Opinião

Opinião: Marcas eternas no povo

''Desde 19 de maio, em 10 datas, o balanço diário do Ministério da Saúde registra o incremento de mais de mil mortes a cada 24 horas. Num intervalo de duas semanas, passamos de 17 mil para 34 mil casos fatais no país''

O cenário da pandemia de coronavírus que se desenha no Brasil é assustador. Mais de três meses após a confirmação do primeiro caso de covid-19 no país, continuamos sem uma estratégia nacional de combate ao avanço da doença. Hoje, completam-se três semanas sem um ministro da Saúde efetivo e, em meio a tudo isso, presenciamos a quebra de recorde diário de mortes registradas a cada 24 horas.

Para piorar, sem ainda termos a certeza de que a fase crítica da disseminação da doença tenha sido atingida, há uma onda de flexibilização do isolamento em andamento em diversos estados e municípios do país. A questão não é apenas abrir o comércio ou não — neste ponto, avalio que as atividades podem e devem ser permitidas, desde que a aglomeração de pessoas não exista —, mas, sim, evitar que o ritmo de contaminação siga acelerado. Há, no entanto, o descumprimento da quarentena em diversas localidades. No Distrito Federal, por exemplo, a situação é preocupante em quatro localidades: Ceilândia, Samambaia, Pôr-do-Sol e Estrutural.

E há um outro elemento que agrava ainda mais a situação no país: a falta de testes. Epidemiologistas e infectologistas alertam que o Brasil está navegando no escuro, sem equipamentos de orientação. Não há a certeza de onde o vírus circula com mais frequência nem o tamanho da subnotificação, apenas estimativas. E isso é um perigo. Afinal, toda estratégia de controle sanitário passa por saber o tamanho real da doença e as áreas onde a população esteja mais sujeita à contaminação. O reflexo está aí: uma curva ascendente de casos e mortes.

Desde 19 de maio, em 10 datas, o balanço diário do Ministério da Saúde registra o incremento de mais de mil mortes a cada 24 horas. Num intervalo de duas semanas, passamos de 17 mil para 34 mil casos fatais no país. Neste ritmo, é questão de tempo para chegar a 50 mil mortes. Os números serão implacáveis com as autoridades. Essa tragédia de saúde pública em andamento deixará marcas eternas no povo brasileiro. E a lição número um será de que se você não controla o vírus, joga a população à própria sorte. Muitos países ensinaram o caminho, mas aqui, no plano federal, escolhemos negar a ciência. E a conta está começando a chegar.