O governo não pode abrir a guarda e ceder às pressões contra o teto de gastos, eficaz arma de controle fiscal que impediu a farra com o dinheiro público, sobretudo, depois de ser obrigado a abrir os cofres e liberar créditos de mais de R$ 500 bilhões para mitigar os danosos efeitos sociais e econômicos causados pela pandemia do novo coronavírus. Neste ano, teve de executar despesas fora do teto estipulado por lei, por causa do estado de calamidade pública e do orçamento de guerra necessários para o combate à covid-19. Medida aprovada pelo Congresso, mas com validade até 31 de dezembro.
No ano que vem, tudo volta ao normal e a regra fiscal terá de ser cumprida, pois só assim a confiança dos investidores voltará e a economia poderá reagir de forma vigorosa. No entanto, há movimentações para enterrar a legislação de controle fiscal que foi aprovada, com dificuldade, no governo passado. Como o Planalto terá apenas R$ 31 bilhões para as despesas não obrigatórias, inclusive investimentos em infraestrutura, manobras para ultrapassar o teto vêm ganhando força dentro da própria administração federal, o que precisa ser enfrentado sem trégua.
As pressões partem, também, do Poder Legislativo e de organizações da sociedade civil, todos de olho em novos investimentos públicos, o que, até então, vinha sendo rechaçado pelo Ministério da Economia. Membros da equipe econômica sempre se mostraram contrárias a mudanças no teto de gastos, pois entendem que ele é fundamental para a credibilidade do país, o que proporciona a atração de investimentos externos e a confiança dos empreendedores locais. A norma, aprovada em 2016, prevê que as despesas do governo federal podem crescer apenas o equivalente a variação da inflação dos últimos 12 meses.
Mesmo diante da ortodoxia dos economistas capitaneados pelo ministro Paulo Guedes, houve recente tentativa de se dar a volta no teto de gastos. Isso quando o Palácio do Planalto tentou, com a concordância do Ministério da Economia, reservar parte dos recursos do Fundeb (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica) — ele não é regido pelas normas do teto — para o Renda Brasil, programa social que vai substituir o Bolsa Família no segundo semestre.
No Congresso, a possibilidade de novos investimentos governamentais despertou o apetite de congressistas. Lideranças governistas defendem a abertura dos cofres da União para a infraestrutura nos próximos dois a três anos. A intenção é direcionar para obras futuras o saldo de créditos destinados à pandemia (livres do teto) que não forem gastos. Especialistas, porém, veem grande risco nessa manobra fiscal, pois pode significar a retomada descontrolada dos gastos públicos, o que não é aceito pela população, farta de tanta gastança. Perigo que o Brasil não pode e não deve correr.