continuam guardadas a sete-chaves. Assim como se mantém em segredo a lista de servidores comissionados. O Senado é uma caixa-preta que ninguém ousa abrir.
A Primeira Secretaria, por exemplo, não dá votos a um senador. Mas poder. Cabe a Efraim Morais decidir pelos contratos da Casa, gerir os gastos dos gabinetes, entre outras coisas. Na prática, é o prefeito do Senado. No começo de 2007, ele condicionou o apoio à reeleição de Renan Calheiros (PMDB-AL) à sua permanência no cargo. Conseguiu.
Agora, Garibaldi sinalizou que não tem força para barrar as articulações do poder paralelo do Senado. Mais uma vez, prevaleceu a pressão dos senadores interessados em nomear mais assessores em seus gabinetes. Resta saber o que tantos funcionários farão, por exemplo, a partir de agosto, quando o Congresso vai parar por causa das eleições municipais.