“Em momentos de guerra, o bem-estar do povo é tão importante quanto as armas que o defendem. O abastecimento das cidades divide recursos com o campo de batalha.” Winston Churchill, primeiro ministro inglês durante a Segunda Guerra, austero conservador e o homem que só prometeu sangue, suor e lágrimas, assim determinou a seu ministro de finanças, quando, indo às ruas de Londres, viu habitantes de um bairro de classe média pedindo ração dos soldados para comer.
A economia liberal dos conservadores, em que o mercado é soberano, deve conhecer limites no instante em que a nação chega à fronteira do desespero. Eles defendem que ao Estado só cabe prover recursos para saúde, segurança e educação, sem lembrar da sensibilidade social para lidar com exceções. A pandemia colocou em teste os princípios do Estado mínimo, que defende uma economia draconiana que só atua nas áreas naquilo que considera suas atribuições obrigatórias.
As graves consequências de uma epidemia exigem que o governo tenha sabedoria para assistir a sociedade civil. De forma diferente do que a União fez com estados e municípios. Permitiu que gastassem o que tinham e não têm em instalações e recursos para as populações pobres. Muito louvável, mas anêmica, pois não teve um plano econômico que mantivesse a sobrevivência da iniciativa privada.
A tragédia do coronavírus nos ameaça com a contabilidade trágica de 1 milhão de infectados e 50 mil mortos neste junho, e um balanço financeiro desastroso. As autoridades econômicas informam que a prévia do Produto Interno Bruto (PIB) registrou retração de 9,73% em abril na comparação com o mês anterior. Um número que mostra o impacto das medidas em nosso isolamento. O Banco Central calcula que estamos vivendo o maior enxugamento econômico desde o início das séries histórica, em 2003.
A vida comercial hiberna. O dinheiro não circula, as empresas beiram a insolvência, os pequenos e médios negócios viram fumaça, e o desemprego joga no desamparo milhares de famílias. Isso tudo porque a gestão financeira para ocasiões de crise não teve capacidade de planejamento e ação. O comércio vive sobre uma mesa de bilhar, uma sinuca de bico. O isolamento social gerou o problema, mas a abertura mostra que, na solução, há o risco da epidemia ganhar fôlego. Exercem pressão sobre os governadores para a liberdade das lojas, constatam o medo e a ausência de consumidores e, finalmente, têm a angústia de tudo recomeçar em outro fechamento.
Bem diferente seria essa agonia caso os doutores acadêmicos tivessem tido a iniciativa de colocar na gaveta suas convicções sobre a economia e olhassem com coragem a crise que atormenta o país. Um recuo nas decisões liberais não significa o fracasso dos planos econômicos. Estão sacrificando o comércio, os serviços e a indústria pela vaidade de não ver fracassar o projeto de recuperação da economia. Os projetos políticos não devem sufocar quem produz, vende e gera empregos.
O Brasil necessita planejar o futuro conforme as experiências do presente. É verdade que isso exige pesquisa, gestão pública, idealizar soluções viáveis e gerar ações concretas. Os deveres do homem público devem sempre estar acima das crenças fundamentalistas. Diante do caos sanitário e econômico que a pandemia demonstrou, caberia ao Estado renunciar a qualquer meta administrativa anterior e reconhecer que estamos diante de uma situação especial e desconhecida. A essa altura, não precisamos nos deitar na glória de nossas boas reservas internacionais, de aproximadamente US$ 345 bilhões, enquanto a economia viva da nação corre o perigo de asfixia.
A tragédia tem que ser tratada como o risco de morte de um filho. Não podemos ter limites de preço ou sacrifício para lutar pela vida. Não interessa até onde podemos aguentar. Um plano deveria exigir que a saúde pública funcionasse de verdade e os setores produtivos pudessem sobreviver. Resumindo a uma boa linguagem que se entenda: não poderia faltar respiradores aos doentes graves, crédito bom e barato aos empresários e um projeto de renda mínima, conforme as declarações de Imposto de Renda, para todos os necessitados.
Mais do que nunca, precisamos de soluções eficientes, flexíveis e humildes para proteger os excluídos por serem necessitados ou os necessitados por já serem excluídos. Friedrich August von Hayek foi um economista e filósofo austríaco, pai do pensamento econômico da equipe do doutor Paulo Guedes. Deixa para nós um ensinamento de imensa valia: “Entre o idealista dedicado e o fanático, muitas vezes há apenas um passo”.
* Presidente do Sistema Fecomércio-DF (Fecomércio, Sesc, Senac e Instituto Fecomércio)