As notícias falsas dominaram a campanha. Deu certo. Obteve 57 milhões de votos e tirou o Partido dos Trabalhadores do poder. Modificou o cenário político brasileiro. O capitão, expulso do Exército, conseguiu ser eleito deputado estadual e depois exercer sete mandatos de deputado federal. Passou 28 anos na Câmara dos Deputados, sempre no fundo do plenário, sem apresentar projetos.
Vale a pena retornar no tempo. No feriado de 12 de outubro de 1977, o Palácio do Planalto amanheceu protegido por soldados e atiradores de elite em posições estratégicas. O presidente da República decidira exonerar o ministro do Exército, Sylvio Frota, que era abertamente contra o processo de abertura lenta e gradual na política brasileira. Naquele dia ocorreu o confronto decisivo entre os partidários da democracia e os defensores do regime fechado conduzido pelos militares.
O presidente Geisel enviou emissários ao aeroporto de Brasília, onde ocorreu o estica e puxa político-militar. Uns eram convencidos a ir para o quartel general do Exército, outros para o Palácio do Planalto. O presidente venceu o confronto, determinou a exoneração do ministro do Exército, que foi substituído pelo general Fernando Bethlem. O lance pavimentou o caminho para o general João Baptista Figueiredo subir a rampa do Planalto e promulgar a anistia. Coube aos integrantes da chamada linha-dura amargar a derrota, cuidar das feridas e resmungar no fundo da cena política.
Os perdedores se espalharam pela babel brasileira. Uns se envolveram com o negócio das drogas, que no fim dos anos 1970, passou a ter maior presença no Brasil. Os jogos de azar atraíram alguns, outros decaíram para o grupo de ladrões profissionais do erário e milicianos que infestaram áreas não protegidas pelos governos locais e nacional, além de militares indignados. O jovem militar Jair Bolsonaro sempre se manifestou contra a anistia. Esse pensamento continua a existir na sociedade brasileira.
Até hoje, há opositores da anistia de junho de 1979. Essa posição implica não admitir a convivência pacífica dos antagônicos no mesmo espaço político. O presidente Bolsonaro pertence a essa turma. Ele nunca escondeu a admiração pelo coronel Brilhante Ustra, acusado de ser torturador de presos políticos, nem sua alergia a assuntos ligados ao meio ambiente e a questão de gênero. Gosta de exercer o poder e ter a palavra final. Nomeia com prazer e demite com humilhação, inclusive generais. Nada o detinha, até agora.
Encontrou o limite. Esbarrou no Supremo Tribunal Federal. O sinistro Abraham Weintraub agrediu ministros da Suprema Corte. Essa é a última atitude que se deve assumir no Brasil. É suicídio. Bolsonaro calculou mal. Teve que recuar, enviar emissários para conversar com o ministro Alexandre de Moraes, em São Paulo. Levantou a bandeira branca. O impeachment está ao alcance da mão de Rodrigo Maia.
O presidente gosta de falar todos os dias para o grupo de apoiadores que batem palmas e gritam palavras de ordem. Os jornalistas abandonaram o espaço. Apareceram oportunistas que pedem favores. Emergiu também a crítica no meio da massa. O quadradinho tende a desaparecer. De tropeço em tropeço, o presidente Bolsonaro esticou a corda e a colocou ao redor do próprio pescoço. Somou-se ao desmando, o absurdo e inconsequente comportamento perante a pandemia.
Os sucessores da linha dura militar, aqueles que eram contra a abertura democrática e a anistia, chegaram ao Palácio do Planalto. Corrupção significa dinheiro ilícito. A administração Bolsonaro & filhos aponta para algo ainda mais sério. Milícias aliadas ao discurso moralista, com vinculação evangélica e apoiadas por militares seduzidos pelo poder. Personagens estranhos como o famoso Queiroz, rachadinhas, lavagem de dinheiro, fake news mantidas por verbas públicas e particulares e a promoção do ex-ministro da Educação para o Banco Mundial indicam que os chefetes da Zona Oeste do Rio de Janeiro criaram um momento crítico na história do país. Eles assumiram o poder.
* Jornalista
* Jornalista